Diário da Covid-19: Brasil na emergência sanitária, social e climática

Ativistas protestam contra a Cúpula de Líderes Mundiais do G20, na Itália. Nos cartazes: “Crise climática e ecológica” e “Os governos falharam” (Foto: Alberto Pizzoli / AFP)

Números da pandemia seguem em ritmo de queda, mas destruição das florestas, emissões de carbono e desigualdade crescem como nunca

Por José Eustáquio Diniz Alves | ODS 10ODS 3 • Publicada em 31 de outubro de 2021 - 12:52 • Atualizada em 20 de novembro de 2021 - 12:27

Ativistas protestam contra a Cúpula de Líderes Mundiais do G20, na Itália. Nos cartazes: “Crise climática e ecológica” e “Os governos falharam” (Foto: Alberto Pizzoli / AFP)

O Brasil e o mundo estão passando por múltiplos desafios em diferentes áreas. A emergência sanitária veio se somar à emergência social e à emergência climática. O avanço da vacinação contra a covid-19 tem evitado a ocorrência de novos surtos pandêmicos, mas a cadeia de transmissão do novo coronavírus não foi interrompida, ao mesmo tempo em que a cadeia global de produção de bens e serviços ainda não foi totalmente reestabelecida. Enquanto os governantes discutem os problemas da economia e da pandemia, a pobreza, a fome e a emergência ambiental e climática assumem protagonismo na dinâmica internacional.

Os líderes dos maiores países do mundo se reuniram em Roma, no último fim de semana de outubro, para a 16ª Cúpula do G20, grupo que agrega África do Sul, Alemanha, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Brasil, Canadá, China, Coreia do Sul, Estados Unidos, França, Índia, Indonésia, Itália, Japão, México, Reino Unido, Rússia, Turquia e a União Europeia. Este conjunto de nações somam cerca de 60% da população mundial, 80% do PIB mundial e das emissões globais de gases de efeito estufa (GEE) e são responsáveis por 75% do comércio internacional.

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Na programação houve 3 painéis: “Economia e saúde global”, “Desenvolvimento sustentável” e “Mudanças climáticas e meio ambiente”. As discussões giraram em torno da contenção da pandemia, da recuperação da economia global e do enfrentamento do aquecimento global. Não marcaram presença os dirigentes máximos de China, Japão, Rússia e México. Ao final o G20 endossou imposto corporativo global, entrega de vacinas para países mais pobres e apoio a metas climáticas mais fortes.

Bolsonaro faz figuração no encontro do G20: não foi diplomático e nem construiu alianças para o futuro. Foto Filippo Monteforte/AFP
Bolsonaro faz figuração no encontro do G20: não foi diplomático e nem construiu alianças para o futuro (Foto: Filippo Monteforte / AFP)

Nem bem termina a Cúpula do G20 em Roma, em 31 de outubro, começa a Conferência das Partes (COP) da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC na sigla em inglês), tratado que foi assinado na Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, a chamada Cúpula da Terra, ocorrida no Rio de Janeiro, em 1992. A primeira COP ocorreu na cidade de Berlim em 1995. Na COP3, em 1997, na antiga capital do Japão, foi assinado o Tratado de Kyoto. Na COP21, em 2015, na capital da França, foi assinado o importante Acordo de Paris. A COP26 estava programada para ocorrer em 2020 na capital da Escócia, mas foi adiada para 2021 em função das restrições impostas pela pandemia.

A COP26, em Glasgow, é a Conferência mais significativa desde 2015, quando o Acordo de Paris definiu a necessidade de reduzir significativamente as emissões de GEE e foi estabelecida a meta prioritária de limitar o aquecimento global a no máximo 1,5º Celsius. Acontece que o mundo está indo na contramão do que foi acordado na COP21 em Paris, pois a concentração de CO2 na atmosfera continua aumentando e a crise climática tem gerado desastres ambientais cada vez mais letais e mais caros financeiramente.  Se nada for feito, urgentemente, a civilização humana terá um desafio existencial diante de um provável colapso ecológico, como veremos à frente.

De acordo com Jamil Chade, no artigo “Sem atenção de líderes, Bolsonaro fica deslocado no G20” (UOL, 31/10/2021), o presidente brasileiro não conseguiu ser diplomático e construir alianças globais no G20. Bolsonaro não foi recebido pelo Papa Francisco no Vaticano, não participou da atividade dominical que reuniu e fotografou a maioria dos líderes do G20 jogando moedas na icônica Fontana di Trevi, no centro de Roma, e não viajou para Glasgow para participar e contribuir com a busca de soluções para evitar um desastre climático global.

