ODS 1
Uma só Voz: coral resgata autoestima de moradores de rua no Rio
Mais de 1,2 mil pessoas já passaram pelo projeto, que realiza ensaios às quartas no Museu do Amanhã. 'Momento de alegria', diz participante
Lembro-me ainda hoje da surpresa que tive quando ouvi sobre a existência de um coral composto por moradores e ex-moradores de rua e que fazia seus ensaios, imagine, dentro do Museu do Amanhã, no Rio. Toda quarta-feira esses homens e mulheres passam a tarde juntos dando um novo significado à sua existência no mundo, assumindo um novo papel. No caso dos participantes do ‘Uma só Voz’, além da importância de se sentirem dentro de um grupo e portanto dentro da sociedade – não mais invisíveis – é fazer isso cantando, buscando uma voz de dentro que foi, muitas vezes ao longo da vida, silenciada ou ignorada.
Para contar a história do surgimento do ‘Uma Só Voz’ é preciso viajar no tempo e no espaço. Não é uma ideia originalmente brasileira. O projeto With One Voice surgiu em 2012, no Reino Unido, durante as Olimpíadas de Londres. Iniciativas que trabalhavam com fomento de arte para moradores de rua foram convidadas a se apresentar nas festividades das Olimpíadas. Depois do escandaloso sucesso, o projeto do coral foi logo capitaneado pela ONG Streetwise Opera, com o objetivo de capacitar pessoas em situação de rua em diferentes cidades do mundo.
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Veja o que já enviamosOs responsáveis pelo projeto vieram ao Brasil para estudar se era possível realizar o mesmo feito nas Olimpíadas e Paraolimpíadas do Rio de Janeiro no ano de 2016. A iniciativa chegou então ao Rio como parte das Olimpíadas Culturais por meio da ajuda da ONG People’s Palace Projects. Desde então, o Museu do Amanhã é um dos apoiadores. Além do ensaio, eles tomam café e almoçam juntos às quartas. Também desenvolvem atividades com psicólogos e arte-terapeutas. Mais de 1,2 mil pessoas já passaram pela história do coral. Muitas delas conseguiram um trabalho e deixaram de morar na rua.
Além das apresentações no próprio Museu, o Coral Uma só Voz já se apresentou no Theatro Municipal, na chegada da tocha olímpica no Cristo Redentor, no Museu de Arte Moderna e no Centro Cultural do Banco do Brasil.
[g1_quote author_name=”Ricardo Branco” author_description=”Diretor e regente” author_description_format=”%link%” align=”left” size=”s” style=”simple” template=”01″]Por algum motivo complexo, uma pessoa está em situação de rua, o que não quer dizer que ela não possa superar este momento. Acreditamos que a arte é uma grande ferramenta para transformar vidas
[/g1_quote]O diretor e regente do Coral, Ricardo Branco Vasconcellos, conhecido como Rico por todos, está à frente do projeto desde o início. “A vida de todos aqui tem o mesmo valor que a nossa. Por algum motivo complexo, uma pessoa está em situação de rua, o que não quer dizer que ela não possa superar este momento. Acreditamos que a arte é uma grande ferramenta para transformar vidas. Depois de uma apresentação, por exemplo, eles olham para dentro de si e percebem que podem ir mais além.”
Fabio Moraes, diretor do setor de relações comunitárias e responsável pela mediação social do Museu, contou que a proposta para esse ano é potencializar mais a voz deles: “A ideia é que as pessoas se interessem pela voz mesmo e não só pela história pessoal de cada um. Eles não precisam de pena. Ela é destrutiva. Por mais que eu sinta, não posso demonstrar. E eles não vêm aqui apenas para cantar, é algo também para o ego deles. Você pode notar que se chega alguém pra olhar, eles fortalecem a voz, cantam mais alto”.
Para se manter, o projeto recebe doações. No site da ONG People’s Palace Projects e na página do coral no Facebook, você pode se informar sobre como ajudar.
Tanto Fabio quanto Rico demonstraram sua angústia por pensar que não conseguem fazer muito. “Eles saem daqui e o que acontece? Voltam ao ostracismo moral”, foram algumas das palavras de Fabio. Seu receio é compreensível, entretanto são os próprios integrantes do coral que afirmam o caráter potente e transformador do encontro com a própria voz. “É um momento que, por mais que você esteja desencantado com essa nossa vida, com o cotidiano… a gente encontra um momento de alegria, de extravasar, de cantar. E eu acho que todo mundo precisa ter um horizonte”, são as palavras do coralista e flautista do Uma Só Voz: Luiz Felipe de Oliveira. Para Alexandre Balbino, outro participante, a crença naquilo que fazem é essencial: “Nós acreditamos na amizade, na música, e com esperança vamos vencer”.
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Carioca crescida na região Sul Fluminense, Thaís Mandarino é formada em Jornalismo pela PUC-Rio. Trabalhou como assistente de produção nos programas Entre Fronteiras, do Canal Futura, e Observatório da Imprensa, da TV Brasil. Apaixonada pela escrita, é estudante de roteiro, e acredita que o cinema e a palavra são ferramentas potentes de resistência e reinvenção.