Febre amarela reduz população de micos-leões-dourados

Doença causa diminuição de 32% no número de animais da espécie símbolo da defesa do meio ambiente no Brasil. Solução é vacina ainda em fase de testes

Por Cristina Serra | ODS 15 • Publicada em 10 de setembro de 2019 - 06:18 • Atualizada em 2 de agosto de 2021 - 12:11

Mico-Leão Dourado em Poço das Antas: 20 mil mudas de Mata Atlântica serão plantadas para facilitar a circulação (Foto: Divulgação)

O recente surto de febre amarela na região Sudeste do Brasil teve impacto dramático sobre uma espécie ameaçada de extinção e que é também símbolo da defesa do meio ambiente no país: o mico-leão-dourado. Censo realizado pela Associação Mico-Leão-Dourado (AMLD) aferiu redução de 32%, queda de 3.700 animais para 2.500. Pesquisadores estão desenvolvendo uma vacina, na tentativa de evitar que novas perdas ocorram, caso o vírus da doença permaneça circulando na área de ocorrência da espécie, endêmica da Mata Atlântica de baixada do Rio de Janeiro.

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O vírus da febre amarela atinge primatas humanos e não humanos por meio da picada de mosquitos infectados. A maioria dos macacos morre poucos dias após serem expostos ao vírus. No caso dos micos-leões-dourados, os pesquisadores perceberam que alguns grupos, ou famílias, do animal sumiram das matas nos últimos dois anos. O desaparecimento coincidiu com a morte de macacos bugios, considerados sentinelas para febre amarela.

Os grupos de micos-leões-dourados são regularmente monitorados por equipes de campo da AMLD. Em cada grupo, um dos animais usa colar com rádio-transmissor, o que permite sua rápida localização por meio de uma antena de telemetria. Três foram encontrados mortos. Em maio de 2018, um deles teve a doença confirmada em laboratório como causa da morte. As hipóteses de que a fatalidade tivesse sido provocada por predadores naturais ou caçadores também foram examinadas, mas descartadas por falta de maiores evidências.

Antes do surto de febre amarela, a população de micos-leões-dourados vinha aumentando de forma consistente: de apenas 200 nos anos 1970 – quando o animal esteve à beira da extinção na natureza – para os 3.700 do censo de 2014, considerado marco de sucesso mundial na recuperação de uma espécie ameaçada.

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É a maior queda da população já verificada desde o inicio dos esforços de conservação, há mais de 40 anos

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O novo censo, concluído recentemente, constatou o declínio de 32%, redução que poderá tornar mais difícil a reprodução da espécie. As maiores perdas ocorreram em fragmentos de Mata Atlântica do município de Silva Jardim, a 120 km do Rio de Janeiro. Todos os dados desse estudo estão sendo publicados nesta terça-feira no Scientific Reports, da revista norte-americana Nature. O artigo é assinado pelos pesquisadores James M. Dietz, Sarah J. Hankerson, Brenda Rocha Alexandre, Malinda D. Henry, Andréia F. Martins, Luís Paulo Ferraz e Carlos R. Ruiz-Miranda.

Segundo o biólogo norte-americano James Dietz, cientista aposentado da Universidade de Maryland, vice-presidente da ONG Save the Golden Lion Tamarin e que lidera o grupo de pesquisadores, esta “é a maior queda da população já verificada desde o inicio dos esforços de conservação, há mais de 40 anos. Mas existe conhecimento científico e capacidades locais para enfrentar mais este desafio para o mico-leão-dourado”.

Dietz refere-se, sobretudo, ao desenvolvimento de uma vacina para os macacos, já em fase de testes, que está sendo desenvolvida por pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e do Centro de Primatologia do Rio de Janeiro, com apoio da AMLD. Diante da possibilidade de um ciclo continuado da doença nos próximos anos, a vacina para proteger os micos pode fazer a diferença entre perder a espécie definitivamente ou salvá-la da extinção.

O secretário-executivo da AMLD, Luís Paulo Ferraz, considera a redução na população dos animais “muito preocupante” e disse que, além dos estudos para a vacina, a associação continuará a fazer o monitoramento dos grupos de macacos na sua área de ocorrência, formada, principalmente pelos municípios de Silva Jardim, onde fica a Reserva Biológica de Poço das Antas, Rio Bonito e Casimiro de Abreu. “Há condições para que o mico resista. Mas para isso os esforços terão que ser redobrados. Felizmente, em todos estes anos, temos uma comunidade consciente e que protege o mico. Isso faz toda a diferença”, afirmou Ferraz, lembrando ainda que a recuperação da espécie no Brasil foi possível graças a um esforço global, com a participação de zoológicos estrangeiros que mandaram alguns de seus animais para serem reintroduzidos na natureza, na década de 1980. “Isso é uma luz para o caso de necessidade extrema”, concluiu, esperançoso.

Cristina Serra

Trabalhou nas redações dos jornais Resistência, Leia Livros e Jornal do Brasil, da revista Veja e da Rede Globo. Cobriu o desastre de Mariana, em 2015, para o Fantástico. Escreveu o livro "Tragédia em Mariana - A história do maior desastre ambiental do Brasil" (Record).

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