Brasil na pandemia: país teve em outubro as menores médias em um ano e meio

O Brasil registrou, em outubro de 2021, os menores números mensais de casos e de mortes da covid-19 desde abril de 2020. Portanto, o país deixou para trás a fase de subida das curvas epidemiológicas e se encontra em uma etapa avançada de descida das curvas.

A taxa de transmissão do coronavírus no Brasil está em 0,68, segundo o Imperial College de Londres (atualização de 25 de outubro de 2021). Isto quer dizer que cada 100 indivíduos infectados transmitem o vírus para outras 68 pessoas. Na atualização anterior, a taxa estava ligeiramente mais baixa, em 0,60, o menor valor desde o início da medição, em abril de 2020. A taxa de transmissão abaixo de 1 é uma boa notícia.

Segundo o Ministério da Saúde, no dia 30 de outubro, o Brasil com 2,7% da população mundial atingiu 21,8 milhões de pessoas infectadas (9% do total populacional global) e 607,7 mil mortes pela covid-19 (12% do total mundial), com uma taxa de letalidade de 2,8%. Considerando apenas os 303 dias de 2021 (de 01/01 a 30/10/2021) o Brasil registrou 412,9 mil mortes da covid-19 o que significa 1,36 mil vidas perdidas por dia, ou quase 1 óbito por minuto. O ano de 2021 já superou o número de mortes de 2020 e terá o maior registro de óbitos da história brasileira.

O gráfico abaixo mostra a média mensal de casos da covid-19 de março de 2020 a outubro de 2021. O pico da 1ª onda aconteceu em julho de 2020 com 40,7 mil pessoas infectadas. O pico da 2ª onda ocorreu em março de 2021 com 70,9 mil casos diários. Entre abril e junho os números ficaram acima de 60 mil indivíduos infectados. Mas desde então, o número de infectados caiu para 12,4 mil casos diários, o menor valor desde abril de 2020.

O gráfico abaixo mostra a média mensal de vidas perdidas para a covid-19 de março de 2020 a outubro de 2021. O pico da 1ª onda aconteceu em julho de 2020 com 1.061 óbitos diários. O pico da 2ª onda ocorreu em abril de 2021 com 2.742 óbitos diários. A partir daí, o número diário de mortes diminuiu para 1.904 óbitos em maio, 776 óbitos em agosto e 359 óbitos em outubro, o menor nível de toda a série desde abril de 2020.

O Brasil já atingiu 75% da população vacinada com a primeira dose e 56% com a vacinação completa no final de outubro de 2021. Por conseguinte, tem diminuído o número de internações e óbitos da covid-19 em todo o território nacional. Por exemplo, o estado do Rio de Janeiro, que tem o maior coeficiente de mortalidade do país, com 3.958 óbitos por milhão de habitantes, tem apresentado redução significativa do número de vítimas fatais. De acordo com a Secretaria de Estado de Saúde, essa é a primeira vez, desde o início da edição do mapa de risco, que todas as regiões do Rio de Janeiro foram classificadas na bandeira amarela (risco baixo para a doença).

O quadro geral da pandemia no Brasil em outubro de 2021 é positivo. Mas o perigo para o final do ano é as autoridades públicas de saúde e a população em geral subestimarem a doença. A flexibilização do uso de máscaras e o fim das medidas de distanciamento social devem ser acompanhadas com bastante atenção para que o país não seja surpreendido por novas cepas do coronavírus e novas mutações, como é o caso da subvariante Delta Plus que tem assustado o Reino Unido.

Brasil tem recuperação do PIB em 2021, mas sem recuperação da renda e do emprego

O Brasil apresentou um dos maiores crescimentos demoeconômicos nas primeiras oito décadas do século 20. O país era reconhecido como uma nação emergente, pois crescia acima da média mundial. Contudo, a partir de 1981, o Brasil apresentou um crescimento menor do que a média mundial passando a ser caracterizado como uma nação submergente, como mostrado no artigo “Diário da Covid-19: Milhares de vidas poderiam ter sido salvas, aponta a CPI”, aqui no #Colabora (ALVES, 27/10/2021).

