Laila Zaid: as crianças têm um poder de transformação gigante

Na semana do Dia Nacional do Livro Infantil, atriz comenta sobre o “Manual Para Super-Heróis” e a importância da educação socioambiental para crianças

Por Micael Olegário | ODS 13 • Publicada em 16 de abril de 2025 - 08:55 • Atualizada em 18 de abril de 2025 - 09:54

Laila Zaid em palestra: humor, sarcasmo e informação para conscientizar pessoas sobre a crise climática (Foto: Divulgação)

A capacidade infantil de imaginação e ação no mundo nunca deve ser subestimada. Em meio a um contexto de crise ecológica e climática que ameaça o presente e futuro, as crianças podem ser protagonistas na construção de outros modos de habitar o planeta. Essa é uma das mensagens do livro-infantil “Manuel Para Super-Heróis: o Início da Revolução Sustentável”, escrito pela atriz e ativista ambiental Laila Zaid.

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Lançada durante a pandemia de Covid-19, a obra nasceu a partir de aulas de teatro realizadas por Laila em escolas. Inicialmente, a intenção era produzir uma apostila para utilizar nessas oficinas, buscando ampliar o conhecimento dos jovens sobre questões sociais, emocionais e ambientais. 

Estamos vivendo desafios que só vão piorar, e as crianças têm que ter ferramentas diferentes para lidar com isso

Laila Zaid
Atriz e comunicadora socioambiental

“Quando eu sentei pra começar a criar, eu tava num momento inspirada e me surgiu o “Manual para Super-Heróis” que é esse manual de sustentabilidade para criança, onde você empodera ela para assumir as rédeas de alguns comportamentos dentro de casa, na escola e comunidade”, descreve Laila. Com um formato interativo e lúdico, o livro-infantil desafia as crianças a realizar doze missões, relacionadas à ações e dicas para evitar desperdícios, reduzir o consumo e incentivar o envolvimento com a natureza.

Segundo a atriz, foi após o lançamento do livro que percebeu o potencial das redes sociais para comunicar dicas sobre sustentabilidade e, mais importante, denunciar as causas da crise climática. “Percebi que o buraco é muito mais embaixo do que você substituir a sua escova de dente de plástico por uma de bambu. Cheguei nos reais problemas, como o desmatamento, a agropecuária e os combustíveis fósseis”.

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Ativismo socioambiental e climático

Foi nessa época em que Laila Zaid se envolveu com a campanha “Pare o Tsunami de Plástico”, iniciativa ligada ao Projeto de Lei 2524/2022 para implementar a Economia Circular do Plástico no Brasil. Com humor, sarcasmo e informação, a atriz produz diversos vídeos que apontam os desafios socioambientais e as desigualdades sociais que envolvem as discussões sobre clima e meio ambiente.

Em entrevista ao #Colabora, Laila conta detalhes sobre a sua ligação com a pauta socioambiental, as inspirações para a produção do “Manual para Super-Heróis” e a importância da educação socioambiental e climática, principalmente com crianças e jovens.

#Colabora – Como nasceu seu interesse pelas questões socioambientais?

Laila Zaid – Apesar de ter estudado publicidade, eu venho das artes cênicas. A minha conexão com a pauta socioambiental se deu pela minha conexão com a natureza. Sou uma pessoa que fui criada muito próxima da natureza, meu pai era um surfista e a nossa família tinha essa conexão. Então, sempre fui considerada uma ecochata, por realmente estar ligada nas questões ecológicas. Lembro quando teve a Eco 92 aqui no Rio, eu era uma criança, mas aquilo me impactou, ali eu conheci o Greenpeace e comecei a entender que existia ativismo.

Com as artes eu consegui me fazer ser conhecida. Foi um efeito colateral do meu trabalho como atriz, ter uma audiência. Qando as mídias sociais chegam na minha vida, o trabalho como atriz já me coloca num lugar de alcance um pouco maior. Apesar de não usar a mídia social por muito tempo, porque eu não sabia, não era uma ferramenta que me interessava. Não via minha arte funcionando e eu era uma ativista nas horas vagas. Não tinha feito disso um propósito de vida.

#Colabora – E como surgiu a ideia de escrever o “Manual para Super-Heróis”?

Laila Zaid – Eu tinha um trabalho paralelo ao de atriz: dava aula num colégio municipal perto da minha casa. Era uma aula que eu usava as ferramentas de teatro para falar sobre questões sociais, emocionais e ambientais. E fui vendo que os meus alunos tinham um conhecimento muito limitado de sustentabilidade e de crise climática. E eu fiquei com vontade de fazer uma apostila para os meus alunos.

