Chega de medidas tópicas e superficiais após crimes de PMs

Assassinato de cinco jovens em Costa Barros, RJ, é o quinto caso do tipo só este ano; Ministério Público deve fiscalizar atividades de policiais, como previsto na Constituição

Por Jorge Antonio Barros | ODS 1ODS 11 • Publicada em 1 de dezembro de 2015 - 08:00 • Atualizada em 3 de dezembro de 2015 - 10:09

Parentes e amigos dos jovens assassinados por policiais militares posam com cartazes e uma bandeira com 50 tiros
Parentes e amigos dos jovens assassinados por policiais militares posam com cartazes e uma bandeira com 50 tiros
Parentes e amigos dos jovens assassinados por policiais militares posam com cartazes e uma bandeira com 50 tiros

O secretário de Segurança do estado, José Mariano Beltrame, considerou “trágico e indefensável”. A PM, em nota, lamentou os últimos acontecimentos envolvendo policiais sob seu comando. Disse também que os atos conflitam com as orientações do Comando da Corporação, personificado pelo coronel Pinheiro Neto, ex-Bope e homem de elite da Polícia Militar. Ele também exonerou o comandante do 41º BPM (Irajá), tenente-coronel Marcos Netto. Naquela unidade da PM estavam lotados os quatro policiais presos e acusados de mais uma chacina covarde. Desta vez foram executados cinco jovens em Costa Barros, na Zona Norte do Rio, sábado. O carro em que estavam os inocentes – provavelmente confundido com um bonde do tráfico – foi metralhado. Não sobrou ninguém para contar a história. Como se não bastasse terem puxado o gatilho, os assassinos de farda adulteraram o local do crime com a finalidade de incriminar as vítimas.

Não resta dúvida de que a cúpula da Segurança Pública está mais uma vez envergonhada diante de um absurdo desses praticado por policiais militares. Mas isso é pouco, realmente muito pouco para um tipo de crime que tem se repetido sem qualquer sinal de controle por parte do poder público. Só este ano é a quinta vez que ocorre algo semelhante envolvendo justamente os agentes da lei, que deveriam proteger a sociedade. Sem contar o caso dos mototaxistas Gleberson Nascimento Alves e Alan de Souza Pereira, que foram mortos por PMs, depois que estes confundiram com um fuzil a peça de moto que Gleberson levava, no ano passado.

No dia 7 de novembro deste ano, o bancário Marco Antônio Pereira, de 51 anos, foi baleado pelas costas pelo major Carlos Ludwig, quando o carro em que estava o homem furou uma blitz na Praça Seca, área conflagrada na Zona Norte da cidade. No dia 4 de novembro, um adolescente foi baleado por um PM que confundiu um skate com uma arma, no Alto Leblon. No dia 29 de outubro, Thiago Guimarães Dingo e Jorge Lucas Martins Paes foram mortos pelo sargento Fernando Dias Chaves, do 41º BPM, que confessou ter atirado após confundir com uma arma de fogo o macaco hidráulico que Jorge carregava. E a história mais absurda porque teve um vídeo flagrando o crime: no dia 29 de setembro, Eduardo Felipe Santos Victor, de 17 anos, foi morto por policiais militares da UPP da Providência, na região central do Rio.

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Desde a década de 80, PMs têm participado de chacinas que incluem entre as vítimas tanto culpados como inocentes. Atuam como promotores, juízes e executores de penas extrajudiciais.

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Em muitos casos, poderíamos até imaginar que os PMs estão com problema de visão e por isso cometendo tantos erros que custam vidas. Só que não é apenas um problema de ótica. Esse tipo de crime confirma não apenas que aqueles policiais militares estão despreparados para viver os dias de tensão que têm crescido com a violência urbana. Essa violência policial caracteriza também um modus operandi que obviamente é uma herança da PM que foi colocada nas ruas durante a ditadura militar para combater a subversão custasse o que custasse. Desde a década de 80, policiais militares têm participado de chacinas que incluem entre as vítimas tanto culpados como inocentes. Esses policiais atuam como promotores, juízes e executores de penas extrajudiciais. Outro aspecto desse drama é que aquelas vítimas, em sua maioria moradores das áreas pobres da cidade, são duplamente “punidas” pelo Estado. Seja na exclusão social que lhes é imposta pelas arbitrariedades do modelo econômico, seja no destino cruel na ponta de um fuzil empunhado pelo agente do Estado.

Por tudo e mais um pouco já passou da hora de as autoridades tomarem providências, que não sejam tópicas ou superficiais. Enquanto as corregedorias unificada e da PM não conseguem estabelecer o controle da situação, o Ministério Público estadual deve assumir seu papel e fiscalizar as atividades policiais, conforme previsto pelo artigo 129 da Constituição Federal, a chamada Constituição cidadã de 1988. O MP deve propor imediatamente a revisão de todos os chamados autos de resistência (morte em confronto ou resultante da ação policial)  no Estado do Rio, pelo menos nos últimos cinco anos. Temos sempre que evitar a generalização e colocar no mesmo saco todos os policiais militares. Mas o poder público precisa dar um basta à esta sensação de impunidade em crimes praticados por seus próprios agentes.

Só assim a sociedade terá garantido o direito à segurança assim como a PM poderá também ver restabelecida a confiança na bicentenária instituição, cujo lema é proteger e servir a sociedade.

 

Jorge Antonio Barros

É jornalista especializado em segurança pública e criminalidade desde 1981, autor do blog Repórter de Crime e do Twitter @reporterdecrime

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