“As pessoas com síndrome de Down têm que ser livres também”. A frase é de João Vitor de Paiva Bittencourt, 23 anos, estudante de educação física e conselheiro jovem do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef). Fernanda Honorato, 44 anos, acredita no mesmo e atua como jornalista e palestrante para promover a inclusão social e, nas palavras dela: “dar xô para o capacitismo”. Já Eduardo Gomes, 33 anos, mais conhecido como Dudu do Cavaco, utiliza a música como forma de quebrar barreiras e mostrar que os palcos também são espaços para pessoas com síndrome de Down.
Os três são influenciadores digitais e ocupam lugares de destaque na construção de uma sociedade mais diversa e inclusiva. Além disso, através de suas vozes e ações, ela e eles ajudam a desconstruir preconceitos contra pessoas com síndrome de Down nas redes sociais. “Eu nunca pude imaginar que as pessoas se inspirariam em mim. Me sinto muito orgulhosa e honrada com tudo isso”, afirma Fernanda Honorato sobre o reconhecimento que recebeu como repórter do Programa Especial da TV Brasil.
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Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), existem cerca de 300 mil pessoas com síndrome de Down (SD) no Brasil, número que deve ser atualizado no Censo 2022. A escolha do dia 21 de março como o Dia Internacional da síndrome de Down não é um acaso. A condição genética que caracteriza a SD é a chamada Trissomia 21. Todas as células humanas são divididas em 23 pares com um total de 46 cromossomos, duas cópias em cada par, no caso das pessoas com SD, esse número é de 47 por conta de uma terceira cópia do cromossomo 21.
Durante muitos anos, a síndrome de Down foi vista como uma doença, o que reflete no capacitismo (nome que descreve o preconceito que coloca pessoas com deficiência em uma condição de inferioridade). Foi através da campanha #atualizagoogle de outra influencer, a atriz, modelo e artista Vitória Mesquita que o Google – maior site de buscas do mundo – passou a descrever a trissomia do cromossomo 21 como condição genética.
Apenas recentemente pessoas com síndrome de Down passaram a aparecer em diferentes setores da sociedade, como a moda, o jornalismo, a arte, a música e as redes sociais. Desde então, nomes como o da modelo Maju de Araújo e das atrizes Joana Mocarzel e Cacai Bauer e do pequeno Marcelinho (5 anos e 600 mil seguidores no Instagram), além de Vitória, João Vitor, Fernanda e Dudu, começaram a ser mais conhecidos e a servir de exemplos não de superação, mas de que essa condição genética não os impede de ocupar espaços de representatividade política, social e cultural.
João Vitor: apaixonado por esportes e conselheiro da Unicef
Estudante de educação física da Pontifícia Universidade Católica (PUC-Goiás) e morador de Goiânia, João Vitor ganhou visibilidade ao demonstrar sua rotina como universitário nas redes sociais. Atualmente, ele possui mais de 560 mil seguidores no Instagram e mais de 260 mil no Tik Tok. A desconstrução de preconceitos e a representatividade nas redes o levaram a se tornar o primeiro conselheiro com Trissomia 21 do Conselho Consultivo de Adolescentes e Jovens do Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância) no Brasil, em agosto de 2023.
A participação ativa nos debates de políticas públicas e o olhar diferenciado e inclusivo, fez com que o mandato de João Vitor fosse prorrogado pela entidade em fevereiro deste ano. “Gosto muito de ajudar as pessoas, de pensar com outras pessoas e interagir com elas”, comenta. Atualmente no 7° período do curso, o jovem deseja se tornar personal trainer para ajudar outras pessoas a cuidarem do corpo. “Inclusive estou fazendo estágio também na faculdade, que é (um projeto) muito bacana para idosos e crianças”, complementa.
