ODS 1
Eduardo Paes: ‘O desafio é o saneamento’
Ao fim de oito anos de gestão, prefeito do Rio defende o seu legado ambiental e diz que concessão do esgoto é o caminho
Depois de oito anos, o prefeito Eduardo Paes (PMDB) se despede do governo municipal do Rio defendendo o seu legado na área de meio ambiente e sustentabilidade. Com uma gestão marcada pela expansão dos sistemas de corredores expressos de ônibus (BRTs) e pela implementação de espaços públicos como o Parque Madureira, Paes também enfrentou duras críticas de ambientalistas. Sobre a principal delas, a construção do polêmico Campo de Golfe Olímpico, na Barra, não hesita em defender o projeto: “Promovemos a requalificação ambiental da área, sem gastar um centavo sequer de recursos públicos”.
[g1_quote author_name=”Eduardo Paes” author_description=”Prefeito do Rio” author_description_format=”%link%” align=”left” size=”s” style=”simple” template=”01″]A ideia das UTRs seria complementar o sistema de saneamento, retendo apenas alguns resíduos sólidos lançados nos rios. Mas essas unidades sozinhas não têm condições de evitar, por exemplo, que o esgoto chegue às lagoas de Jacarepaguá ou à Baía de Guanabara
[/g1_quote]Nesta entrevista exclusiva ao #Colabora, o prefeito defende que os serviços de poda de árvores continuem com a Comlurb, “porque a empresa dispõe de equipamento e pessoal especializados”, admite falha no projeto da ciclovia da Avenida Niemeyer (que desabou em abril, matando duas pessoas) e reconhece que o principal desafio da capital é o investimento em saneamento básico: “O governo do estado avançou um pouco, com a Cedae, para melhorar a questão do saneamento, mas é preciso acelerar esse processo. Esse é um desafio prioritário para os próximos anos”. Para tanto, diz apoiar a ampliação da concessão do esgoto à iniciativa privada, como feito em parte da Zona Oeste, a partir de 2012: “A concessão do esgoto é o caminho. Mas é necessário um acordo com a Cedae”.
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Veja o que já enviamos#Colabora: Após oito anos de gestão, que balanço o senhor faz das ações de seu governo na área ambiental? O senhor foi presidente da C40 (grupo de 63 cidades que discute adaptação às mudanças climáticas), representando lá pela primeira vez uma metrópole emergente. Qual foi a marca de seu mandato na C-40?
Eduardo Paes: Nos últimos três anos, o C40 cresceu em tamanho, influência e perfil. Neste tempo, também dobrou de orçamento e integrou novas lideranças, de diferentes partes do mundo. O número de membros da rede do C40 cresceu de 63 para 90 municípios. Além disso, começou a se consolidar um novo modelo de governança, no qual as cidades têm um protagonismo cada vez maior. É nas cidades que vivem as pessoas, e as soluções locais são aquelas que têm efeito imediato no dia a dia. Durante a minha gestão, uma conquista importante foi a criação de um fundo de financiamento para ações climáticas, que facilita o acesso a recursos. A iniciativa, apoiada pelos governos alemão e americano e pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento, já está operando em Bogotá e na Cidade do México.
O senhor sempre diz que se orgulha muito de ter iniciado e expandido as linhas de BRT (bus rapid transit), o que contribuiu para tirar carros das ruas e, consequentemente, para menor emissão de poluentes. Por que não foi possível alimentar o sistema com energia elétrica? Não seria uma melhor opção do que o uso de combustível fóssil?
A implantação do BRT já representou um avanço. Além da redução do número de carros nas ruas, como você mencionou, os veículos usados nos corredores expressos são mais eficientes e utilizam uma quantidade maior de biodiesel do que os ônibus comuns – 10% nos BRTs contra 7% na frota regular. Isso representou uma redução na emissão de gases de efeito estufa. O Rio até recebeu o prêmio Sustainable Transport Award, do Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento, que analisou o BRT Transcarioca. O que foi feito não impede que, numa próxima etapa, seja implantado um sistema com energia elétrica.
