Desmatamento, o vilão do efeito estufa

Área desmatada em Altamira, no Pará: leis estaduais e federais prejudicam regularização fundiária e facilitam grilagem na Amazônia (Foto: João Laet/AFP – 07/09/2019)

Emissões de gases ficam estáveis em 2018, mas derrubada da floresta na Amazônia puxa índice para cima e Brasil não atingirá meta do Acordo de Paris

Por Paula Passos | ODS 13 • Publicada em 6 de novembro de 2019 - 11:09 • Atualizada em 6 de novembro de 2019 - 18:55

Área desmatada em Altamira, no Pará: leis estaduais e federais prejudicam regularização fundiária e facilitam grilagem na Amazônia (Foto: João Laet/AFP – 07/09/2019)
Área desmatada em Altamira, no Pará, estado líder em emissões de gases do efeito estufa: relatório mostra desmatamento como vilão das emissões (Foto: João Laet/AFP)
Área desmatada em Altamira, no Pará, estado líder em emissões de gases do efeito estufa: relatório mostra desmatamento como vilão das emissões (Foto: João Laet/AFP)

As emissões de gases de efeito estufa se mantiveram estáveis no Brasil em 2018, segundo nova estimativa do Sistema de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SEEG), do Observatório do Clima (OC). No ano passado, o país teve emissões brutas de 1,939 bilhão de toneladas de CO2 equivalente (CO2e) –  medida utilizada para comparar as emissões dos diferentes gases de efeito estufa -, um valor 0,3% maior do que o 1,932 bilhão de toneladas verificado em 2017. 

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O desmatamento na Amazônia, que subiu 8,5%, puxou as emissões para cima.  “Esse aumento foi capitaneado pelo Pará, onde o desmatamento também explodiu em regiões de conservação e territórios indígenas”, afirmou Ane Alencar, diretora de Ciência do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam). No ano passado, esse crescimento das emissões no manejo da terra foram parcialmente compensadas por uma queda de 10,9% na taxa de desmatamento no Cerrado.

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O Brasil está muito aquém de seu potencial de redução de emissão de gases do efeito estufa. Poderíamos melhorar, se o desmatamento fosse zerado e se o manuseio do pasto fosse feito de melhor forma

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Essa boa notícia sobre o Cerrado é um retrato do passado. Até o fim de 2019, as taxas devem crescer, devido ao aumento do desmatamento na Amazônia e no Cerrado, detectados pelo Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) e outros órgãos de monitoramento. “O desmatamento deste ano ainda não está capturado nesta estimativa”, ressaltou Tasso Azevedo, coordenador-técnico do OC e coordenador do SEEG, na apresentação dos dados, em São Paulo. 

O desmatamento segue responsável por 44% das emissões do Brasil com a emissão de 845 milhões de toneladas de CO2e em 2018, um crescimento de 3,6% em relação às 816 milhões de toneladas do ano anterior. “O Brasil está muito aquém de seu potencial de redução de emissão de gases do efeito estufa. Poderíamos melhorar, se o desmatamento fosse zerado e se o manuseio do pasto fosse feito de melhor forma”, acrescentou Tasso Azevedo.

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Nós já vínhamos numa situação delicada antes do desmonte da governança ambiental brasileira, promovido pelo governo atual. Em 2019, os planos de combate ao desmatamento na Amazônia e Cerrado foram engavetados

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O país não cumprirá a meta estabelecida para 2020 em sua lei nacional de clima de reduzir em 80% a taxa de desmatamento na Amazônia. Ainda que o desmatamento parasse hoje, o aumento detectado pelo sistema de monitoramento do Inpe nos últimos meses já coloca o Brasil num patamar superior aos 3.925 km2 estabelecidos na lei. Com a meta de 2020 prejudicada, o país parte de uma posição pior para cumprir sua NDC (Nationally Determined Contribution – Contribuição Nacionalmente Determinada), a meta do Acordo de Paris.