Mas o que estava ruim piorou na década passada, quando o Brasil apresentou o menor crescimento econômico médio do período republicano. Portanto, o impacto recessivo da pandemia da covid-19 em 2020 apenas agravou uma situação que já era grave. A estimativa do FMI é que o Brasil apresente um crescimento do PIB por volta de 5% em 2021, voltando ao patamar de 2019, que é semelhante ao valor contabilizado em 2012. Este baixo desempenho da economia fez a renda per capita brasileira retroceder aos níveis de 2009, algo em torno de $ 14,6 mil (dólar internacional em poder de paridade de compra – ppp).  A renda per capita em 2021 está bem abaixo dos quase $ 16 mil contabilizados em 2013, quando ocorreu o maior valor da série. Ou seja, a população brasileira empobreceu nos últimos oito anos.

O grande hiato da recuperação econômica de 2021 ocorre na falta de dinamismo do mercado de trabalho. A tabela abaixo, com base nos dados da Pnad Contínua do IBGE, mostra que a população brasileira passou de 209,5 milhões de habitantes no trimestre jun-jul-ago de 2019 para 212,7 milhões no trimestre correspondente de 2021, enquanto a população em idade ativa (PIA) passou de 171,1 milhões para 177,2 milhões no mesmo período. Mas a população ocupada (PO) ficou em 90,2 milhões de pessoas em jun-jul-ago de 2021, acima das 81,7 milhões de 2020, porém abaixo das 93,6 milhões de pessoas ocupadas em 2019. O número de desocupados ficou em torno de 13,7 milhões em 2021 e 2020, acima dos 12,6 milhões de 2019. A população subutilizada que estava abaixo de 30 milhões antes da pandemia, saltou para mais de 30 milhões em 2020 e 2021.

Por conseguinte, o Brasil tem um número muito elevado de pessoas não ocupadas: 116 milhões em 2019, cerca de 131 milhões em 2020 e 122,5 milhões em 2021. No trimestre jun-jul-ago de 2021 o Brasil tinha apenas 42,4% da população inserida em atividades produtivas. A China, por exemplo, no auge do bônus demográfico do país chegou a ter 60% da sua população ocupada. A baixa taxa de ocupação é um grande problema econômico e social. O trabalho é não somente um direito básico de cidadania – definido na Declaração Universal dos Direitos Humanos (de 1948) e na Constituição Federal (de 1988) – mas também a fonte da riqueza das nações, conforme já explicou Adam Smith, em 1776. As mais de 13 milhões de pessoas brasileiras desocupadas e as mais de 30 milhões desocupadas ou subutilizadas representam um grande desperdício do potencial produtivo do Brasil.

Além da baixa taxa de ocupação, a Pnad Contínua do IBGE, divulgada em 27 de outubro, mostrou que parte significativa do aumento da ocupação deveu-se ao avanço dos empregos informais. A taxa de informalidade foi de 41,1% da população ocupada, ou 37,1 milhões de trabalhadores informais. Número superior aos dos trimestres correspondentes nos dois últimos anos. Outro indicador preocupante foi a queda do rendimento real habitual (R$ 2.489) que caiu em relação ao valor de R$ 2.771 de jun-jul-ago de 2020. O aumento da inflação atinge principalmente os trabalhadores informais que possuem maior dificuldade para fazer frente à perda do poder aquisitivo.

Evidentemente, o Brasil precisa aumentar as taxas de investimento para enfrentar os gargalos da infraestrutura do país, para avançar com a saúde, a educação e a moradia, além de elevar o emprego e a produtividade dos fatores de produção a fim de garantir o bem-estar da população. Mas o que o Executivo e o Legislativo estão preparando é a chamada “PEC Fura-Teto”, que adia o pagamento dos precatórios para retirar os limites ao gasto público, não para viabilizar o aumento do emprego e da formalidade, mas sim para injetar recursos financeiros para as emendas parlamentares em ano eleitoral e para a ampliação do programa de transferência de renda para R$ 400 mensais.

O Auxílio Brasil composto por um componente  permanente e outro provisório – válido somente até pouco depois das eleições de 2022 – tem um caráter indiscutivelmente eleitoreiro e será incapaz de resolver estruturalmente os problemas da pobreza, da fome e da inflação. Programas de transferência de renda para os pobres são importantes para reduzir a miséria, mas não resolvem definitivamente os problemas sociais do país. Como disse o grande compositor Luiz Gonzaga (1912-1989): “Uma esmola, para o homem que é são, ou lhe mata de vergonha ou vicia o cidadão”. Assim, o Brasil precisa evitar políticas casuísticas e ter uma política macroeconômica fundamentada e com prioridade no objetivo do “Pleno emprego e trabalho decente”.

