O fogo atingiu 30 milhões de hectares do território brasileiro em 2024. Essa área queimada representa um percentual 62% superior à média histórica de 18,5 milhões por ano e equivale ao território total do Rio Grande do Sul ou do Equador. A quantidade de área queimada foi a segundo maior dos últimos 40 anos, inferior apenas a 2007. Entre 1985 e o último ano, 206 milhões de hectares foram atingidos – pelo menos uma vez – por incêndios no Brasil, o que significa quase um quarto do território nacional (851,487 milhões de hectares) e a soma das áreas do Pará e do Mato Grosso. Os dados foram divulgados nesta terça-feira (24/06) na primeira edição do Relatório Anual do Fogo (RAF), produzido pelo MapBiomas Fogo.
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Os números integram a Coleção 4 de mapas de cicatrizes de fogo do Brasil e revelam os impactos do fogo nos diferentes biomas, além de tendências e padrões. O Cerrado e a Amazônia foram os territórios mais afetados e, juntos, correspondem a 86% da área queimada nos últimos 40 anos. Apenas em 2024, o bioma amazônico teve 15,6 milhões de hectares queimados, o que representa 52% de toda a área afetada por fogo no país, alta de 117% em relação à média histórica e recorde para o bioma desde o início da medição dos dados.
Em 2024, pela primeira vez desde 1985, as florestas foram o tipo de vegetação mais afetado pelo fogo na Amazônia, com (43%), superior às queimadas em pastagens (33,7%). Coordenador de mapeamento do bioma Amazônia do MapBiomas, Felipe Martenexen destaca que o recorde de queimadas em 2024 está ligado à seca severa, agravada pelo fenômeno El Niño, mas também com a ação humana. “Esse ano as florestas foram mais impactadas, por isso, acreditamos que tenha muito a ver com um manejo inadequado do fogo em pastagens”, aponta Felipe. Segundo o especialista, os incêndios em florestas têm se tornado mais recorrentes e representam riscos para as dinâmicas desse ecossistema.
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Veja o que já enviamosO mapeamento, produzido a partir de imagens de satélite, também revela números preocupantes na Mata Atlântica, com 1,2 milhão de hectares queimados em 2024, um crescimento de 261% e o maior percentual da série histórica. O Pantanal, conhecido como a maior planície alagável do mundo, teve 62% de seu território queimado pelo menos uma vez no período analisado pelo MapBiomas Fogo, com aumento de 157% em 2024, atingindo um total de 2,2 milhões de hectares.
Ao identificar os locais e períodos mais críticos da ocorrência do fogo, o relatório permite apoiar o planejamento de medidas preventivas e direcionar de forma mais eficaz os esforços de combate aos incêndios
O estudo indica que o período de agosto a outubro é o mais intenso de queimadas no Brasil, correspondendo a 72% da área afetada pelo fogo entre 1985 e 2014. 33% dos incêndios aconteceram em setembro e 64% do território nacional queimou mais de uma vez no período da série histórica. O Cerrado é o bioma com maior recorrência do fogo, onde 3,7 milhões de hectares queimaram mais de 16 vezes em 40 anos.
Os únicos biomas onde a área queimada diminuiu em 2024 foram o Pampa, com 495 mil hectares atingidos pelo fogo, uma queda de 48% em relação ao ano anterior, e a Caatinga, com uma redução de 16% e 404 mil hectares afetados. Porém, os 11,15 milhões de hectares queimados na Caatinga entre 1985 a 2024 representam 13% do bioma. Na Amazônia, Pampa e Mata Atlântica predominam áreas queimadas de menores extensões, com menos de 250 hectares.
Cicatrizes do fogo
Segundo a pesquisa do MapBiomas Fogo, 43% de toda a área queimada no Brasil desde 1985 se concentrou nos últimos 10 anos, a partir de 2014. A maior parte (27%) do território atingido entre 1985 e 2024 corresponde a áreas queimadas que possuem entre 10 e 250 hectares. Em 2024, porém, quase um terço (29%) da área total queimada foi em mega eventos de fogo com mais de 100 mil hectares afetados.