Em 2016 e 2017, as emissões vinham em queda: 0,4% e 4,2, respectivamente.  A estabilidade de 2018 não chega a ser uma boa notícia. “Se compararmos nosso país com os Estados Unidos e a China, onde as emissões estão aumentando, poderíamos dizer que essa estabilização é positiva. Entretanto, quando avaliamos a contribuição de emissão por cada pessoa, o Brasil piora a média global”, explicou Tasso Azevedo. O Brasil é o sexto maior poluidor climático do planeta – atrás de EUA, China, Índia, Indonésia e Rússia.  “O planeta precisa que as emissões sejam reduzidas com vigor nos próximos anos, e infelizmente nosso cenário de emissões para 2020 é de aumento”, afirmou Tasso Azevedo.

Carlos Rittl, secretário-executivo do Observatório do Clima, também tem uma análise pessimista par os próximos relatórios. “Nós já vínhamos numa situação delicada antes do desmonte da governança ambiental brasileira, promovido pelo governo atual. Em 2019, os planos de combate ao desmatamento na Amazônia e Cerrado foram engavetados e não temos nem um esboço de plano para a implementação da NDC, que deveria ocorrer a partir de 2020. Na verdade, até os órgãos que deveriam implantar a NDC foram extintos pela atual administração”, disse Rittl.

As estimativas foram geradas de acordo com as diretrizes do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas), baseadas nos Inventários Brasileiros de Emissões e Remoções Antrópicas de Gases do Efeito Estufa, do MCTIC (Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações). Atuaram no SEEG 7 pesquisadores das ONGs: Ipam e Imazon (Mudança de Uso da Terra), Imaflora (Agropecuária), Iema (Energia e Processos Industriais) e ICLEI – Governos Locais pela Sustentabilidade (Resíduos). Nesta quarta-feira (6/11), o SEEG será apresentado na Conferência Brasileira de Mudança Climática que vai até sexta no Recife. 

Energia e agropecuária

No setor de energia, registrou-se queda de 5% nas emissões, ocasionada por um aumento expressivo (13%) no uso de etanol no transporte de passageiros, pela adição obrigatória de biodiesel ao diesel e pelo incremento de renováveis na geração de eletricidade.  Houve ainda crescimento da energia eólica, da energia solar e aumento das chuvas, que fizeram o governo desligar termelétricas fósseis e acionar usinas hidrelétricas. Devido ao menor acionamento de usinas térmicas, as fontes não-hídricas ultrapassaram as fósseis pela primeira vez e, em 2018, foram a segunda maior fonte de eletricidade para o país.

Já as emissões de agropecuária, processos industriais e resíduos tiveram pequenas variações: queda de 0,7% no primeiro setor e aumento de 1% nos outros dois. O setor foi responsável por 25% das emissões do Brasil em 2018, com 492 milhões de toneladas de CO2e.  Essa pequena queda, em relação a 2017, foi causada por uma redução no rebanho bovino, principal fonte de gases de efeito estufa do setor. Desde 2016, a agropecuária tem tido pequenas quedas nas suas emissões devido a variações de conjuntura. 

“Uma forma de diminuir a emissão de gases na agropecuária é através de uma agricultura com emissão de carbono em baixa escala. Isso é possível por meio do uso correto de fertilizantes nitrogenados, do aumento no plantio de árvores, da rotação de culturas na área de pastos, além de um melhor cuidado com as pastagens degradadas”, detalha Ciniro Costa, engenheiro de clima e cadeias agropecuárias do Imaflora (Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola). 

Paula Passos

Jornalista, especialista em Marketing, com passagens pela TVU Recife, Portal LeiaJá e Rede Globo NE. Como repórter freelancer, escreveu para Ponte Jornalismo, #Colabora, Folha de São Paulo, The Intercept Brasil, El País e Revista Continente. Atualmente, pesquisa linguagens audiovisuais no mestrado em Comunicação na UFPE.

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