No momento em que representantes de 196 países discutem em Paris o que fazer para reduzir o aquecimento global, um estudo divulgado esta semana mostra que as emissões globais de gases de efeito estufa podem diminuir em 2015. Nem mesmo o mais ranzinza dos analistas pode achar que esta é uma notícia ruim. Não é. No entanto, ainda é muito cedo para abrir o champanhe. Estamos falando de índices pequenos, imprecisos e que estão longe de representar uma tendência.
Entre 2004 e 2013, as emissões de CO² equivalente no mundo subiram, em média, 2,4%. No ano passado, os dados já tinham sido animadores, pois mostravam um crescimento nas emissões de apenas 0,6%. Agora em 2015, de acordo com a pesquisa publicada na revista Nature Climate Change, feita por cientistas dos Estados Unidos, da Austrália, do Reino Unido e da Noruega, elas devem cair 0,6%. Na verdade, o prognóstico dos pesquisadores indica que as emissões podem ficar entre 1,6% menor e 0,5% maior. Mas a melhor aposta é de que caia 0,6%.
[g1_quote author_description_format=”%link%” align=”left” size=”s” style=”simple” template=”01″]Se os países cumprirem as promessas que levaram até a COP21, em 2030 já teremos gasto 74% do nosso orçamento de carbono
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Veja o que já enviamosA outra ressalva é que o estudo se concentra na queima de combustíveis fósseis e nas emissões das indústrias. Deixando de fora o que é emitido pelo desmatamento, pela agricultura e pelo setor de resíduos, por exemplo. Em números, estamos dizendo que elas cairiam de 35,9 bilhões de toneladas de CO², em 2014, para 35,7 bilhões de toneladas, em 2015. E qual é a razão dessa queda? Em primeiro lugar, a China, que reduziu o seu consumo de carvão. E depois, a queda na procura por petróleo e gás natural, que cresceu menos do que em anos anteriores. Além disso, as fontes de energia renovável seguem avançando em todo o mundo.
Mas a melhor notícia desse relatório é que tudo isso está acontecendo num momento em que o PIB mundial cresce, em média, 3,2%. Não é a primeira vez que as emissões de gases de efeito estufa ficam estáveis. Isso já havia acontecido em 1990, época de recessão no Leste Europeu, e em 2008, durante a crise financeira mundial. Mas é a primeira que ocorre com a economia crescendo. Mesmo assim, o artigo dos cientistas é cauteloso e diz que “só o tempo dirá se esta surpreendente interrupção no crescimento das emissões é transitória ou um primeiro passo em direção à estabilização”.
Uma das razões dessa prudência científica é a Índia, com a sua população de mais de um bilhão de pessoas e majoritariamente pobre. No ano passado, o país foi o quarto maior emissor do mundo, atrás apenas da China, dos EUA e da União Europeia. Porém, enquanto as emissões destes três tende a cair, a da Índia está em franco crescimento. Segundo o relatório, em 2015, a Índia elevou as suas emissões em 205 milhões de toneladas. Já a União Europeia, no mesmo período, reduziu as suas em 210 milhões.
Mas antes de dividir o mundo, mais uma vez, entre bons e maus, é importante saber que, ao longo deste ano, a China emitirá 9,7 bilhões de toneladas, os EUA, 6,1 bilhões, a União Europeia, 4,2 bilhões e a Índia, 2,6 bilhões. E quando se fala em emissão per capita, a da Índia equivale a 10% da americana. Ou seja, é tudo uma questão de perspectiva. E por falar em perspectiva, mesmo que se confirme essa parada no crescimento das emissões, estamos muito longe da meta segura de restringir o aquecimento global a 2ºC. Até porque, reduzir emissões não é igual a parar de emitir.
De acordo com o IPCC (Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas), para ficar nos 2°C, a humanidade precisa cumprir o orçamento e limitar as suas emissões de CO² em 1 trilhão de toneladas. Funciona como uma conta corrente. Cada tonelada emitida por chineses, indianos, americanos ou brasileiros é debitada desta conta. Se os países cumprirem as promessas que levaram até a COP21, em 2030 já teremos gasto 74% do nosso orçamento de carbono. Vão sobrar 260 bilhões de toneladas para queimar. Logo, por voltar de 2035 a raça humana estará entrando no cheque especial climático.