Além disso, o carisma e o jeito descontraído fizeram com que o jovem goiano fosse convidado para integrar o elenco do longa “Colegas e o Herdeiro”, filme dirigido por Marcelo Galvão com pessoas com síndrome de Down como protagonistas. Durante as gravações, João Vitor passou 40 dias em Porto Alegre. A previsão é de que o filme seja lançado em 2025. “A gente fez um filme para mostrar que mesmo a gente com síndrome de Down é capaz de fazer um filme, mostrar o quanto somos atores”, destaca. Um dos principais desejos do jovem é evitar com que outras pessoas sofram com o capacitismo: “eu não quero deixar ninguém ser excluído, nem invisível”.
Fernanda: jornalista, palestrante e rainha de bateria
Carioca e fã de Marília Gabriela, Fernanda Honorato carrega o jornalismo nas suas veias e desde pequena já brincava de fazer entrevistas com seus familiares. Não deu outra: ela se tornou a primeira repórter com Trissomia 21 do Brasil. “Eu gosto de ver programas de jornalismo, nunca gostei de ver desenho”, conta ela. Seu início da carreira, no entanto, foi no teatro e o ingresso de telejornalismo veio após um episódio de descontração.
Fernanda era rainha de bateria em um projeto chamado Samba Mestre Robson. Durante um evento, ela quebrou o protocolo e resolveu entrevistar algumas das pessoas que estavam no local. “Eu já peguei o microfone, uma jaqueta dessa produtora, e saí entrevistando alguns pais”. A desenvoltura na frente das câmaras chamou atenção e ela foi convidada para fazer um teste na TV Brasil.
Quando fala sobre sua profissão, ela menciona o acolhimento dos colegas e o reconhecimento pelo público. “Quando eu entrei para o programa especial, veio uma mãe até mim com um tablet na mão e uma criança no colo. Ela falou assim para mim: ‘Fernanda, você serve de inspiração para muita gente’”, recorda a jornalista. Palestrante, ativista e apaixonada por Carnaval, Fernanda participou este ano do desfile da Portela e foi rainha de bateria do coletivo inclusivo “Embaixadores da Alegria”, escola de samba com foco na inclusão e acessibilidade.
Após mais de 15 anos como repórter do Programa Especial, Fernanda coleciona memórias de entrevistas com personalidades como os cantores Daniel, Chico Buarque, Leonardo, Zezé di Camargo e Maria Bethânia – cantora pela qual ela é apaixonada. “Foi uma alegria imensa, eu fiquei muito honrada, muito feliz da vida, porque eu sempre gostei da Bethânia”, relembra ela que também foi uma das pessoas responsáveis por carregar a tocha dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, em 2016. Outro dos entrevistados de Fernanda foi o músico Dudu do Cavaco, durante uma das edições do Programa Especial.
Dudu do Cavaco: músico, palestrante e fã de samba
Desde criança, as rodas de samba sempre atraíram a atenção do mineiro Eduardo Gomes, mais conhecido como Dudu do Cavaco. A inserção definitiva nas rodas de samba ocorreu na companhia do pandeiro já aos 12 anos. Incentivado pelos pais que notavam o potencial do garoto para a música, Dudu aprendeu a tocar o cavaco, seu instrumento preferido entre os dez que domina.
Hoje Dudu viaja pelo país ao lado do irmão mais velho, o professor e palestrante Leonardo Gontijo. Juntos, eles criaram o Instituto Mano Down, uma das entidades de maior referência na promoção da autonomia e inclusão de pessoas com síndrome de Down e outras deficiências no Brasil. Foi através do Instituto que Dudu conheceu a modelo Vitória Rosa – também com com quem se casou em 2022.
Questionado sobre a música que mais gosta de tocar, o artista cita a inspiração em Vitória. “A que eu mais gosto de tocar mesmo, a minha música preferida, é do Roberto Carlos: ‘Como é grande o meu amor por você’. Essa música eu sempre dedico pra minha esposa”. Ao longo da carreira, o músico e influenciador já participou de diferentes programas de TV e shows. Ao relembrar os momentos marcantes, o artista cita a abertura da apresentação da banda Jota Quest no Mineirão. “Eu gosto muito de tocar, fazer shows e levar amor para as pessoas”, enfatiza Dudu do Cavaco.