Cachoeira, celebrada pela resistência, vira capital da Bahia no 2 de Julho

Cachoeira, celebrada pela resistência, vira capital da Bahia no 2 de Julho

Tropa perfilada em Cachoeira ao lado do marco lembrando a Independência: município histórico vira capital da Bahia no 2 de Julho (Foto: Feijão Almeida / Governo da Bahia - 25/06/2023)

Retomando tradição, governador leva todo secretariado para festejar município histórico do Recôncavo, protagonista da luta pela Independência

Por Vinícius Nascimento | ODS 11ODS 16 • Publicada em 2 de julho de 2023 - 01:12 • Atualizada em 2 de julho de 2024 - 08:43

“Estamos na capital da Bahia”, disse orgulhoso o cachoeirano Alcides Santana, 33, com um copinho de licor de jenipapo do Arraiá do Quiabo, tradicional produtor da região, na frente da casa de sua avó, Maria, a quem foi visitar durante os festejos de São João. Morador de São Paulo há seis anos, Alcides nem parou em Salvador: desembarcou no aeroporto e foi diretor para o Recôncavo. Em Cachoeira, participou dos festejos juninos e assistiu sua cidade virar capital da Bahia, mais uma vez.

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Desde 2008 é assim. No dia 25 de junho, a cidade do Recôncavo, centro da resistência baiana aos portugueses nas batalhas pela Independência do Brasil, torna-se simbolicamente capital do estado por uma semana, até o 2 de julho, quando é comemorada a Independência na Bahia do Brasil – para muitos baianos, a verdadeira Independência.

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O historiador e professor Rafael Dantas explica que Cachoeira é a grande protagonista da luta pela independência do Brasil na Bahia. Na cidade, iniciou-se o confronto armado contra os portugueses, justamente em um 25 de junho como aquele que Alcides tomava seu licor 201 anos mais tarde. Os cachoeiranos haviam proclamado, ainda antes do Grito do Ipiranga, Dom Pedro I como o Regente Constitucional do Brasil e, com a Junta Conciliatória, deram início à retaliação contra a presença do general Madeira e Melo, que ameaçava a Vila com uma canhoneira (navio de guerra com canhões).

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Os livros não contam tudo o que realmente aconteceu. Os indígenas, negros, trabalhadores e mulheres que estiveram à frente das batalhas não entram nos relatos. Foram muitas as ações pela saída dos portugueses, em todos os cantos do país, mas o berço da reação foi aqui

Jerônimo Santana
Governador da Bahia

Cachoeira resistiu e manteve muitas das edificações daquela época. A cidade foi tombada pelo Instituto do Patrimônio e Histórico Artístico Nacional (Iphan) em 1971, embora muitos bens tenham sido tombados, individualmente, na década de 1940. De acordo com o Iphan, além do acervo colonial, a Ponte D. Pedro II (estrutura de ferro), o mercado, a ferrovia e a hidrelétrica são importantes marcos culturais. A área tombada possui, aproximadamente, 670 edificações. O conjunto arquitetônico – formado na sua maioria por edifícios do século XVIII e XIX – caracteriza-se pela tendência neoclássica que, no século XIX, influenciou a construção de novos prédios e reformou os antigos. Este patrimônio também inclui edificações do século XVII.

Durante os oitos anos do petista Jaques Wagner à frente do governo baiano, o governador – hoje senador – foi presença certa na transferência da capital. Seu sucessor, o correligionário e hoje ministro Rui Costa, que não é tão chegado a festas, ignorou Cachoeira durante seus dois mandatos. Não foi uma vez sequer. A responsabilidade da troca de capital ficava para o então vice-governador João Leão, que rompeu com Costa nas últimas eleições.

Também filiado ao PT, o atual governador Jerônimo Rodrigues retomou a tradição. Mais do que isso, convocou todo o seu secretariado para ir até a cidade histórica na cerimônia oficial. “Os livros não contam tudo o que realmente aconteceu. Os indígenas, negros, trabalhadores e mulheres que estiveram à frente das batalhas não entram nos relatos”, disse o governador ao justificar sua presença. “Foram muitas as ações pela saída dos portugueses, em todos os cantos do país, mas o berço da reação foi aqui”, completou durante a solenidade.

O governador Jerônimo Santana na solenidade de transferência da capital para Cachoeira em frente à Câmara Municipal: edificação do século XVIII, tombada do Iphan, foi palco da organização pela luta da Independência na Bahia (Foto: Feijão Almeida / Governo da Bahia - 25/06/2023)
O governador Jerônimo Santana na solenidade de transferência da capital para Cachoeira em frente à Câmara Municipal: edificação do século XVIII, tombada do Iphan, foi palco da organização pela luta da Independência na Bahia (Foto: Feijão Almeida / Governo da Bahia – 25/06/2023)

Prefeita da cidade, Eliana Gonzaga (Republicanos) afirmou que o reconhecimento oficial é justo e tem forte simbologia para o município que fica a cerca de 120 quilômetros de Salvador. A cidade pacata também é símbolo de bons licores e ganha movimento bem maior do que os cerca de 33 mil habitantes tradicionais, segundo estimativa do IBGE, durante o São João. Sua festa literária, realizada anualmente no mês de novembro, é a mais tradicional da Bahia.

Natural de Cachoeira, o também historiador Igor Almeida explica que a posição geográfica de Cachoeira foi determinante para a sua importância na Guerra de Independência. Ele afirma que Cachoeira era a principal vila do interior da Bahia em 1822, quando começaram rebeliões em Salvador contestando a nomeação de Madeira de Melo a comandante das armas da Bahia. Esse movimento se desloca até o Recôncavo, e se concentra em Cachoeira. Atualmente, é de lá, em 1º de Julho, que sai o fogo simbólico da Independência, que também passa por Simões Filho até chegar ao bairro de Pirajá, em Salvador, nas celebrações do 2 de Julho.

Almeida avalia que a presença de nomes do primeiro escalão do Poder Público é uma tentativa válida de mostrar a importância da data tanto para o estado quanto para o Brasil. No entanto, o historiador acredita que é necessário ir além: estimulando a presença de estudantes nos cortejos, fortalecendo a Independência dentro do currículo formal de escolas e pensando em ações para que o 2 de Julho seja uma data cobiçada dentro do Estado. Nos últimos dois anos, Luís Inácio Lula da Silva esteve presente – em 2023, foi a primeira como presidente da República.

Vinícius Nascimento

Vinícius Nascimento é jornalista, formado pela Universidade Federal da Bahia, e tem passagens por veículos como TV Band, Jornal Correio e Instituto Mídia Étnica

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