Cássia Kis destilou preconceito e ignorância ao citar a narrativa deturpada, criada por movimentos conservadores, sobre “ideologia de gênero” em entrevista a Leda Nagle na semana passada. Disse, entre outras barbaridades, aquele velho discurso criminoso sobre destruição da família e da vida humana. Em resposta enviada ao SBT na última segunda, 31, afirmou que “não há mentira no que disse”.
E como tem! Primeiro, que um caso anterior mencionado por ela sobre o beijo de duas meninas em uma escola é uma fake news, verificada pela Agência Lupa. E, segundo, que talvez ela precise de um choque de realidade para enxergar quem de fato está destruindo as famílias. Cassia chegou a questionar na entrevista: ‘Como a gente vai fazer?’. E aqui nesse texto eu vou desenhar, de uma vez por todas, quem ameaça as famílias. E famílias no sentido amplo, em suas diversas composições. E não com base em uma visão egoísta ou em mentiras compartilhadas no ‘zap’ em grupos bolsonaristas.
São histórias reais de pessoas entrevistadas, cara a cara ou por telefone, nos meus mais de cinco anos cobrindo a pauta da diversidade pelo #Colabora. Histórias que me fazem questionar: a preocupação é com quais famílias e quais crianças? Vamos lá!
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Veja o que já enviamosDestrói a família a mãe que ameaça uma criança de oito anos com injeção de estricnina e, não satisfeita, a expulsa de casa por não entender a sua identidade de gênero. Essa menina, Martinha, é obrigada a morar na rua e se prostituir para sobreviver. Repito: aos oito anos. Caso semelhante aconteceu com Anyky, colocada para fora aos 12 anos. Os pais consideravam inaceitável sua existência.
Destrói a família o pai que abusa sexualmente da própria filha com deficiência aos 13 anos. E repete o abuso, que resulta em uma gravidez, quando ela completa 20. Histórias parecidas de estupro aconteceram com pelo menos 35.735 crianças e adolescentes de zero a 13 anos no Brasil no ano passado, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Na grande maioria, o perigo estava na família: pais, primos, irmãos, tios e avós eram e continuam sendo os abusadores.
Destrói a família o assassino de Carlos, homem trans encontrado caído em uma poça de sangue, com os dois braços quebrados em 2017. Três meses depois, ele morreu no hospital e deixou um filho, na época, de 7 anos. No mesmo ano, ao menos outras 444 pessoas LGBT+ foram assassinadas por LGBTfobia. Centenas de famílias destruídas.
Destrói a família o pai que ao não ter um filho que representa o estereótipo de macho que ele esperava, o castiga fisicamente e constantemente. A ponto de João Silvério, em hipótese alguma, querer voltar à infância.
Destrói a família os pais que expulsam uma filha trans de casa, fazendo com ela sobreviva pela prostituição e aceite 20 reais por programa para poder comer.
Tentaram destruir a família da Karol Vieira, mais conhecida como Mc Xuxú. Ela sofreu uma tentativa de assassinato em 2013. Sobreviveu. Mas muitas amigas não resistiram à transfobia.
Tentaram destruir a família de Eduardo e Flávio: dois idosos espancados por cerca de 20 pessoas em uma vila na Tijuca, no Rio de Janeiro. Segundo os agressores, ali não era “lugar de gay”.
Destruíram a família de Yone. Um de seus filhos adotivos foi assassinado por ser bissexual. “Quebraram todos os ossos. A gente não pode manter o caixão aberto”, ela me relatou.
Destrói a família o pai ou a mãe que coloca filhos como escudo em manifestações na beira de estrada. E há uma tentativa de destruição da democracia em atos golpistas após o resultado da eleição. Um deles teve a presença de Cássia na quarta-feira, 02, no Rio de Janeiro.
E pergunto para a Cassia e para quem pensa igual: vocês vão continuar ajoelhados na hipocrisia e sendo coniventes com as reais destruições? Discursos como o da atriz destroem famílias e crianças todos os dias. Crianças que muitas vezes estão ajoelhadas e rezando para que possam ser quem são.
Por mais que ainda seja enfrentado resistência que a Bissexualidade, vai se consolidando como a Sexualidade, como preponderante, imagino mulheres que compreendem o que seja hoje, a “relação hetero” como “atividade fim” a procriação, por si só! A polêmica dela, ainda que preconceituosa, Não tenho dúvida que se deva a menos “oportunidades” de namorar homens, atualmente! Digo isso, porque um amigo, numa ocasião, sessentão e militar, numa praia nos encontramos e, comentou que nunca haviamos nos encontrado de sunga, com corpos não sarados (eu já havia completado 40 anos), mesmo assim, fomos a casa dele e antes de passarmos uma tarde caliente lá, ele comentou justamente essa realidade: da esposa não proporcionar tanto prazer depois da menopausa e, ele começar a reparar nos homens, mesmo que cisgeneros, que até quis conversar comigo, porque mesmo amigo, poderia nos permitirmos a “descermos as sungas”! Sorriu e disse que mesmo com militares quarentões, sexualmente experientes, não ousaria comentar com eles a bissexualidade que estava se permitindo!
Parabéns pelo texto. E pela coragem que persevera. Lutemos contra quem quer interditar pessoas saudáveis que só querem compartilhar o amor do jeito diverso e normal.
Texto excelente.