Quando eu sentei pra começar a criar, estava em um momento inspirado e surgiu o “Manual para Super-Heróis” que é esse manual de sustentabilidade para criança, onde você empodera a criança para assumir as rédeas de alguns comportamentos dentro de casa, na escola e comunidade. Para que o impacto delas no planeta seja mitigado. 

É um livro interativo. A criança realmente pode se relacionar com aquele livro de maneiras muito diferentes. São 12 missões da jornada do herói. Era uma apostila e se tornou um livro. Eu apresentei pra uma agente literária que falou: ‘olha, você tem uma obra na mão, que tem valor’. E, a gente levou para a editora e se tornou um livro. 

O livro é para as crianças, porque acredito que é muito mais fácil você instaurar novos hábitos numa criança do que pedir para um adulto mudar hábitos antigos

Laila Zaid
Atriz e comunicadora socioambiental

Quando o livro foi sair, dois anos depois, por acaso era pandemia. Nesse período fui morar no meio do mato, com uma comunidade de amigos, Meus filhos estavam vivendo numa escola florestal e eu precisava divulgar esse livro, Pensei: ‘vou usar minhas mídias sociais’. Comecei a não só divulgar o livro, mas a mostrar o meu dia a dia e as possibilidades de comportamento e de uma rotina mais sustentável. Para minha surpresa, a galera engajou, ficou curiosa e despertou interesse.

Vi que aquilo era um caminho e, o que eu postava ali, poderia acabar influenciando outras pessoas. Era pandemia, eu já não estava no meio do mato, não estava envolvida com nenhum projeto artístico, comecei a me engajar nesse ativismo. É uma jornada, porque comecei com meu conhecimento limitado, portanto, a minha comunicação era bastante restrita à sustentabilidade no dia a dia: como substituir coisas que são de plástico por alternativas mais sustentáveis, como compostar lixo, plantar, regenerar agrofloresta. Falava de educação, porque meus filhos estavam tendo uma chuva de educação florestal na prática. 

Eu fazia vídeos com o meu humor e uma linguagem mais divertida. Aos poucos, eu fui conhecendo melhor o campo socioambiental, o próprio campo socioambiental foi me conhecendo também. Eu ganhei muito saber e eu compartilhava a minha capacidade de comunicação. Fui expandindo o meu conhecimento e percebi que o buraco é muito mais embaixo do que você substituir a sua escova de dente de plástico por uma de bambu. Cheguei nos reais problemas, como o desmatamento, a agropecuária e os combustíveis fósseis Fiz formações e mergulhei de cabeça. Pensei: ‘se estou influenciando e ocupando esse espaço de referência, tenho que estar nutrida de algum conhecimento’.

Foto colorida de Laila Zaid. Ela é uma mulher branca com cabelos ruivos. Ela sorri e olha para a foto. Ela veste uma camiseta preta com a frase "Cultura é a resposta". Ao fundo, arbustos e plantas verdes
Laila Zaid: atriz passou a se envolver com temática socioambiental após lançamento do livro na pandemia (Foto: Divulgação)

#Colabora – Pode contar sobre o processo de elaboração do livro e essa escolha de formato interativo?

Laila Zaid – A ideia do livro ser em missões foi uma inspiração. Mas a ideia de ser interativo era importante para mim. Eu tinha um livro que eu herdei da minha mãe, chamado “Manual da Maga e Min”, que era aquele personagem da turma do Pato Donald e do Tio Patinhas. Era um livro totalmente interativo, que tinha ideias de interpretação dos sonhos, significado das cores e eu queria fazer alguma coisa nessa pegada para que a criança andasse com esse livrinho e fosse interagindo com ele.

A prática da sustentabilidade depende de um monte de coisas. Não pode ser imposta, você tem que fazer ela caber na vida daquela pessoa. Uma criança que vive numa comunidade do Rio de Janeiro, tem uma realidade completamente distinta de uma criança que vive numa roça no Nordeste, ou até num centro urbano do Sul. Então, eu tinha que oferecer a possibilidade de cada criança interagir de acordo com a realidade dela. Se você mora numa casa, você pode tentar fazer uma composteira, se você mora em apartamento, você pode tentar falar com o síndico. 

