O movimento dos “pé-no-chão” veio para ficar. Há os grupos que se dedicam a pesquisas sobre a mobilidade dos pedestres nas cidades, há os que mobilizam os cidadãos para que exijam dos poderes municipais melhores calçadas, há os que conscientizam as pessoas sobre a importância de caminhar, há os que formulam propostas de leis e projetos que possam ser abraçadas pelos governos. Estas organizações e coletivos se espalham pelo Brasil e já participam de eventos internacionais para troca de experiências.
Em São Paulo os pedestres estão cada vez mais organizados na luta por espaços seguros para caminhar e para que os que andam motorizados respeitem as leis. O projeto Como Anda relacionou até agora 78 movimentos pela mobilidade a pé em 16 estados do Brasil. Há desde os pequenos grupos que atuam em bairros até os que têm alcance internacional. Eles promovem iniciativas de mobilidade a pé e procuram soluções para fazer com que as cidades se tornem mais acessíveis ao pedestre. Segundo este projeto, os grupos de mobilidade atuam principalmente na informação, educação, mobilização e na intervenção física do espaço, realizando pesquisas.
[g1_quote author_name=”Movimento Cidade a pé” author_description_format=”%link%” align=”left” size=”s” style=”simple” template=”01″]A responsabilidade de fazer o motorista cumprir a lei não é do pedestre
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Veja o que já enviamosNo início de abril o grupo Cidadeapé lançou uma campanha contra o projeto de lei conhecido como Gesto do Pedestre que tramita no Senado. Se aprovado, o cidadão terá que fazer um gesto com os braços toda a vez que for atravessar uma rua. Os ativistas das caminhadas explicam que isso inutilizaria a faixa de pedestre, regulamentada há 15 anos e que mesmo assim é amplamente desrespeitada. A saída está em aumentar a fiscalização, as multas, e em investir nas campanhas de conscientização. “A responsabilidade de fazer o motorista cumprir a lei não é do pedestre”, diz o manifesto do Cidadeapé, lembrando que muitas pessoas caminham com pacotes e sacolas nas mãos. Há também os que levam crianças nos colos e os que têm deficiência física. Como ficariam esses pedestres?.
A criatividade é um ingrediente fundamental dos grupos de ativistas como os Desbravadores de Sampa e Corrida Amiga, que realizaram recentemente a campanha “Calçada Cilada”, um mapeamento das calçadas feito em um evento de caminhada por várias áreas da cidade de São Paulo. O objetivo foi denunciar as falhas. Com o lema “Pedestres de Sampa, uni-vos!”, o coletivo SampaPé criou um guia para ensinar como denunciar uma calçada perigosa.
Um em cada três deslocamentos feitos em grandes cidades como São Paulo, Belo Horizonte e Porto Alegre é feito a pé. E mesmo assim as cidades ainda são pensadas para as rodas. Entre 2001 e 2011 a população brasileira teve um aumento de 12%. No mesmo período o aumento do número de veículos motorizados foi de 138%.
Com esse cenário desfavorável ao pedestre, surgiu até mesmo uma espécie de super-herói dos caminhantes que ficou famoso por fazer intervenções no trânsito da cidade, ajudando pedestres a atravessarem, por exemplo. Ele se mantém no anonimato mas usa o apelido de Super-Ando e o lema “Cidade acessível, ninguém invisível”. Super-Ando já ficou famoso e chegou a ser convidado para o 3º Congresso Nacional de Pedestres do México, na primeira semana de maio. O incentivo às caminhadas urbanas é também uma ajuda à saúde dos cidadãos. Na capital paulistana, por exemplo, metade (49,7%) de seus habitantes tem excesso de peso, segundo estudo da Secretaria Municipal de Saúde. Essa porcentagem era de 38% em 2003.
Os vários grupos pró-pedestres de São Paulo noticiaram com festa a visita à cidade, no dia 2 de junho, de um dos maiores nomes mundiais em transportes e transformação urbana: a americana Janette Saddik Khan, para o lançamento de seu livro “Streetfight: Handbook for an Urban Revolution”. Ela é pioneira do movimento de luta por ruas mais seguras e foi secretária de Transportes de Nova Iorque entre 2007 e 2013, quando transformou ruas da metrópole para torná-las mais seguras para pedestres e ciclistas. Em seu livro, ela traça um roteiro para repensar as cidades, oferecendo métodos eficazes como a redistribuição do espaço já existente.
As cidades em expansão, principalmente em países emergentes, não têm dado prioridade aos espaços públicos. Segundo estudo da Organização das Nações Unidas (ONU) divulgado em maio, os espaços públicos ocupam apenas 21% do total das superfícies das cidades em expansão no mundo. Isso ocorre devido ao crescimento desordenado: somente 37% das áreas em desenvolvimento contaram com planos urbanísticos, de acordo com este levantamento. Os pedestres brasileiros têm um longo caminho pela frente.