A Câmara Municipal do Rio de Janeiro deve receber da prefeitura, em 2017, R$ 13 milhões a mais que o previsto para este ano, apesar da expectativa de um orçamento menor. O prefeito eleito Marcelo Crivella (PRB) vai administrar um caixa mais minguado que o do seu antecessor, Eduardo Paes (PMDB). Serão R$ 29,5 bilhões contra R$ 31 bilhões. O repasse para os vereadores, no entanto, será engordado em 2,25%, podendo superar R$ 623 milhões. Este ano, o valor previsto foi de R$ 610 milhões.
Com base na Lei de Acesso à Informação (LAI), o site do projeto “E aí, vereador?” vem, desde maio último, solicitando dados financeiros à Câmara de Vereadores do Rio. Os pedidos de esclarecimento vêm sendo solenemente ignorados pela ouvidoria da casa. Como as poucas respostas recebidas foram insatisfatórias, a denúncia foi parar no TJ, como mostrou a reportagem “O que eles escondem?“, publicada no site. Um dia depois da diplomação dos vereadores eleitos, agendada para esta quinta-feira (15/12), o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) deve intimar a Câmara de Vereadores para saber o motivo de a casa não estar cumprindo a legislação prevista na LAI.
Falta de transparência
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Veja o que já enviamosIntegrante da ONG Meu Rio, Pedro Torres critica tanto o aumento do valor do repasse quanto a falta de transparência sobre o uso dos recursos. “Acho que se tivesse um aumento com a justificativa da realização de um concurso público, por exemplo, não haveria problema. Só que o contexto não é esse. O Estado está em crise e a a prefeitura do Rio também, mas, apesar da queda de arrecadação, os benefícios aos vereadores continuam garantidos. Esta casta política continua sendo privilegiada, enquanto a população vem sofrendo com cortes e redução de direitos”. Dos R$ 623 milhões que serão repassados aos vereadores, R$ 455 milhões serão gastos com a folha de pagamento. Cada parlamentar pode contratar 20 assessores e tem direito, ainda, a três funcionários concursados.
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Acho que se tivesse um aumento com a justificativa da realização de um concurso público, por exemplo, não haveria problema. Só que o contexto não é esse. O Estado está em crise e a prefeitura do Rio também, mas, apesar da queda de arrecadação, os benefícios aos vereadores continuam garantidos. Esta casta política continua sendo privilegiada, enquanto a população vem sofrendo com cortes e redução de direitos
[/g1_quote]Após analisar alguns contratos assinados nos últimos meses, o projeto “E aí, vereador?” concluiu que, só com combustíveis, o custo anual é de R$ 2,4 milhões. O contrato com a Trivale Administração – empresa responsável por administrar os cartões corporativos – foi assinado em outubro último e vai vigorar pelos próximos 12 meses. Mensalmente, cada vereador tem direito a mil litros de combustível.
O contrato com os Correios, de R$ 4,5 milhões, foi renovado em agosto passado. Cada vereador tem direito a usar 4 mil selos.
Do total previsto para ser repassado, mais de R$ 9 milhões correspondem ao Fundo Especial, criado em 2009 para garantir verba para reforma ou compra de imóveis, materiais, equipamentos e outras atividades previstas no projeto de lei 421/2009. O valor reservado para investimentos passa de R$ 8 milhões. Para Inversões Financeiras serão quase R$ 2,5 milhões.
Perguntas sem respostas
Membro do Conselho Regional de Contabilidade do Rio de Janeiro, Rosângela Dias engrossa o rol de críticas contra a falta de transparência na casa: “A Câmara de Vereadores tem a obrigação de informar à sociedade sobre como e onde vai aplicar os recursos financeiros. A Lei de Acesso à Informação é uma ferramenta que todo cidadão deve conhecer”, diz a conselheira.
Em resposta aos questionamentos sobre a necessidade do aumento do repasse, a assessoria da Câmara informou, por e-mail, que cumpre a Constituição Federal e citou o artigo 168. Eduardo Gnisci, mestre em Administração Pública pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), rebate a explicação. “O artigo trata da obrigatoriedade de repasse do recursos, não necessariamente que eles tenham que ser maiores ou menores. E este valor tem que ter sido aprovado no orçamento elaborado no ano anterior e devidamente justificado”.
A Câmara tem autonomia para dizer à prefeitura quanto vai precisar para cobrir as próprias despesas no ano seguinte. Apenas o percentual máximo de repasse é determinado constitucionalmente. O mínimo não. Este repasse pode ser de até 4%, no caso do Rio de Janeiro, que tem uma população de 6,5 milhões de habitantes. O percentual máximo de 4% é estabelecido para municípios que têm até 8 milhões de habitantes, de acordo com o art. 27-A da Constituição Federal.
O e-mail da assessoria ainda diz que a Câmara doou R$ 270 milhões, somente nesta Legislatura (2013-2016), para que fossem usados em áreas prioritárias como saúde e educação. Recursos que não foram utilizados. Desde 2014, se o Legislativo não gasta toda a verba repassada, o que sobra no fim do ano é destinado pela Câmara a algum programa ou projeto nas áreas de saúde e educação, como previsto no projeto de lei nº 734/2014.
A assessoria também ressaltou que o Portal da Transparência foi criado em cumprimento à Lei de Acesso à Informação (LAI, de 12.527/11), lembrando que, no espaço, é possível obter informações sobre a atividade parlamentar, atas das sessões, execução orçamentária, etc., mas não comentou diretamente as criticas dos entrevistados sobre a falta de informações detalhadas das despesas.
Alheios à crise que se abateu sobre o país, os vereadores não pensaram em diminuir seus próprios salários e benefícios indiretos. Muito pelo contrário. Decidiram, por decreto, continuar ganhando o máximo que a Constituição Brasileira permite.