A maior crítica que o senhor recebeu nesses oito anos de ambientalistas foi a autorização para a construção do campo de golfe olímpico, na Barra, na APA de Marapendi. Muitos o criticaram pelo fato de o processo de licenciamento ter dispensado Estudo de Impacto Ambiental (EIA-Rima), mesmo estando em uma Zona de Conservação da Vida Silvestre (ZCVS). Outra enorme polêmica diz respeito à titularidade do terreno: Fiori Empreendimentos, Elmway e até a União reivindicam a posse. Valeu a pena ter comprado essa briga?
A área onde hoje existe o Campo de Golfe estava, antes, totalmente degradada. Durante alguns anos funcionou ali um depósito de pré-moldados e deixou um rastro de abandono. Com a iniciativa de instalar ali o Campo, promovemos a requalificação ambiental da área, sem gastar um centavo sequer de recursos públicos. A própria Justiça fez uma perícia no local e atestou a recuperação da flora e da fauna. Tanto que, durante os Jogos Olímpicos, os jacarés e as capivaras foram uma atração para os atletas.
Há quatro anos, ao defender as mudanças urbanísticas que possibilitaram a construção do campo de golfe, o senhor disse que a APA perderia uma pequena parte de sua área, mas em compensação, o projeto “garantiria a preservação de um espaço bem maior”, voltado à Praia da Reserva. Até hoje, porém, o anunciado Parque Natural municipal Nelson Mandela, nessa porção de terra virada pela a Reserva, não saiu do papel. Por quê?
Foi importante garantir que aquela área se tornasse um parque natural, que preservará o ecossistema e será utilizado pela população. A área do parque já está delimitada, falta agora a instalação dos equipamentos de lazer.
[g1_quote author_name=”Eduardo Paes” author_description=”Prefeito do Rio” author_description_format=”%link%” align=”left” size=”s” style=”simple” template=”01″]Por meio do Programa Bairro Maravilha, as zonas Norte e Oeste receberam mais de R$ 1,3 bilhão de investimentos na melhoria da infraestrutura, com a instalação de novas redes de água, esgoto e drenagem em mais de 2.800 ruas
[/g1_quote]Quando o governo do estado anunciou o compromisso de despoluir 80% da Baía de Guanabara para os Jogos Olímpicos, o cálculo foi feito com base na construção e na operação de Unidades de Tratamento de Rios (UTRs). Duas dessas UTRs no Rio são mantidas pela prefeitura (Arroio Fundo e Rio Carioca). Nada foi feito e o senhor disse que as UTRs são perda de dinheiro. O que o fez mudar de opinião? Faz sentido manter Arroio Fundo e Carioca?
A ideia das UTRs seria complementar o sistema de saneamento, retendo apenas alguns resíduos sólidos lançados nos rios. Mas essas unidades sozinhas não têm condições de evitar, por exemplo, que o esgoto chegue às lagoas de Jacarepaguá ou à Baía de Guanabara. A manutenção das UTRs no Arroio Fundo e Rio Carioca são paliativos. O governo do estado avançou um pouco, com a Cedae, para melhorar a questão do saneamento, mas é preciso acelerar esse processo. Esse é um desafio prioritário para os próximos anos.
Como titular do esgotamento sanitário do Rio, o senhor não acha que deveria ter assumido o compromisso de ampliar as redes em diversos bairros? Madureira, terra da sua Portela, trata praticamente nada de seus esgotos. Não é uma vergonha?
Defendo a implantação do modelo adotado na AP-5 em outras regiões da cidade onde há carência no serviço de esgotamento sanitário. A concessão é o caminho, no meu entendimento. Mas para isso é necessário um acordo com a Cedae. De qualquer maneira, a prefeitura não ficou parada. Longe disso. Por meio do Programa Bairro Maravilha, as zonas Norte e Oeste receberam mais de R$ 1,3 bilhão de investimentos na melhoria da infraestrutura, com a instalação de novas redes de água, esgoto e drenagem em mais de 2.800 ruas.