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30 anos de blá-blá-blá dos líderes mundiais e sua traição com as gerações atuais e futuras

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A COP26 e a emergência climática

Ao contrário da pandemia da covid-19 que é uma emergência sanitária localizada no tempo e, tudo indica, de curta duração, a emergência climática é um evento de longa duração e que deve se agravar com o passar dos anos e das décadas, afetando principalmente as crianças e jovens atuais e as gerações que ainda vão nascer.

A concentração de CO2 na atmosfera estava abaixo de 280 partes por milhão (ppm) durante todo o período do Holoceno (últimos 12 mil anos). Mas após a decolagem do crescimento demoeconômico global propiciado pela Revolução Industrial e Energética – que iniciou a queima de combustíveis fósseis e a destruição em larga escala das florestas – dispararam as emissões e a concentração de CO2 na atmosfera.

Em 1960, a população mundial era de 3 bilhões de habitantes, passando para 7,8 bilhões em 2019. O crescimento demográfico foi de 2,6 vezes, mas o crescimento econômico foi muito maior e aumentou 9 vezes no período. Em decorrência do aumento do volume de produção e consumo, a Pegada Ecológica ultrapassou a Biocapacidade do Planeta e a humanidade superou a capacidade de carga da Terra.

Acompanhando o maior volume demoeconômico, as emissões globais de CO2 que estavam por volta de 9 bilhões de toneladas em 1960, saltaram para 25 bilhões de toneladas no ano 2000, passaram para 35 bilhões de toneladas em 2015 e atingiram 36,4 bilhões de toneladas em 2019. Com a pandemia, a emissões caíram para pouco mais de 34 bilhões de toneladas em 2020, mas praticamente voltaram para o patamar anterior em 2021. A concentração de CO2 estava em 317 partes por milhão (ppm) em maio de 1960, saltou para 404 ppm em maio de 2015, 417 ppm em maio de 2020 e, mesmo com a recessão pandêmica, atingiu 419 ppm em maio de 2021, conforme mostra a curva de Keeling do gráfico abaixo.

Portanto, as emissões de gases de efeito estufa (GEE) e a concentração de CO2 na atmosfera não pararam de crescer, mesmo com todos os eventos ambientais promovidos pela governança global no período. Por exemplo, em 1972 houve a Conferência do Meio Ambiente de Estocolmo, em 1992 aconteceu a Conferência do Rio, em 1997 foi assinado o Protocolo de Kyoto e em 2015 aconteceu o Acordo de Paris. Assim mesmo a curva de Keeling não parou de crescer e a concentração de CO2 atingiu um nível equivalente ao que havia de 3 a 5 milhões de anos atrás, quando a temperatura média era de 2 a 3ºC mais alta e o nível do mar estava de 6 a 10 metros mais alto.

Assim, indubitavelmente, o aquecimento global é o resultado das crescentes emissões de GEE e do aumento da concentração de CO2 na atmosfera. Os dados da Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos (NOAA), apresentados no gráfico abaixo, não deixam dúvidas que não somente há uma elevação da temperatura da Terra, como este aumento está se acelerando. A partir da década de 1970 os aumentos foram ficando mais significativos. Na década 1980-90 o aumento foi de 0,13ºC na década e no decênio passado (2011-20) o aumento foi de 0,44ºC na década. Segundo o famoso climatologista americano, James Hansen, a temperatura global atual está cerca de 1,2ºC maior do que o período base 1880-1920 (que é considerado a melhor estimativa da temperatura pré-industrial).

Portanto, o mundo já está muito próximo de ultrapassar a meta prioritária do Acordo de Paris, pois a Organização Meteorológica Mundial (OMM) estima que o Planeta tem grande chance de atingir 1,5ºC em pelo menos um ano até o meio da atual década. Desta forma, a emergência climática tem provocado o aumento dos desastres gerados pelo desequilíbrio ecológico. O relatório “The human cost of disasters: an overview of the last 20 years (2000-2019)”, da UNDRR (United Nations Office for Disaster Risk Reduction), confirma que os eventos climáticos extremos passaram a dominar a paisagem de desastres no século 21.

