ODS 1
Projeções mostram que seremos 10 bilhões de habitantes na Terra
No Brasil, população começará a decrescer a partir de 2042 e 40% dos brasileiros terão mais de 60 anos em 2100
A Divisão de População da ONU divulgou, no Dia Mundial de População, 11 de julho de 2024, as novas projeções demográficas para todos os países e regiões do mundo, já incorporando os efeitos da pandemia da covid-19 sobre a dinâmica populacional nas várias escalas geográficas. Os novos números nacionais e internacionais eram bastante aguardados, pois conhecer os cenários demográficos é essencial para o planejamento das políticas de saúde, educação, emprego, assim como para todas as políticas públicas de longo prazo fundamentais para o desenvolvimento econômico, com justiça social e ambiental.
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Os novos números da ONU confirmam a tendência apresentada na revisão de 2022 que indicava uma redução do ritmo do crescimento populacional global com a perspectiva de um decrescimento da população mundial nas duas últimas décadas do século. A população mundial era de 2,47 bilhões de habitantes em 1950, passou para 6,1 bilhões no ano 2000, deve atingir o pico populacional em 2084, com 10,3 bilhões de habitantes, e diminuir ligeiramente para 10,2 bilhões de habitantes em 2100.
O lado positivo é que o menor ritmo de crescimento atual e o futuro decrescimento populacional ocorre não pelo aumento da mortalidade, mas sim pela redução da fecundidade. O gráfico abaixo mostra que, no mundo, na década de 1950, a taxa de fecundidade total (TFT) estava acima de 5 filhos por mulher e a expectativa de vida ao nascer estava em torno de 50 anos. A mortalidade era alta e a natalidade também era alta. Mas com a transição demográfica tudo mudou.
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Veja o que já enviamosA expectativa de vida ao nascer subiu para 72,6 anos em 2019, caiu para 70,9 anos em 2021 em decorrência da pandemia da covid-19, mas já recuperou a tendencia de alta e marcou 73,3 anos em 2023, devendo atingir 81,7 anos em 2100. No mesmo período a TFT caiu para 2,25 filhos por mulher em 2023, deve atingir o nível de reposição, de 2,1 filhos, em 2050 e alcançar 1,84 filhos por mulher em 2100.
A transição demográfica é um pré-requisito para o avanço do desenvolvimento humano e a melhoria do bem-estar das pessoas e do meio ambiente. Depois de séculos e até milênios de crescimento populacional quase ininterrupto, a Divisão de População da ONU mostra que o decrescimento da população vai se espalhar pelos quatro cantos do planeta e o mundo experimentará uma redução populacional nas últimas décadas do século XXI. Uma em cada quatro pessoas a nível mundial vive num país cuja população já atingiu o pico populacional. Em 63 países e territórios, que representam 28% da população mundial em 2024, o tamanho da população já está encolhendo.
O gráfico abaixo mostra o número de nascimentos e mortes no mundo entre 1950 e 2100. Nota-se que a distância entre as duas curvas era grande, mas vai haver igualdade em 2084, para depois haver inversão das curvas e a troca do crescimento pelo decrescimento populacional. O número de nascimentos no mundo foi de 91,8 milhões de bebês em 1950, subiu até o pico de 145,3 milhões de bebês em 2014, deve atingir 118,2 milhões em 2084 e cair para 110 milhões em 2100. Já o número de óbitos globais era de 48,5 milhões em 1950, deve atingir 118,6 milhões em 2084 e subir ainda mais para 123 milhões em 2100. No final do século o número de óbitos deve superar o número de nascimentos em cerca de 23 milhões de casos.
Mas estas tendências globais representam uma unidade da diversidade, pois enquanto há muitos países avançados na transição demográfica, outros países ainda estão nas fases iniciais da transição de altas para baixas taxas de mortalidade e natalidade.
A tabela abaixo mostra os 12 países mais populosos do mundo em diferentes datas: 1950, 2024 e 2100. Nota-se que em 1950, a China tinha uma população muito maior do que a da Índia, os EUA estavam em terceiro lugar seguido da Rússia e do Japão. Havia a presença de 3 países europeus (Alemanha, Reino Unido e Itália) e o Brasil estava em 8º lugar.
Entre os 12 países mais populosos em 2024, a Índia já havia ultrapassado a China, a Indonésia pulou para o 4º lugar, o Paquistão para o 5º lugar, seguido da Nigéria e do Brasil. A Rússia caiu para o 9º lugar e o Japão para o 12º lugar. Todos os países europeus saíram do ranking dos 12 maiores em 2024.
As mudanças serão ainda mais significativas em 2100, com a população da China ficando com menos da metade da população da Índia, os EUA caindo para o 6º lugar, Paquistão, Nigéria e República Democrática do Congo ficando entre o 3º e o lugar 5º lugar, com mais 3 países africanos na lista e o Brasil caindo para o 12º lugar.
Portanto, entre os 12 países mais populosos do mundo, existem países que já apresentam decrescimento populacional como a China, a Rússia, o Japão e a Itália e países que ainda apresentam grande crescimento demográfico com o Paquistão, a Nigéria, a República Democrática do Congo, a Etiópia e o Egito. A Índia e a Indonésia ainda apresentam crescimento da população, mas vão apresentar decrescimento populacional na segunda metade do século XXI.
A dinâmica demográfica brasileira entre 1950 e 2100
O Brasil tem uma transição demográfica tardia, mas muito rápida. O gráfico abaixo, mostra que, entre 1950 e 1965, a taxa de fecundidade total (TFT) do Brasil estava acima de 6 filhos por mulher e a expectativa de vida ao nascer estava em torno de 50 anos na década de 1950. As taxas de mortalidade e de natalidade eram altas na maior parte da história brasileira.