Sobre o modelo de concessão da AP-5, o senhor disse que o repasse da responsabilidade de tratar esgoto para a iniciativa privada foi um sucesso. Mas no site da RioÁguas, que é a agência reguladora, não traz qualquer informação sobre o andamento das obras. Não falta transparência?
Vamos averiguar a situação e cobrar da empresa mais transparência.
Em sua gestão, a Fundação Parques e Jardins continuou esvaziada, sem protagonismo. Por que manter a poda de árvores da cidade com a Comlurb? Isso faz sentido?
A Fundação Parques e Jardins cumpre uma função importantíssima de cuidar das praças e parques da cidade. O trabalho de poda de árvores é feito pela Comlurb porque a empresa dispõe de equipamento e pessoal especializados.
Falando da Comlurb, não deu certo o convênio de R$ 50 milhões com o BNDES para a construção de seis galpões de triagem de materiais recicláveis. A coleta seletiva da Comlurb não deslancha, apesar do orçamento da empresa superar os R$ 2 bilhões/ano. O senhor já conseguiu descobrir onde está o gargalo?
Temos muito a caminhar, mas já houve avanços. A Comlurb começou a ampliar a coleta seletiva em 2013 e já atende 113 bairros da cidade, sendo 88 integralmente e 25 de forma parcial, recolhendo 2.500 toneladas (por mês). Foram construídas duas Centrais de Triagem, em Irajá e Bangu, que só não foram expandidas por conta da legislação de zoneamento urbano da cidade, que não permite a instalação de galpões para recebimento, triagem, armazenamento e comercialização de materiais recicláveis em determinados locais.
Em sua gestão, houve dois episódios de greves de garis da Comlurb (2014 e 2015), algo sem precedentes na história recente do Rio. Faltou diálogo com a categoria?
Sempre estivemos abertos ao diálogo. Nunca nos recusamos a conversar com ninguém, ainda mais com os garis, que são um símbolo da cidade e desempenham uma função tão importante. Mas naquelas ocasiões houve uma divisão entre dois grupos da categoria, o que provocou dificuldades nas negociações.
Parte do chorume gerado pela Central de Tratamento de Resíduos de Seropédica, inaugurada na sua gestão, é diluído no esgoto que chega à Estação de Tratamento de Alegria, no Caju. Evidentemente, essa não é a melhor opção. O aterro de Seropédica, após cinco anos, já não poderia estar tratando todo o chorume na própria planta?
A Comlurb acompanha de perto os estudos que a concessionária vem realizando o aumento da capacidade de tratamento de chorume para garantir o tratamento nos picos de geração, tendo uma folga operacional de segurança. Atualmente, a estação de tratamento de chorume instalada no CTR-Rio trata internamente quase a totalidade do chorume gerado no aterro sanitário, em torno de 850 a 900 m³/dia. Uma pequena quantidade ainda é transportada para a Estação Alegria, para ser tratado juntamente com o esgoto (e não diluído nele), uma prática mais usual nos países desenvolvidos. Esse volume vem do estoque acumulado nos tanques do CTR-Rio, do período em que a estação ainda estava em processo de maturação.
O projeto de expansão das ciclovias esbarrou no trágico acidente da Avenida Niemeyer, em abril, que terminou com duas mortes. O senhor assume que a prefeitura errou ao inaugurar a pista sem um plano de emergência em dias de ressaca?
Sim, inclusive admitimos esta falha e, desde então, a Prefeitura do Rio se comprometeu a fazer um plano de contingência para momentos de ressacas e ventos fortes. O procedimento já foi implementado e faz parte do dia a dia de operação da cidade.
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Jornalista formado em 2006 pela Universidade Federal Fluminense (UFF), trabalhou nos jornais O Fluminense, O Dia e O Globo, no qual ficou por oito anos cobrindo temas ligados ao meio ambiente. Editor de Conteúdo do Museu do Amanhã. Tem pós-graduação em Gestão Ambiental e cursa mestra em Engenharia Ambiental pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). Apaixonado pela profissão, acredita que sempre haverá gente interessada em ouvir boas histórias.