Se só maluco rasga dinheiro, como diz o ditado popular, o Brasil precisa, urgentemente, começar um tratamento. Nos últimos dez dias o país perdeu quase R$ 300 milhões em doações para o Fundo Amazônia, que viriam da Alemanha e da Noruega. Os sintomas, no entanto, são mais antigos, o paciente vem sendo acusado há algum tempo de abandonar as ações de preservação na floresta Amazônica que vinham sendo feitas nos últimos anos, e até de incentivar o desmatamento.
[g1_quote author_name=”Rubens Ricupero” author_description=”Ex-ministro do Meio Ambiente” author_description_format=”%link%” align=”left” size=”s” style=”simple” template=”01″]Em seis meses, o governo apenas criminalizou os fiscais do Ibama e do Instituto Chico Mendes, desmantelou as instituições de controle do desmatamento e encorajou a ação criminosa dos desmatadores
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Foi isso que motivou o ministro do Clima e Meio Ambiente da Noruega, Ola Elvestuen, a anunciar, nesta quinta-feira, dia 15, que o país suspenderá o envio de R$ 133 milhões que seriam destinados para o Fundo Amazônia. Segundo Elvestuen, o Brasil vem quebrando o acordo para redução do desmatamento, que é a base para a existência do Fundo. Os motivos são os mesmos que levaram a Alemanha a tomar decisão semelhante no último sábado, dia 10 de agosto. O valor bloqueado pelos alemães foi um pouco maior: R$ 155 milhões. Na ocasião, o presidente Jair Bolsonaro ironizou a decisão do país europeu, dizendo que o Brasil não precisava do dinheiro e que a chanceler alemã, Angela Merkel, deveria usar o dinheiro para reflorestar a Alemanha.
O Fundo Amazônia existe há mais de dez anos, foi criado em 2009, é administrado pelo BNDES e é bancado, principalmente, com recursos desses dois países. Nesse período, já foram investidos quase R$ 3,4 bilhões em projetos na região. Entre os resultados, citados no próprio site do Fundo Amazônia, estão 45 milhões de hectares de áreas protegidas, 190 unidades de conservação apoiadas, 22 milhões de hectares de florestas passaram a ter manejo sustentável, 162 mil pessoas começaram a fazer parte de atividades produtivas sustentáveis e R$ 142 milhões foram obtidos com a comercialização de produtos oriundos da floresta.
De acordo com declarações do ministro norueguês ao jornal “Dagens Næringsliv”, o Brasil quebrou o acordo relacionado ao Fundo Amazônia, paralisado desde a extinção, por decreto do presidente Bolsonaro (PSL), dos conselhos que ordenam o fundo —o Comitê Orientador do Fundo Amazônia (Cofa) e o Comitê Técnico do Fundo Amazônia (CTFA). Elvestuen também disse que os números do desmatamento estão crescendo significativamente e que o Brasil aparenta não querer fazer nada a respeito.
Os dados mais recentes do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) mostram um crescimento acentuado no desmatamento. A destruição cresceu 88% em junho e 278% em julho, em comparação com os mesmos meses do ano passado. A divulgação dos números provocou uma nova polêmica envolvendo o presidente, que acusa os técnicos do Inpe de sensacionalismo e que os índices poderiam prejudicar alguns acordos comerciais do país.
Para o embaixador Rubens Ricupero, ex-ministro do Meio Ambiente, o que prejudica o Brasil não é a divulgação dos números, mas as ações do governo: “Em seis meses, o governo apenas criminalizou os fiscais do Ibama e do Instituto Chico Mendes, desmantelou as instituições de controle do desmatamento e encorajou a ação criminosa dos desmatadores”. Ele teme, inclusive, que o pacto comercial fechado entre o Mercosul e a União Europeia não entre em vigor: “Se esse comportamento não mudar, é provável que o acordo seja suspenso devido à quebra dos compromissos brasileiros”.
O tema ambiental vendo sendo um foco cada vez maior de discórdia entre o Brasil e países europeus. A alemã Angela Merkel já afirmou ver com grande preocupação as ações do atual governo em relação ao desmatamento. Bolsonaro, por sua vez, se irrita com o empenho de Merkel, Macron e outros líderes europeus em lhe pedir que preste contas sobre a floresta, seus habitantes e rios. Em junho, na reunião do G20, ele convidou os dois líderes a sobrevoar com ele a Amazônia. “Se encontrarem um quilômetro quadrado de desmatamento entre Manaus e Boa Vista, vou concordar com eles”. Mais recentemente, ele insistiu no raciocínio: “Quando acabarem as commodities do Brasil, nós vamos viver de quê? Vamos virar veganos? Vamos viver do meio ambiente?”. Como diz um outro ditado popular: se cobrir vira circo; se cercar, vira hospício.
Os países que criaram esse fundo precisam entender que interromper as iniciativas de proteção a floresta, não é para o Brasil ou para os Brasileiros é para a humanidade.