ODS 1
Alimento para corpo e alma
Instituto Social e Cultural Macieira
Ainda menino, na casa de madeira que dividia com os pais e oito irmãos em Rocha Miranda, Zona Norte do Rio, José Macieira aprendeu a dar valor à comida no prato. Não raro, as refeições eram preparadas com restos de hortaliças que a família catava antes que fossem para o lixo na Ceasa (Central de Abastecimento do Estado), em Irajá. As mesmas mãos que anos atrás apanhavam legumes no chão, hoje misturam ingredientes de pratos deliciosos. E repartem com centenas de alunos o sabor de como tirar o sustento dos alimentos.
O Instituto Macieira Social e Cultural, fundado por José, oferece gratuitamente capacitação profissional em Gastronomia a moradores de comunidades carentes. Por mês, são atendidas 300 pessoas, em média. Com orgulho, Macieira, 47 anos, conta que entre seus ex-alunos há donos de pizzaria, salão de festas e fábrica de salgados. As aulas são dadas na sede do instituto, construída exatamente onde tudo começou: no terreno em que ficava o galpão de madeira. “Primeiro colocamos uma frangueira na calçada. Com a venda de frango, conseguimos construir nossa casa de tijolos”, emociona-se.
Faculdade de Gastronomia
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Em 2003, a casa já tinha três andares e a família abriu, ali mesmo, o restaurante Macieira Grill, que lá está até hoje, na esquina da Rua Lageado com a Estrada do Barro Vermelho. Cinco anos depois, Macieira entrou para a faculdade de Gastronomia e logo passou a dividir seus ensinamentos, de graça, com os moradores da região, fundando o Instituto. Há dois anos e meio, também dá aulas de Gastronomia no Senac. Suas especialidades são Cozinha Internacional, Panificação e Confeitaria. “Hoje, sou professor e empresário. Sei que posso ajudar as pessoas a melhorar de vida incentivando suas habilidades culinárias, abrindo uma nova porta de geração de renda pela alimentação, um dos setores que mais resistem mesmo num país em crise”, ensina.
Em busca de parcerias
Na cozinha-escola de 124 m², na sede do Instituto, há cursos de Pizzaiolo, Salgados Fritos, Salgados Assados e Confeitaria Básica, além de outras especialidades, como Churrasqueiro, Saladeiro e Escultura em Frutas e Legumes. A instituição conta com o apoio da Piraquê, que fornece parte do material, como farinha, sal e queijo. O restante da estrutura é custeada pelo próprio Macieira, que conta com a boa vontade de instrutores voluntários. “Espero obter patrocínio para pagar pelos serviços deles, que atualmente dão aulas apenas nas suas folgas”, salienta.
Além dos cursos em Rocha Miranda, a ONG também tem o projeto ‘Pé na Estrada com Macieira’, com oficinas itinerantes a bordo de um caminhão-cozinha que José conseguiu comprar em 2011. “Mas não adianta só dar aula para as pessoas um dia e demorar a voltar nos locais. Meu objetivo é formar instrutores em 60 polos no município do Rio. Assim, eles vão tocando as aulas em suas comunidades, regularmente, e eu só dou apoio com o caminhão”, planeja.
Outra ação do Instituto é a ‘Pequeno Chef’, com aulas para a criançada do bairro. “Era para eu fornecer o lanche para a turma do projeto de um pastor da região. Mas pensei: que tal trazer os meninos e meninas para cá, para aprenderem a fazer o próprio lanche? Assim surgiu o projeto, que hoje tem uma procura muito grande”, lembra.
As ideias não param de surgir. Recentemente, o Instituto começou a receber, em sábados alternados, mães de pequenos pacientes da Casa da Criança com Câncer. “Dou o curso para elas criarem um negócio e aumentarem a renda enquanto estiverem em casa, cuidando dos filhos”, explica Macieira.
Feira Sabor e Arte
O Instituto ainda promove, na própria rua, em meses alternados, a Feira Sabor e Arte, onde os ex-alunos expõem seus quitutes e fazem negócios. Entre os 33 participantes da última edição, estava a menina Letícia, de apenas 14 anos, criadora da marca ‘Brigadeiria da Lê’. “Filha de professora e taxista, ela queria empreender para ajudar em casa. Viu um anúncio nosso no Facebook e pediu aos país para fazer as aulas. Eles moram longe, por isso no início houve resistência. Mas agora o pai diz que a iniciativa da Lê mudou a vida deles”, conta Macieira, que passará em breve a realizar o evento todo mês, num espaço no Parque de Madureira. “É preciso criar redes solidárias, juntar num mesmo local quem faz doce, quem faz salgado, quem faz bolo… A feira é um primeiro passo para quem deseja empreender”, diz.
Há algum tempo, Macieira conseguiu uma casa com piscina, para onde se mudou com a mulher e as duas filhas. Não demorou muito, também abriu para a comunidade as portas do imóvel, perto do Instituto. “Temos aulas de hidroginástica para as pessoas da região e atividades para crianças”, avisa o fundador da ONG, que faz questão de contar para os alunos sua história, desde os tempos em que morava na casa de madeira e catava hortaliças na Ceasa.
[g1_quote author_name=”José Macieira” author_description=”diretor da ONG” author_description_format=”%link%” align=”left” size=”s” style=”simple” template=”01″]Eu consegui vencer na vida através da gastronomia. E coloco minha história para que as pessoas possam também empreender. Se elas começarem e perseverarem, vai dar certo
[/g1_quote]“Eu consegui vencer na vida através da gastronomia. E coloco minha história para que as pessoas possam também empreender. Se elas começarem e perseverarem, vai dar certo”, conclui.
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Fernanda Portugal é carioca, formada em Jornalismo pela Escola de Comunicação da UFRJ. Já foi editora de Saúde, Mundo, Meio Ambiente e Cidade do jornal 'O Dia'. Como repórter, no mesmo jornal, fazia matérias com temas ligados aos Direitos Humanos e ganhou o Prêmio SIP (Sociedade Interamericana de Imprensa) três vezes.