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COP30: ambientalistas apontam protagonismo da China na descarbonização da economia

Para especialistas reunidos pelo Instituto Clima e Sociedade, conferência em Belém deve aumentar pressão por transição energética e mirar em implementação

A COP30 deve ser um divisor de águas nas negociações mundiais para desacelerar o aquecimento global, com maior comprometimento dos governos nacionais, engajamento de grupos econômicos nas oportunidades da descarbonização e aumento da pressão política mundial pela transição energética. Diante do recuo do governo americano, outra tendência é que a China se consolide no encontro mundial em Belém, em novembro, como uma das lideranças da nova economia.
Esses foram pontos de destaque dos convidados pelo Instituto Clima e Sociedade (iCS) para a primeira mesa redonda sobre as perspectivas da COP30, marcada para novembro em Belém. “Os chineses estão fazendo um esforço grande e deverão se tornar, em curto prazo, os líderes na transformação para as energias renováveis. Eles estão alinhados contra a mudança do clima”, ressaltou a matemática e pesquisadora em ciências da Terra e mudanças climáticas Thelma Krug, líder do Conselho Científico da COP30 e vice-presidente do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima) de 2015 a 2023.
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Thelma Krug destacou ainda na mesa-redonda – que teve a a participação ainda da ambientalista Natalie Unterstell, presidente do Instituto Talanoa, e do economista Jorge Arbache, com mediação da líder em Estratégias Internacionais Sênior do iCS, Cintya Feitosa – que a China, embora não tenha demonstrado grande ambição em suas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) nas últimas conferências do clima, está na prática realizando mais do que havia divulgado. A meta de instalação de energia eólica e solar em 2030 já foi alcançada, e vem sendo diminuído o uso do carvão.
Na Cúpula Virtual sobre Ambição Climática, organizada pelo secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), António Guterres, e o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, no dia 23 de abril, o presidente da China, Xi Jinping, defendeu o multilateralismo, o combate à crise climática e o auxílio financeiro aos países vulneráveis. “Independentemente de como o mundo possa mudar, a China não desacelerará suas ações climáticas, não reduzirá seu apoio à cooperação internacional e não cessará seus esforços para construir uma comunidade com um futuro compartilhado para a humanidade”, afirmou o líder chinês.
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Veja o que já enviamosPara Natalie Unterstell, a China vai ter um papel importante na liderança da agenda do clima. “Vemos a China sendo empurrada para a questão do financiamento, que ela já realiza de alguma forma. A China parece se mover para assumir os compromissos, rompendo uma tendência anterior de não se comprometer tanto com metas, como o Brasil se comprometia”, afirmou a presidente do Instituto Talanoa.
O professor de economia da Universidade de Brasília (UNB) e ex-vice-presidente de Setor Privado do Banco de Desenvolvimento da América Latina (CAF), Jorge Arbache, também destacou os avanços chineses. “A China conseguiu a combinação perfeita de fazer do clima negócios fantásticos, fazendo uma descarbonização ampla e rápida”, apontou. “O sacrifício é muito menor do que parece, pois estão ganhando muito dinheiro com isso, Estão liderando a agenda. Carros elétricos, baterias, painéis solares, as turbinas eólicas”.
Implementação com apoio da ciência
Os debatedores mantiveram um tom otimista a respeito da COP30, embora reconheçam dificuldades criadas pelo recuo dos Estados Unidos sob Donald Trump. “Saímos daquela fase de construção das regras e estamos agora voltados para a implementação, que está sendo demonstrado claramente pelo Brasil como sendo fortemente apoiado pela ciência. Isso nos leva a crer que o Brasil será sim capaz de fazer a virada que o presidente da COP, o embaixador André Corrêa do Lago, mencionou, além de estimular o mutirão que citou em sua primeira carta oficial. Ou seja, trazer a sociedade civil, o setor privado”, afirmou Thelma Krug.
A ex-vice-presidente do IPCC e líder do Conselho Científico da COP30 ressaltou, entretanto, que a ciência tem mostrado que os esforços já feitos ainda não colocaram o mundo na trajetória de limitar o aumento da temperatura global em um nível que minimize os impactos das mudanças do clima. “O nível atual de aquecimento climático, que engloba a atmosfera, o oceano e a biosfera terrestre, já é sentido no mundo inteiro e está levando a eventos extremos, como os que sentimos no Brasil — as secas na Amazônia, as fortes chuvas no Rio Grande do Sul e o aumento das queimadas no Pantanal”, disse.
Thelma Krug lembrou, no entanto, que não se deve esperar que a COP30 resolva todos os problemas. “As COPs são muito complexas, são decisões por consenso. São 196 países tentando encontrar uma linguagem, tentando chegar a uma decisão que leve em consideração toda a heterogeneidade que temos. Ou seja, não esperem que a gente vá conseguir resolver tudo no Brasil, porque isso não vai acontecer. Pequenos avanços já vão significar muito”, afirmou.
A presidente do Instituto Talanoa, Natalie Unterstell, afirmou que a COP de Belém será um sucesso “se conseguir mudar o ritmo e a escala da implementação do Acordo de Paris”. O risco, por outro lado, é o de “normalizar a lentidão, enquanto o planeta ferve”. Ela disse que as COPs nos últimos anos se tornaram processos confusos, com atrasos e com lacunas de ambição que foram reveladas pelo Balanço Global recentemente. “As COPs hoje estão pouco conectadas à realidade das pessoas, especialmente dos mais vulneráveis, que estão sentindo já o que é viver no planeta mais quente”, analisou.
A ambientalista, porém, acredita que há oportunidades reais em várias frentes. “Para Belém ser um sucesso, a gente tem que considerar Paris como um ponto de partida e Belém como esse ponto de virada. O mínimo que a COP precisa para ser um sucesso é não ser apenas uma celebração dos 10 anos do Acordo de Paris. Que seja uma COP transformadora, um ponto de virada, e que consiga endereçar a adaptação, a transição e os aspectos de governança que vão muito além da própria conferência”, enfatizou Natalie Unterstel.
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