“Essa primeira edição do RAF é uma ferramenta fundamental para apoiar políticas públicas e ações da gestão territorial do fogo. Ao identificar os locais e períodos mais críticos da ocorrência do fogo, o relatório permite apoiar o planejamento de medidas preventivas e direcionar de forma mais eficaz os esforços de combate aos incêndios”, destaca Ane Alencar, diretora de Ciências do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM) e coordenadora do MapBiomas Fogo.
O ano de 2024 também registrou aumento na vegetação nativa afetada pelo fogo (72,7% – 21, 8 milhões de hectares), em comparação com o total histórico (69,5% – 514 milhões de hectares). As florestas compõem o tipo de vegetação mais atingido, com 7,7 milhões de hectares queimados em 2024, uma extensão 287% superior à média histórica.
Os biomas com maior proporção de vegetação nativa afetada pelo fogo entre 1985 e 2024 foram Caatinga, Cerrado, Pampa e Pantanal, todos estes com mais de 80%. Na Amazônia e Mata Atlântica, o fogo ocorreu principalmente em áreas de ocupação humana (mais de 55%). No caso da Amazônia, as pastagens respondem por 53,2% da área queimada no período histórico; na Mata Atlântica, 28,9% da extensão queimada eram de pastagem e 11,4% de agricultura.
Pantanal sofre com mega queimadas
Entre os seis biomas brasileiros, proporcionalmente o Pantanal foi o mais afetado pelo fogo nos últimos 40 anos. A quase totalidade (93%) dos incêndios ocorreu em vegetação nativa, especialmente em formações campestres e campos alagados (71%). As pastagens representam 4% das áreas atingidas por fogo. O bioma mostra também uma grande recorrência do fogo: três em cada quatro hectares (72%) queimaram duas vezes ou mais nas últimas quatro décadas.
As cicatrizes deixadas costumam ser mais extensas do que em outros biomas: é no Pantanal que se encontra a maior prevalência de extensões queimadas superiores a 100 mil hectares (19,6%). Áreas com cicatrizes de queimada entre 500 e 10 mil hectares também se destacam (29,5%) e estão distribuídas por diferentes regiões do bioma. No ano passado, houve um aumento de 157% da área queimada no Pantanal na comparação com a média histórica do período avaliado pelo MapBiomas Fogo.
“Os dados históricos mostram a dinâmica do fogo no Pantanal, que se relaciona com a presença da vegetação natural e com os períodos de seca. Em 2024, o bioma queimou na região do entorno do Rio Paraguai, região que passa por maiores períodos de seca desde a última grande cheia em 2018”, explica Eduardo Rosa, coordenador de mapeamento do bioma Pantanal no MapBiomas. É no Pantanal onde fica o município com maior área queimada acumulada entre 1985 e 2024 – Corumbá (MS) – com mais de 3,8 milhões de hectares.
Amazônia e Cerrado
Entre 1985 e 2024, foram 89,5 milhões de hectares queimados no Cerrado e 87,5 milhões de hectares na Amazônia. Embora a área queimada nos dois biomas seja semelhante, há uma grande diferença em termos proporcionais, uma vez que a área total da Amazônia é quase o dobro do Cerrado. Por isso, na Amazônia, a área queimada pelo menos uma vez nos últimos 40 anos corresponde a 21% do bioma; no Cerrado, esse percentual é de 45%.
É também na Amazônia e no Cerrado que se encontram os três estados brasileiros líderes em área queimada: Mato Grosso, Pará e Maranhão. Juntos, eles concentram 47% da área queimada em todo o Brasil entre 1985 e 2024. Entre os 15 municípios brasileiros que mais queimaram, sete estão no Cerrado e seis na Amazônia. Juntos, esses 15 territórios respondem por 10% de toda a área afetada pelo fogo no Brasil nos últimos 40 anos.
No Cerrado, a área queimada, de 10,6 milhões de hectares em 2024, equivale a 35% do total queimado no país no ano passado e representa um crescimento de 10% em relação à média histórica de 9,6 milhões de hectares por ano.
“Historicamente, o Cerrado evoluiu com a presença de fogo natural, geralmente provocado por raios durante o início da estação chuvosa. No entanto, o que temos observado é um aumento expressivo dos incêndios no período de seca, impulsionado principalmente por atividades humanas e agravado pelas mudanças climáticas” comenta Vera Arruda pesquisadora do IPAM e coordenadora técnica do MapBiomas Fogo.