No período de 2000 a 2019, ocorreram 7.348 grandes desastres ambientais, ceifando 1,23 milhão de vidas, afetando 4,2 bilhões de pessoas (muitos em mais de uma ocasião), resultando em aproximadamente US$ 2,97 trilhões em perdas econômicas globais. Este é um aumento acentuado em relação aos vinte anos anteriores, já que entre 1980 e 1999 ocorreram 4.212 desastres naturais em todo o mundo, ceifando aproximadamente 1,19 milhão de vidas e afetando 3,25 bilhões de pessoas, com aproximadamente US$ 1,63 trilhão em perdas econômicas. Grande parte da diferença nos dois períodos é explicada por um aumento nos desastres relacionados ao clima, incluindo eventos climáticos extremos: de 3.656 eventos relacionados às mudanças climáticas (1980-1999) para 6.681 desastres relacionados ao clima no período de 2000-2019.

Todos estes dados mostram que o conjunto dos países da comunidade internacional, reunidos na COP26 em Glasgow, precisam reduzir as emissões de GEE pela metade até 2030 e atingir a meta global de “zero líquido” até 2050. Desta maneira, uma das principais tarefas da COP26 é aumentar o compromisso de redução das emissões, já que Contribuições Determinadas Nacionalmente (NDCs) estabelecidas em 2015, em Paris, eram muito fracas para limitar o aquecimento global a 1,5ºC. Para tanto, os países ricos precisam apresentar metas mais ambiciosas de corte nas emissões de GEE e garantir um fundo de US$ 100 bilhões para ajudar no financiamento climático dos países pobres na transição para a energia limpa e na mitigação e adaptação às mudanças climáticas.

Contudo, o Relatório “2021 Production Gap Report”, elaborado por importantes institutos de pesquisa e pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e divulgado em 20 de outubro passado, conclui que, apesar do aumento das ambições climáticas e dos compromissos líquidos de zero carbono, os governos ainda planejam produzir mais do que o dobro da quantidade de combustíveis fósseis em 2030 do que o que seria consistente com a limitação do aquecimento global a 1,5ºC. Além disto, documentos vazados e obtidos pela BBC mostram que inúmeras ações das diplomacias estrangeiras fazem “lobbies” sobre as autoridades climáticas internacionais e das Nações Unidas para limitar ou retardar a revolução verde, especialmente no que diz respeito ao uso de combustíveis fósseis.

Lastimavelmente, a COP26 pode repetir outros eventos anteriores pronunciando palavras que soam bem à opinião pública global, mas que não se traduzem em ações concretas. Como criticou a jovem ativista sueca, Greta Thunberg, são: “30 anos de blá-blá-blá dos líderes mundiais e sua traição com as gerações atuais e futuras”.

O Brasil tem sido um exemplo de desrespeito do espírito do Acordo de Paris. Em 2020, o país ficou na contramão global, pois enquanto o mundo reduziu as emissões globais em 7% durante a pandemia, as emissões brasileiras aumentaram 9,5% no ano, em função do desmatamento e das queimadas, especialmente na Amazônia, no Cerrado e no Pantanal. Em consequência, o Brasil foi um dos países mais impactados pelas emergências sanitária, social e ambiental.

O saldo brasileiro é bastante negativo. O maior país da América do Sul teve um dos maiores coeficientes de mortalidade da covid-19 do ranking mundial, ficou mais pobre economicamente, mais desigual, com maior quantidade de pessoas desempregadas ou subempregadas, ameaçado pela estagflação, com menor área de cobertura florestal e com maior emissão de gases de efeito estufa. Definitivamente, o caminho trilhado pelo Brasil não é sustentável nem na área social e muito menos na área ambiental.

Frase do dia 31 de outubro de 2021

“Quando os atos violam a natureza, eles produzem desordens também contra a natureza”

William Shakespeare (1564-1616), Macbeth

Referências

ALVES, JED. Diário da Covid-19: Milhares de vidas poderiam ter sido salvas, aponta a CPI, #Colabora, 27/10/2021

Jamil Chade. Sem atenção de líderes, Bolsonaro fica deslocado no G20, UOL, 31/10/2021

UNDRR. The human cost of disasters: an overview of the last 20 years (2000-2019), United Nations Office for Disaster Risk Reduction, 13/10/2020

UNEP. 2021 Production Gap Report, 20/10/2021

José Eustáquio Diniz Alves

José Eustáquio Diniz Alves é sociólogo, mestre em economia, doutor em Demografia pelo Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar/UFMG), pesquisador aposentado do IBGE, colaborador do Projeto #Colabora e autor do livro "ALVES, JED. Demografia e Economia nos 200 anos da Independência do Brasil e cenários para o século" (com a colaboração de F. Galiza), editado pela Escola de Negócios e Seguro, Rio de Janeiro, 2022.

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