Receita de goma: junte dezenas de jovens criativos, inquietos, empreendedores, antenados com as novas economias e preocupados com o futuro do planeta. Misture tudo em um mesmo ambiente e… nem precisa esperar para saber se vai dar liga. Já deu. Tudo começou quando a MateriaBrasil ocupou um velho sobrado do Centro do Rio e começaram a chegar estudantes da PUC-RJ, com as empresas que haviam criado na universidade, para dividir o espaço, trocar informações e experiências. O prédio acabou ficando pequeno para tanta gente. “Não tinha espaço para todo mundo, trabalhávamos superapinhados”, conta a desenhista industrial Manuela Yamaa, sócia da Materiabrasil.
[g1_quote author_name=”Manuela Yamada” author_description=”Desenhista industrial, sócia da MateriaBrasil” author_description_format=”%link%” align=”left” size=”s” style=”simple” template=”01″]Fizemos um financiamento coletivo interno. Levantamos R$ 200 mil de empréstimo com amigos, familiares. Era uma loucura, chovia dentro… Ocupamos o prédio na guerrilha, e fomos reformando aos poucos
[/g1_quote]Abandonados há anos, dois prédios vizinhos foram postos para alugar. Era a chance de sair do aperto e realizar o projeto de juntar uma galera maior, para empreender junta. Um sonho que a turma da Materiabrasil compartilhava com outras empresas, como Hub Rio (atual Carioteca), Zerezes, Terravixta, Zebu… “Vimos isso meio como um sinal divino”, brinca Manu. “Abrimos uma chamada para quem quisesse vir empreender com a gente”. Chegaram 65 pessoas, dividas em 22 empresas. O ano era 2012. Nascia a Somos Goma, apresentada como uma “associação interdisciplinar de empreendedorismo em rede, com foco em inovação social, economia criativa e design sustentável”.
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Veja o que já enviamosMas os prédios estavam completamente detonados, não tinham teto, não tinham nada… Cadê o dinheiro para a reforma? “Fizemos um financiamento coletivo interno. Levantamos R$ 200 mil de empréstimo com amigos, familiares. Era uma loucura, chovia dentro… Ocupamos na guerrilha, e fomos reformando aos poucos, numa MVP mesmo, Mínimo Produto Viável”, conta Manuela.
Hoje, são 95 pessoas divididas em 35 empresas, ocupando três prédios geminados. Mas ninguém ali conjuga os verbos trabalhar, criar, empreender e lucrar no singular. Estão todos no mesmo barco. Ou melhor, na mesma Goma, juntos e misturados. Quando uma empresa prospecta um trabalho – ou um novo cliente – envolve outras da associação no projeto.
“As empresas trabalham juntas. Quando vou prospectar um cliente não vou como Manuela Yamada, desenhista industrial, consultora em responsabilidade socioambiental, sistemas de fabricação e economia circular. Vou como Manuela Yamada, uma das associadas da Goma. Tenho embutidos na MateriaBrasil os outros serviços prestados por empresas que estão aqui: de mídias digitais, comunicação, produção, sistema jurídico… Prospecto, na verdade, para todas as empresas da casa. Então, conseguimos atender ao cliente de forma completa, porque os profissionais que estão aqui são de áreas muito complementares”, diz.
Os amigos Pedro Ivo Chagas Costa, Amon Costa Cerqueira Pinto e Rafael d’Ávila, da Zebu, empresa de design com foco em sustentabilidade, que nasceu quando ainda estudavam na PUC, são associados de primeira hora. Participaram até da escolha do nome e da concepção do logo. Junto com a Materiabrasil e a Terravixta (marca de souvenires do Rio de Janeiro) , a Zebu participou do primeiro trabalho colaborativo de grande porte da Goma. As três empresas se uniram para desenvolver os brindes oficiais da Fifa para a Copa do Mundo 2014. “A partir daí, vieram muitos outros trabalhos colaborativos com empresas da Goma”, conta Pedro. “Trabalhamos, por exemplo, com o Estúdio Guanabara (escritório de arquitetura) e a MateriaBrasil no desenvolvimento de móveis para a ong Onda Verde. Foi a Rastro (agência de comunicação associada), que desenvolveu nosso site”, conta. Em 2016, a Zebu e o Estúdio Guanabara se uniram novamente para desenvolver trabalhos para a Redbull nas Olimpíadas.
Com esse sistema de trabalho em rede, não ganham só os associados. “Para o cliente é vantajoso porque ele tem um ponto focal e várias empresas, com habilidades diferentes, mas que já trabalham entre si. Então, o trabalho corre muito mais fácil e o custo de gestão é muito menor”, diz Manuela.
Enquanto bota em prática os ideais de um mundo mais colaborativo e solidário, essa turma cresce, aparece e ganha o mundo com as ideias gestadas nas mesas coletivas que ocupam os salões sem paredes da Goma. Os sócios da Zebu criaram a Mancha, que desenvolve tintas orgânicas com pigmentos naturais, a partir de café, cacau, beterraba, urucum, couve, entre outros.
Foi na Goma também que nasceu o ColaborAmerica. Manuela Yamada e Tomás Lara, colíder do Sistema B no Brasil e também um dos fundadores da associação, são representantes no Brasil do Oui Share – que organiza um festival, anualmente, em Paris e em Barcelona, voltado para a economia colaborativa. Inspirados no evento francês, Manuela e Tomás resolveram fazer, no Rio, uma versão latino-americana. Foi um sucesso. O festival – com três dias de debates, em novembro de 2016 – reuniu uma inovadores sociais e digitais de várias partes do país e do mundo. Praticamente todas as empresas da Goma participaram da organização. A turma, agora, se prepara para a segunda edição, em novembro.
Favor não confundir a Goma com um coworking. “Ninguém é proprietário do lugar”, Manu explica a diferença. Todos os associados participam da gestão. Para fazer o ecossistema Goma funcionar, a turma se divide em quatro grupos de trabalho: financeiro, de comunicação, jurídico e de infraestrutura/manutenção. O custo fixo para manter o espaço é dividido entre eles. “Todo mundo faz uma doação mensal. O excedente é guardado em um fundo da casa e, de tempos em tempos, a gente decide como quer aplicar esse dinheiro. Normalmente, usamos para reformas e melhorias no espaço”, conta Manuela. E todos têm direito a voto.
Manu faz a analogia da Goma com um coral, formado por organismos (pólipos) individuais, que “trabalham juntos” para sobreviver. “O ecossistema só estará bem por inteiro se todos os organismos independentes – que são as empresas – estiveram bem”.