O embrulho da linguagem é tão importante quanto a mensagem, senão a mensagem não chega. O humor, a ironia, o sarcasmo, são ferramentas muito maravilhosas de comunicação e que funcionam muito bem. Temos que falar disso, mas se a gente só gera medo, também pode levar à inação. Esse é um cuidado necessário, pois tudo que a gente comunicar, é importante conseguir engajamento para a ação

Laila Zaid
Atriz e comunicadora socioambiental

O livro tinha que comunicar de várias formas, não existe uma linguagem, existe um caminho. Acho que a linguagem do livro é muito legal, porque ela empodera a criança: já começa dizendo que você vai chamar a sua família na sala e dizer que agora você vai tomar algumas atitudes, vai mudar algumas coisas da casa. Tem muito da minha linguagem sarcástica, que é um jeito de ter uma comunicação menos infantilizada com as crianças, dentro do recorte etário que o livro propõe.

Quando saiu, o livro foi um grande sucesso, teve uma repercussão muito grande na mídia. Foi super bem de vendas, num primeiro momento, mas o mercado literário é um muito cruel. Se você não tem uma renovação em marketing, se não tem uma lista de livros no currículo, é bem desafiador. Ele não gera dinheiro. 

Mas em algum momento, as escolas começaram a adotar o livro como suporte e foi muito legal, porque não só vi educadores usando o livro como suporte, mas eu tive a oportunidade de ir em escolas interagir com as crianças. Eu chegava nas escolas ganhando desenhos inspirados. Eu fui numa escola que já fez uma apresentação musical inspirada no livro. É emocionante ver os desdobramentos que a sua arte pode ter.

#Colabora – Qual a importância de trabalhar as questões socioambientais e climáticas com as crianças?

Laila Zaid – O livro é para as crianças, porque acredito que é muito mais fácil você instaurar novos hábitos numa criança do que pedir para um adulto mudar hábitos antigos. As crianças têm um poder de transformação gigante, se você tem criança na sua família você sabe, muda tudo. E a criança trazer essas provocações me parece muito rico.

Os jovens que já têm um conhecimento maior do que está acontecendo com o planeta, têm uma tendência de comportamento completamente diferente da geração anterior. Você vê isso em pesquisas que falam de tendência de consumo, tendência de escolhas de profissão. Os jovens já estão diante de um mundo muito diferente da geração dos pais deles e estão tendo que se moldar a isso. 

Muito do que eu trago, não só com o meu livro, porque meu livro trata de uma ponta de informação, ele fala de sustentabilidade, mas eu vejo muito importância na educação socioambiental e climática para crianças. Estamos vivendo desafios que só vão piorar, e as crianças têm que ter ferramentas diferentes para lidar com isso. Resiliência e criatividade são ferramentas muito importantes hoje.

#Colabora – Você se engajou com outras iniciativas, como a campanha “Pare o Tsunami de Plástico”. Como você avalia a situação dessas ações?

Laila Zaid – A campanha está indo muito bem. Mas temos um congresso que é majoritariamente antiambiental, então, qualquer mudança de legislação referente ao espaço ambiental, vai encontrar milhões de desafios e barreiras. A campanha é super importante, porque o problema do plástico é um problema enorme de poluição e de saúde pública. Cada dia que passa, saem mais e mais notíficas dos efeitos de contaminação por plástico no nosso organismo.

E temos de um lado, o lobby do petróleo, então é uma luta de Davi e Golias. No entanto, a sociedade civil chega junto, é uma pauta que tem pouca rejeição porque todo mundo vê o plástico o tempo inteiro. É uma pauta que podemos conseguir engajamento civil sem politizar muito. É uma pauta que está indo muito bem e temos que seguir muito forte nela. 

#Colabora – Os seus vídeos utilizam muito do humor. Qual a importância dessas estratégias para comunicar assuntos complexos como a crise climática para as pessoas?

Laila Zaid – Quando comecei a fazer vídeos, eu não sabia, então usei as trends que tinham. Na época era bumerangue e lembro que eu fazia uns vídeos de bumerangue. Até muito pouco tempo atrás, quem falava de clima eram cientistas ou pessoas com conhecimento técnico e, quando eu trago humor é uma maneira de estar trazendo conhecimento para as pessoas rindo. 

O embrulho da linguagem é tão importante quanto a mensagem, senão a mensagem não chega. O humor, a ironia, o sarcasmo, são ferramentas muito maravilhosas de comunicação e que funcionam muito bem. Temos que falar disso, mas se a gente só gera medo, também pode levar à inação. Esse é um cuidado necessário, pois tudo que a gente comunicar, é importante conseguir engajamento para a ação.

Micael Olegário

Jornalista formado pela Universidade Federal do Pampa (Unipampa). Gaúcho de Caibaté, no interior do Rio Grande do Sul. Mestrando em Comunicação na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Escreve sobre temas ligados a questões socioambientais, educação e acessibilidade.

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