As temperaturas na África vem subindo mais rapidamente do que a temperatura média global, tanto na terra e quanto no oceano. As taxas de elevação do nível do mar ao longo das costas tropicais africanas do Atlântico Sul e do Oceano Índico são mais altas do que a taxa média global. Esta combinação causada pela crise climática vem agravando a seca e provocando mais enchentes no continente o que, com a pandemia de covid-19, provocou aumento significativo da insegurança alimentar, da pobreza e dos deslocamentos na África em 2020, destaca documento divulgado nesta terça (19/10) e coordenado pela Organização Meteorológica Mundial (OMM), com apoio de outras agências da ONU.
De acordo com o relatório ‘Estado do Clima na África 2020’, foi registrado, em 2020, um aumento de quase 40% da população do continente afetada pela insegurança alimentar em comparação com o ano anterior. “Durante 2020, os indicadores climáticos na África foram caracterizados pelo aquecimento contínuo das temperaturas, aumento acelerado do nível do mar, condições meteorológicas extremas e eventos climáticos, como inundações, deslizamentos de terra e secas, e impactos devastadores associados” alerta o secretário-geral da OMM, o metereologista Petteri Taalas, na apresentação do estudo de 44 páginas.
O relatório aponta ainda que, atualmente, apenas três montanhas na África são cobertas por geleiras – o maciço do Monte Quênia (Quênia), as Montanhas Rwenzori (Uganda) e o Monte Kilimanjaro (Tanzânia) – nas três, a redução da cobertura de gelo está avançando mais rapidamente do que em outros continentes. “O rápido encolhimento das últimas geleiras remanescentes em A África oriental, que devem derreter inteiramente em um futuro próximo, sinaliza a ameaça de uma mudança iminente e irreversível para o sistema terrestre “, acrescenta o professor Taalas.
O documento foi lançado durante o Congresso Meteorológico Mundial Extraordinário, que está sendo realizado na Suíça, duas semanas antes da Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP26), com o objetivo de reforçar as evidências científicas sobre a urgência de reduzir as emissões globais de gases de efeito estufa, subir o nível de ambição climática e o aumentar o financiamento para adaptação. “O aumento da resiliência climática é uma necessidade urgente e contínua. Os investimentos são particularmente necessários no desenvolvimento de capacidades e transferência de tecnologia, bem como no aprimoramento dos sistemas de alerta precoce dos países mais pobres, incluindo sistemas de observação do tempo, água e clima,” aponta Taalas.
Gostando do conteúdo? Nossas notícias também podem chegar no seu e-mail.
Veja o que já enviamosDe acordo com o relatório, a insegurança alimentar aumenta em 5 a 20 pontos percentuais a cada enchente ou seca na África Subsaariana. Em 2020, houve estiagens prolongadas na costa norte do Golfo da Guiné, no noroeste da África e ao longo da parte sudeste do continente. A seca em Madagascar desencadeou uma crise humanitária; a invasão de gafanhotos do deserto de proporções históricas, que começou em 2019, continuou a ter um grande impacto no Leste e no Chifre da África em 2020. “A África está testemunhando um aumento da variabilidade do tempo e do clima, o que leva a desastres e perturbações dos sistemas econômicos, ecológicos e sociais”, destaca, no documento, a diplomata e engenheira agrônoma Josefa Leonel Correia Sacko, angolana que chefia a Comissão para Economia Rural e Agricultura da União Africana.
Josefa Sacko alerta ainda para o agravamento da fome e da pobreza no continente com a crise climática. “Em 2030, estima-se que até 118 milhões de pessoas extremamente pobres (ou seja, vivendo com menos de US $ 1,90 / dia) serão expostas à seca, inundações e calor extremo na África, se medidas de resposta adequadas não forem postas em prática. Isto sobrecarregará os esforços de redução da pobreza e dificultará significativamente o crescimento da prosperidade”, frisa a dirigente da União Africana.
O relatório coordenado pela Organização Meteorológica Mundial – com participação ainda de pesquisadores da União Africana, do Centro de Política Climática da África, de organizações científicas internacionais e africanas e de agências das Nações Unidas – calcula ainda que, na África Subsaariana, os custos de adaptação são estimados entre US$ 30 bilhões e US$ 50 bilhões de dólares (2% a 3% do produto interno bruto regional) a cada ano durante a próxima década, para evitar custos ainda maiores na mitigação de desastres. “As mudanças climáticas podem reduzir ainda mais o PIB até 2050. Isso representa um sério desafio para a adaptação ao clima e ações de resiliência, porque não apenas as condições físicas estão piorando, mas também o número de pessoas sendo afetadas está aumentando”, afirma Josefa Sacko.
O ‘Estado do Clima na África 2020’ alerta para outros eventos climáticos extremos no continente: temporais com precipitação muito acima do normal – acompanhados por enchentes – predominaram no Sahel, no Vale do Rift, na bacia hidrográfica central do Nilo, no nordeste da África e no curso inferior do rio Congo; inundações extensas atingiram a África Oriental, com registro de mortos e desabrigados em massa no Sudão, Sudão do Sul, Etiópia, Somália, Quênia, Uganda, Chade, Nigéria (que também enfrentou seca no sul do país), Níger, Benin, Togo, Senegal, Costa do Marfim, Camarões e Burkina Faso; lagos e rios atingiram níveis recordes.
O relatório calcula ainda que 12% de todos os novos deslocamentos populacionais em todo o mundo ocorreram na região do Leste e do Chifre da África, com mais de 1,2 milhão de novos deslocamentos relacionados a desastres – outros quase 500 mil novos deslocados estão relacionados a conflitos. Inundações e tempestades foram os eventos extremos que mais contribuíram para o crescimento de refugiados ambientais, deslocamentos internos relacionados a desastres naturais, seguidas pelas secas.