Mano, balada topzêra é #sussa!

Com inspiração em crônica de Antonio Prata, autor incorpora os meio boçais, meio de direita e fala de seus bares prediletos

Por Leo Aversa | ODS 12 • Publicada em 28 de abril de 2018 - 08:04 • Atualizada em 28 de abril de 2018 - 15:58

Um brinde com champa (Foto CAIA IMAGE / SCIENCE PHOTO LIBRARY/AFP)
Um brinde com champa (Foto CAIA IMAGE / SCIENCE PHOTO LIBRARY/AFP)
Um brinde com champa (Foto CAIA IMAGE / SCIENCE PHOTO LIBRARY/AFP)

Nota do autor: Antonio Prata escreveu “Bar ruim é lindo, bicho!”, que é considerada uma das cem melhores crônicas brasileiras. Em homenagem ao Antonio e aos dias atuais, aqui vai uma versão remix, bem 2018, de “Bar ruim é lindo, bicho!

Eu sou meio boçal, meio de direita por isso frequento baladas topzêras. Não sei se você sabe, mas nós, meio boçais, meio de direita, nos julgamos a retaguarda dos liberais, há mais de 400 anos. (Deve ter alguma coisa de muito, muito errado com uma retaguarda de mais de 400 anos, mas tudo bem)

Na balada topzêra que ando frequentando ultimamente, o liberal atende pelo nome de Ricky – é o dono da boate, que cumprimento com um high five acreditando manter aí outros 500 anos de história.

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Nós, meio boçais, meio de direita, adoramos ficar parças do dono, com quem falamos sobre o mercado financeiro, enquanto nossos amigos não chegam para falarmos sobre as minas.

“Ô Ricky manda o garçom trazer uma champa pra gente”, eu grito, com os cotovelos apoiados na mesa firme de mármore, e me sinto como nessa cidade sussa que é Miami.

Nós, meio boçais, meio de direita, adoramos achar que estamos nessa coisa sussa que é Miami, por isso vamos a baladas topzêra, que tem mais a cara de Miami que os bares tupininuins, onde se serve frango à passarinho e não tem nem hambúrguer de Wagyu nem petit gâteau de chocolate belga, que são os novos pratos tradicionais da nossa cozinha. Se bem que nós, meio boçais, meio de direita, quando convidamos a mina pra sair pela primeira vez, atacamos mais de frango à passarinho, porque a gente gosta de Miami e tal mas na hora do vamos ver um Brasilzinho bem que ajuda.

Nós, meio boçais, meio de direita, até gostamos do Brasil, mas muito bem disfarçado. Não é qualquer Brasil. Assim como não é qualquer balada topzêra. Tem que ser uma balada topzêra autêntica, uma boate, com mesinhas de mármore, taças de cristal, e se tiver champa Veuve Clicquot, uma lágrima imediatamente desponta em nossos olhos, meio de canto, meio escondida. Quando um de nós, meio boçal, meio de direita, descobre uma nova balada topzêra que nenhum outro meio boçal, meio de direita, frequenta, não nos contemos: ligamos para a turma inteira de meio boçal, meio de direita e decretamos que lá é a nossa nova balada topzêra.

O problema é que aos poucos a balada topzêra vai ficando zoada, vai sendo frequentada por vários meio boçais, meio de direita e modelos mais ou menos top. Até que uma hora sai na Esquinas da Piauí como ponto frequentado por empresários, executivos e empreendedores e, um belo dia, a gente chega na balada topzêra e tá cheio de gente que não é nem meio boçal, meio de direita e foi lá pra ver se tem mesmo empresários, executivos e empreendedores e, principalmente, modelos mais ou menos top. Aí a gente diz: eu gostava disso aqui antes, quando só vinha a minha turma de meios boçais, meio de direita, as modelos mais ou menos top e uns reaças bêbados que cultuam o MBL. Porque nós, meio boçais, meio de direita, adoramos dizer que já frequentávamos a balada topzêra antes de ela ficar famosa, íamos a tal praia antes de ela encher de pobres, ouvíamos a dupla antes de ela tocar em Barretos. Nós gostávamos dos pobres que estavam na praia antes, uns pobres que serviam caipirinha e iam buscar água mineral para limpar nossos pés, isso a gente acha lindo, mas a gente detesta os pobres que chegam depois, bolivarianos cheios de discurso. Esse pobre não, a gente gosta do pobre autêntico, do Brasil autêntico. E a gente abomina as esquinas da Piauí, abomina mesmo, acima de tudo.

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Não pense que é fácil ser meio boçal, meio de direita em nosso país. Cada dia está mais difícil encontrar baladas tôpzeras do jeito que a gente gosta, os pobres estão todos de cheios de discurso e a Piauí sempre alerta, pronta para encher nossa balada topzêra de new faces e difundir a champa que pisca pelos quatro cantos do globo.

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Os donos das baladas topzêras que a gente frequenta se dividem em dois tipos: os que entendem a gente e os que não entendem. Os que entendem percebem qual é a nossa, mantêm a balada suuuuuper topzêra, chamam um MC ostentação para cantar no finde, colocam Veuve Clicquot na carta, e cobram em dólar. (Eles sacam que nós, meio boçais, meio de direita somos meio bem de vida e nos dispomos a pagar muito caro por aquilo que tem cara de caro). Os donos que não entendem qual é a nossa, diante da invasão, trocam as mesas de mármore por umas verde oliva, fotos do Pinochet na parede e som surround 6.4 tocando o Hino Nacional. Aí eles se dão mal, porque a gente odeia isso, a gente gosta, como já disse algumas vezes, é daquela coisa fake, tão Miami, tão Nutella

Não pense que é fácil ser meio boçal, meio de direita em nosso país. Cada dia está mais difícil encontrar baladas tôpzeras do jeito que a gente gosta, os pobres estão todos de cheios de discurso e a Piauí sempre alerta, pronta para encher nossa balada topzêra de new faces e difundir a champa que pisca pelos quatro cantos do globo. Para desespero dos meio boçais, meio de direita que, como eu, preferem hambúrguer de Wagyu e craft beer (que é a mesma coisa que cerveja artesanal, mas é como se diz em Miami e nós, meio boçais e meio de direita achamos que Miami é bem mais autêntico que o Leblon ou o Itaim e preferimos esse termo, craft beer, que é mais assim Dr. Rey, saca?)

“O Ricky, vê uma craft beer aqui pra mim. De IPA tem o quê?”

Leo Aversa

Leo Aversa fotografa profissionalmente desde 1988, tendo ganho alguns prêmios e perdido vários outros. É formado em jornalismo pela ECO/UFRJ mas não faz ideia de onde guardou o diploma. Sua especialidade em fotografia é o retrato, onde pode exercer seu particular talento como domador de leões e encantador de serpentes, mas também gosta de fotografar viagens, especialmente lugares exóticos e perigosos como Somália, Coreia do Norte e Beto Carrero World. É tricolor, hipocondríaco e pai do Martín.

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