A Conferência de Bonn é a principal reunião preparatória da ONU para cada COP, reunindo negociadores climáticos de todo o mundo. A edição deste ano (SB62) será de 16 a 26 de junho e definirá os trilhos técnicos e políticos da COP30 de Belém, em novembro. As negociações ocorrem após o alerta da WMO no mês passado sobre uma probabilidade de 87% de que o limite de 1,5°C seja ultrapassado entre agora e 2029, além de seguradoras estimarem perdas de US$ 320 bilhões apenas em 2024.
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Antes da conferência de meio de ano, o presidente da COP30, André Corrêa do Lago, apresentou as prioridades do Brasil para Belém em uma série de cartas, destacando a intenção de avançar em temas como a transição para longe dos combustíveis fósseis, investimentos em adaptação e um marco para a transição justa.
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Veja o que já enviamos“A presidência brasileira precisa apresentar com clareza quais são os resultados que considera prioritários, especialmente porque está convocando uma ação coletiva — e já vemos sociedade civil, setor privado e governos subnacionais respondendo a esse chamado”, afirma Cintya Feitosa, estrategista internacional do Instituto Clima e Sociedade (iCS). “Sem um ponto de chegada compartilhado, essa ação coletiva corre o risco de virar uma cacofonia, em vez de avançar de forma coordenada.”
Apenas 22 países enviaram planos climáticos nacionais atualizados (as chamadas NDCs), que são devidos este ano — e apenas um deles (o Reino Unido) foi avaliado como compatível com a meta de 1,5°C do Acordo de Paris. China, União Europeia e Índia estão entre os grandes emissores que ainda não apresentaram suas metas para 2035.
“Ainda estamos esperando que os grandes emissores — UE, China e Índia — apresentem seus planos climáticos nacionais. A UE precisa agir rapidamente — sabemos que vários países estão aguardando para avaliar seu nível de ambição antes de apresentar suas próprias NDCs”, alerta Catherine Abreu, diretora do International Climate Politics Hub (ICPH).
As negociações acontecem em um contexto de impactos climáticos cada vez mais caros: um relatório recente estimou que, nos atuais cenários de aquecimento, os pequenos Estados insulares podem enfrentar perdas de cerca de US$ 56 bilhões até 2050. “Alguns países estão tendo que comprometer uma parte substancial de seu PIB para enfrentar a crise climática em seus próprios territórios — uma crise que eles não causaram”, lamenta Julius Mbatia, gerente de Programas de Justiça Climática, ACT Alliance. “Daqui para frente, precisamos de um roteiro de Baku a Belém que estabeleça com firmeza que os países desenvolvidos devem arcar com a maior parte da conta, por meio de financiamento que não gere dívidas.”
Ao mesmo tempo, a transição para energia limpa está se acelerando, com cerca de US$ 2,2 trilhões investidos coletivamente em renováveis, energia nuclear, redes, armazenamento, combustíveis de baixa emissão, eficiência e eletrificação — o dobro dos US$ 1,1 trilhão direcionados a petróleo, gás natural e carvão, segundo a Agência Internacional de Energia. O ritmo ainda é insuficiente. Na COP28, todos os governos se comprometeram a triplicar a energia limpa e avançar na transição para longe dos fósseis. Em um ano geopolítico difícil, a conferência de Bonn deve indicar o nível de impulso para a ação coletiva rumo à COP30, em Belém.
Adaptação e transição
O embaixador Corrêa do Lago afirmou em sua última carta que uma das prioridades para a COP30 e que precisa avançar na Cúpula de Bonn é a definição de indicadores para a Meta Global de Adaptação (GGA) – os países devem fechar uma lista de até 100 elementos. A disputa gira em torno do vínculo com financiamento, inclusão de recortes sociais e uso de saberes tradicionais. Brasil e outros países do Sul pressionam por maior coerência com planos nacionais (NAPs) e mecanismos de acompanhamento. Discussão também inclui governança, com propostas de fortalecimento do Comitê de Adaptação e articulação com o Painel de Mudanças Climáticas da ONU (IPCC).
As negociações sobre transição justa (JTWP) estão ainda mais travadas e começam sem texto-base. O Brasil quer recomendações políticas e conexão com o Balanço Global obtido em Dubai (GST) e as metas climáticas, as chamadas NDCs. Partes do Sul e sociedade civil pedem abordagem ampla, com foco em desigualdades, proteção social e reparação histórica.
Bonn deve lançar trilho permanente para implementar o GST, com foco na transição energética com afastamento dos combustíveis fósseis. E uma reformulação da Agenda de Ação – um espaço voluntário e que tem servido para promoção das prioridades de cada anfitrião de cop – pode tornar o GST um tema permanente de trabalho e implementação. Essa reformulação é uma inovação da presidência brasileira e será apresentada em detalhes em Bonn.