“O crédito faz a ponte entre o presente e o futuro”. A frase é de John Maynard Keynes, mas era o economista Paul Singer quem costumava repeti-la, à exaustão, todas as vezes em que era convidado a participar do lançamento de um novo banco comunitário pelo Brasil afora. Por 13 anos, ele ficou à frente da Secretaria Nacional de Economia Solidária (Senaes) – órgão vinculado ao Ministério do Trabalho e aliado fundamental dos bancos comunitários. Sua gestão durou por dois governos: de 2003 a 2011, com Lula, e até 2016, com Dilma Rousseff. Morto há cinco meses, Singer levou consigo a alcunha de pai da economia solidária. Ele foi um verdadeiro maestro dessa doutrina por acreditar que a democratização do crédito aos mais pobres era a única forma de construir a tal ponte, entre o presente e o futuro, projetada retoricamente por Keynes.
Foi com esta crença que deu força total à expansão das moedas sociais no país, e aos bancos comunitários, fazendo com que experiências parecidas com a brasileira fossem replicadas em países da América Latina e da África. Só que, em agosto, completou dois anos que a economia solidária sofreu um duplo golpe no Brasil – ambos mortais. O primeiro foi o próprio impeachment de Dilma Rousseff, quando Singer entregou o cargo, junto com equipe, no dia seguinte à destituição da presidente do Planalto. O segundo foi o atentado sistemático promovido pelo governo Temer à pasta. Só que, apesar do esforço concentrado para enfraquecer as iniciativas de economia solidária no país, o legado de Singer continua vivo.
O desprezo pela economia solidária é gritante no governo Temer. Procurado, o Banco Central (BC) respondeu, por email, que “acompanha de longe o tema”; enquanto o substituto de Singer na Senaes, Natalino Oldakoski, admitiu publicamente seu total desconhecimento sobre o assunto. Com potencial para criar emprego e renda via economia solidária, os bancos comunitários são a antítese do tradicional sistema financeiro, que, no lugar de criar riqueza, apenas transfere renda.
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Veja o que já enviamosQuem viu o filme Uma Linda Mulher lembrará como o aplicador financeiro, quando perguntado pela prostituta o que ele faz na vida, responde de maneira direta: “Eu faço o mesmo que você, eu f…com as pessoas por dinheiro” (Same as you, I screw people for money). A referência faz parte do artigo “A economia travada pelos intermediários financeiros”, escrito pelo economista Ladislau Dowbor, da PUC-SP. Autor de dezenas de livros sobre desenvolvimento econômico e social, Dowbor traduz com uma simplicidade constrangedora o comportamento dos ricos e dos pobres. “Quem ganha pouco não compra belas casas, fazendas e iates, menos ainda faz aplicações financeiras de alto rendimento. O pobre gasta, o rico acumula”. É este mecanismo de enriquecimento que a economia solidária se contrapõe.
O entusiasmo de Singer pela economia solidária o fez acreditar que ela seria “a porta de saída do Bolsa Família”, como chegou a afirmar em uma de suas muitas entrevistas. O economista morreu sem ver seu sonho realizado.
Bancos do Bem
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