Não há nada igual: Museu do Pontal tem nova sede para abrigar a maior coleção de arte popular brasileira

Depois de sofrer durante anos com alagamentos causados pela ocupação desordenada da vizinhança, o acervo agora está exposto em uma construção sustentável na Barra da Tijuca, no Rio

Por Carla Lencastre | ODS 11 • Publicada em 21 de janeiro de 2022 - 11:26 • Atualizada em 1 de dezembro de 2023 - 18:43

Museu do Pontal: acervo de nove mil obras de arte popular ganha novo endereço na Barra da Tijuca (Foto Marco Antonio Rezende)

Como cantava Tim Maia, “do Leme ao Pontal, não há nada igual”. A canção se refere às praias cariocas. Mas a coleção de arte popular brasileira do Museu do Pontal também é de beleza única. Desde o final de 2021 o acervo está em novo endereço, na Barra da Tijuca, na Zona Oeste do Rio de Janeiro. Com uma das mais importantes coleções do país, o museu sofreu os efeitos do desequilíbrio ambiental. Depois de alagamentos constantes na sede original na Casa do Pontal, também na Zona Oeste do Rio, agora o acervo ocupa um prédio novo próximo ao Bosque da Barra. O edifício foi construído especialmente para abrigar a excepcional coleção formada ao longo de 45 anos pelo francês Jacques van de Beuque (1922-2000). A sustentabilidade guiou o projeto arquitetônico, custeado por doações de empresas e financiamento coletivo, e marca o início de uma nova fase da instituição, fundada em 1976.

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Visitar o Museu do Pontal é viajar por um Brasil colorido, inclusivo, poético, muitas vezes divertido, às vezes um pouco triste. Em um arejado espaço de mil metros quadrados estão cerca de duas mil peças, objetos em barro em sua maioria, representando manifestações da cultura popular tão diferentes quanto um exuberante desfile de uma escola de samba no Sambódromo carioca ou uma singela orquestra de pífanos. Sob o tema central “Novos ares: Pontal reinventado”, a exposição se divide pelos ambientes no piso térreo em “Brincares: brincadeiras e brincantes”, “Terra, terra: o Jequitinhonha e suas tradições”, “Entre beiras e margens: fogo, água, ar”, “Devoções” e “Poética da criação”. A ideia é fazer um rodízio entre as diferentes obras do acervo do museu, e apresentar também objetos de outras coleções de arte popular.

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Museu do Pontal
“Carnaval”, de Adalton Fernandes Lopes: uma das manifestações populares representadas no Pontal (Foto Marco Antonio Rezende)

Como é a nova sede do Museu do Pontal

A construção de dois pavimentos, em concreto aparente, aço e vidro, com pé direito alto, foi projetada para abrigar e proteger o patrimônio com mais de nove mil obras produzidas ao longo do século 20 por cerca de 300 artistas brasileiros. O acervo do Museu do Pontal, o maior do país de arte popular, é considerado também um dos mais importantes e uma referência do tema.

O projeto da nova sede é do escritório mineiro Arquiteto Associados, que tem no currículo o pavilhão brasileiro na Bienal de Veneza de 2021 e galerias no Instituto Inhotim (MG). O desenho do prédio levou em conta o percurso do sol ao longo do ano e os ventos da região. O museu ocupa uma área 14 mil m², e tem um café e uma loja. O projeto paisagístico, assinado pelo escritório Burle Marx, reflete a questão sustentável. A maior parte do terreno é um jardim regado com água reaproveitada das chuvas, que privilegia 73 espécies nativas brasileiras. O dinheiro foi arrecadado através de uma campanha de financiamento coletivo e permitiu o plantio de 30 mil mudas, como bromélias, costela-de-adão, pitangueiras e pau-brasil. A vegetação se integra ao acervo por janelas estrategicamente recortadas. Além de trazer o verde para dentro do museu, os recortes oferecem ventilação natural cruzada, um ponto positivo a mais em tempos de pandemia. Apenas 30% do espaço tem ar-condicionado.

A nova sede do Museu do Pontal é cercada por uma área verde com paisagismo do escritório Burle Marx (Foto Marco Antonio Rezende)

“O processo de engajamento foi em todos os níveis, com o terreno doado pelo município, o apoio de empresas privadas e a participação do público. O Museu do Pontal é um legado que estamos deixando para as próximas gerações, para que elas valorizem a diversidade artística brasileira”, diz Lucas van de Beuque, diretor executivo e neto de Jacques.

O crescimento urbano caótico na região do Pontal contribui para a degradação do terreno em que o museu estava instalado. Uma ocupação mal planejada e predatória no entorno começou a causar inundações constantes na sede original. O problema se agravou com um grande empreendimento imobiliário na vizinhança projetado para as Olimpíadas de 2016 e erguido sobre um aterro em uma área elevada em relação ao museu. Como forma de compensação pelos alagamentos cada vez mais frequentes, a Prefeitura do Rio cedeu o terreno para a nova sede. A construção do imóvel foi feita foi recursos da iniciativa privada.

As linhas retas do prédio construído para abrigar a coleção do Museu do Pontal (Foto Marco Antonio Rezende)

“Resistimos quase uma década às adversidades para chegar à situação atual”, diz a antropóloga e curadora Angela Mascelani. “Agora o Pontal é uma casa de portas abertas”.

A relação entre arte e natureza, que vem da sede original da instituição, é um dos pilares de um museu repleto de obras que fazem referências à vida no campo, a um cotidiano rural, à agricultura. No final de outubro, foi inaugurada uma horta com ervas aromáticas. A ideia é que o espaço seja usado para atividades educativas, como oficinais infantis de ecologia. Com atividades extras ou não, o museu e os jardins são um programão também para crianças de todas as idades, que podem aproveitar tanto as exposições quanto a ampla área ao ar livre.

Procissão: uma das obras do acervo de cerca de nove mil peças de arte popular (Foto Marco Antonio Rezende)
Serviço

O Museu do Pontal fica perto do Bosque da Barra, na Avenida Célia Ribeiro da Silva Mendes s/nº, telefone (21) 2490-2429. Abre de quinta-feira a domingo, das 10h às 18h. Entrada gratuita, com contribuição sugerida de R$ 20. As visitas podem ser agendadas pela plataforma Sympla.

Carla Lencastre

Jornalista formada pela Universidade Federal Fluminense (UFF), trabalhou por mais de 25 anos na redação do jornal O Globo nas áreas de Comportamento, Cultura, Educação e Turismo. Editou a revista e o site Boa Viagem O Globo por mais de uma década. Anda pelo Brasil e pelo mundo em busca de boas histórias desde sempre. Especializada em Turismo, tem vários prêmios no setor e é colunista do portal Panrotas. Desde 2015 escreve como freelance para diversas publicações, entre elas o #Colabora e O Globo. É carioca e gosta de dias nublados. Ama viajar. Está no Instagram em @CarlaLencastre 

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