A expectativa de vida ao nascer no Brasil subiu de 50 anos em 1950 para 75,8 anos em 2019, caiu para 73 anos em 2021, em decorrência da pandemia da covid-19, mas já recuperou a tendencia de alta e marcou 75,85 anos em 2023, devendo atingir 86,8 anos em 2100. Nos mesmos 150 anos, a TFT caiu de mais de 6 filhos na década de 1950 para 2 filhos por mulher em 2003 e deve se manter abaixo do nível de reposição, em torno de 1,6 filhos por mulher até 2100.
O gráfico abaixo mostra o número de nascimentos e mortes no Brasil entre 1950 e 2100. O número de nascimentos no Brasil estava em 2,48 milhões de bebês em 1950, chegou ao pico no primeiro quinquênio da década de 1980 com cerca de 4 milhões de nascimentos e deve cair para 1,27 milhão de nascimentos em 2100. O número de óbitos estava em 910 mil em 1950, deve empatar com os nascimentos em 2042, com 2,15 milhões de casos e deve ficar em 2,45 milhões de óbitos em 2100. Entre 2043 e 2100 o Brasil deve perder pouco mais de 50 milhões de habitantes, pois terá uma estrutura etária envelhecida.
Pelas projeções da Divisão de População da ONU, a população total do Brasil deve crescer 3,2 vezes entre 1950 e 2100, o grupo etário 0-14 anos deve diminuir em cerca de 10%, a população de 15 a 59 anos deve crescer 2,8 vezes e a população de idosos de 60 anos e mais de idade deve dar um salto de 31,2 vezes no período. Isto quer dizer que a proporção de idosos na população total do Brasil vai aumentar exponencialmente e os idosos de 60 anos e mais idade que representavam 4% da população total em 1950, passou para 7,7% no ano 2000, atingiu 15,3% em 2023 e deve alcançar 39% da população total em 2100.
Em geral, o declínio da fecundidade e o envelhecimento populacional provocam medo entre políticos, religiosos e investidores. Eles se alarmam com os custos financeiros dos sistemas de aposentadorias, pensões, saúde e com as baixas taxas de crescimento econômico. Geralmente negam os efeitos da crise climática e ambiental. O ex-presidente dos Estados Unidos da América (EUA), Donald Trump, juntamente com o bilionário Elon Musk, têm afirmado que “o colapso da taxa de fecundidade é uma ameaça maior para a civilização ocidental do que a Rússia” (WSJ, 13/05/24).
Mas como mostrei no artigo “Japão apresenta decrescimento demográfico com crescimento da renda per capita”, publicado aqui no # Colabora, (Alves, 29/04/2024) o Japão, que é o país mais envelhecido do mundo, já apresenta decrescimento da população desde 2010, mas tem registrado crescimento da renda per capita e diminuição da pegada ecológica. Nas próximas décadas o Japão deve apresentar baixo crescimento econômico (ou até crescimento zero do PIB), mas poderá apresentar avanços sociais e ambientais em função do decrescimento com prosperidade da população.
O demógrafo Vegard Skirbekk, no livro “Decline and Prosper! Changing Global Birth Rates and the Advantages of Fewer Children” (2022) considera que a fecundidade muito baixa pode causar tensões fiscais e afetar negativamente o crescimento econômico. Contudo, uma taxa de fecundidade total (TFT) entre 1,5 e 2 filhos por mulher favorece a autonomia reprodutiva, a igualdade de gênero e o avanço da educação e do mercado de trabalho. Baixa fecundidade favorece os investimentos na qualidade de vida das crianças e ajuda a minimizar o impacto humano no planeta. Além disso, segundo o autor, é hora de aceitar que a baixa fecundidade veio para ficar. As políticas públicas é que precisam se adaptar a essa nova realidade demográfica.
Portanto, o Brasil e muitos países do mundo caminham para o decrescimento demográfico e o aprofundamento do envelhecimento populacional, como mostraram as novas projeções populacionais da Divisão de População da ONU. Mas o “tsunami grisalho” pode ser benéfico se houver um aproveitamento do potencial produtivo e criativo dos idosos que terão um peso cada vez maior na sociedade.
O fim do crescimento econômico e o avanço do envelhecimento são fenômenos inexoráveis para as pessoas e para as populações. Mas esta nova configuração demográfica não implica necessariamente em retrocesso nos indicadores sociais. O mundo pode ser um lugar melhor para se habitar se o decrescimento populacional dos países for acompanhado do aumento do bem-estar social, da redução da pegada ecológica e da eliminação do déficit ambiental global. Como disse, em 1973, o economista e ambientalista E. F. Schumacher: “Small Is Beautiful”.
Referências:
ALVES, JED. Japão apresenta decrescimento demográfico com crescimento da renda per capita, # Colabora, 29/04/2024 https://projetocolabora.com.br/artigo/japao-alia-queda-da-populacao-com-crescimento-da-renda-per-capita/
Greg Ip. Suddenly There Aren’t Enough Babies. The Whole World Is Alarmed, WSJ, 13/05/2024
https://www.wsj.com/world/birthrates-global-decline-cause-ddaf8be2?mod=hp_lead_pos7
SKIRBEKK, Vegard. Decline and Prosper! Changing Global Birth Rates and the Advantages of Fewer Children, Palgrave Macmillan, 2022
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José Eustáquio Diniz Alves é sociólogo, mestre em economia, doutor em Demografia pelo Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar/UFMG), pesquisador aposentado do IBGE, colaborador do Projeto #Colabora e autor do livro "ALVES, JED. Demografia e Economia nos 200 anos da Independência do Brasil e cenários para o século" (com a colaboração de F. Galiza), editado pela Escola de Negócios e Seguro, Rio de Janeiro, 2022.