Ensinando a pescar

União de Mulheres Pró-Melhoramentos da Roupa Suja (UMPMRS)

Por Marcelo Ahmed | Mapa das ONGsODS 10 • Publicada em 5 de novembro de 2016 - 21:10 • Atualizada em 3 de setembro de 2017 - 01:20

ONG Roupa Suja. Foto de Divulgacao
ONG Roupa Suja. Foto de Divulgacao
Crianças na ONG Roupa Suja, no alto da Rocinha. Foto de Divulgação

No alto da Rocinha, na localidade conhecida como Roupa Suja, uma das mais carentes da favela, uma construção se destaca pelo vai e vem de crianças. É uma casa de três andares, onde os pequenos estudam, brincam, se alimentam e podem chamar de lar, até que mais tarde voltem ao convívio dos pais ou responsáveis.

À frente desse lugar, chamado União de Mulheres Pró-Melhoramentos da Roupa Suja (UMPMRS), está Márcia Ferreira da Costa, 50 anos. Bisavó de um dos alunos da creche e nascida na comunidade, ela começou a dar aulas de reforço escolar para adultos aos 12 anos. E nunca mais parou.

[g1_quote author_name=”Márcia Ferreira” author_description=”professora e coordenadora da UMPMRS” author_description_format=”%link%” align=”left” size=”s” style=”simple” template=”01″]

Aqui na Rocinha, sempre houve muitos nordestinos, que não sabiam ler nem escrever. Comecei lendo e escrevendo cartas pra eles. Aí, meu pai disse: ‘Em vez de dar o peixe, ensina eles a pescar’. E passei a dar aulas não só para os adultos, como para os filhos deles também

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“Aqui na Rocinha, sempre houve muitos nordestinos, que não sabiam ler nem escrever. Comecei lendo e escrevendo cartas pra eles. Aí, meu pai disse: ‘Em vez de dar o peixe, ensina eles a pescar’. E passei a dar aulas não só para os adultos, como para os filhos deles também”, conta Márcia.

Além de professora, ela também foi mãe precoce, aos 14 anos. Um ano depois, teve outro filho. Mas as atividades maternas só a impediram de lecionar por pouco tempo. Posteriormente, teve mais dois filhos. Em 1987, mudou-se para o Roupa Suja e organizou a creche, para cuidar dos vizinhos sem nunca receber por isso. Inicialmente, o lugar chamava-se Cantinho de Deus.

Há quase 20 anos, Márcia começou a dar aulas para o filho de Maria do Carmo de Farias Barbosa, a Carminha, 44 anos, que ofereceu-lhe ajuda. E Carminha transformou-se no seu braço administrativo. “Eu dizia que, se ela precisasse de uma força, falasse comigo. Márcia sempre precisava. Sabe aquela coisa de vai ficando? Somos agora uma grande família”, diz Carminha sobre a amiga, responsável pela alfabetização de seus dois filhos.

Márcia, entre Carminha  e Alanna. Foto de Marcelo Ahmed

Cerca de cinco anos depois, a creche recebeu do exterior outro reforço de peso, quando a americana Alanna Campus, 38 anos, veio passar alguns dias com o marido no Rio. “Vendo a situação das favelas, pensei em ajudar. Fiquei três anos só cuidando das crianças, até começar o trabalho de captação de fundos com ONGs de fora, trazendo doações”, explica Alanna, que mora no Rio, com o marido e três filhos.

A americana é a responsável por projetos e parcerias que viabilizam recursos para a UMPMRS. Como percebeu que havia muitos estrangeiros interessados em trabalhar como voluntários, resolveu cobrar por isso. Após ganhar R$ 10 mil com um projeto de empreendedorismo de sua autoria, montou um hostel poucos metros acima, chamado Roupa Feliz. Resultado: os gringos pagam para se hospedar no local, ajudam com as crianças, e o dinheiro é todo revertido para a creche. Quem cuida do albergue é Paulo Roberto Costa, filho de Márcia.

Experiência social

O serviço de voluntariado é formado exclusivamente por estrangeiros. Não que brasileiros não sejam bem-vindos. Mas, para Alanna, a primazia dos gringos é porque muitos deles chegam ao Brasil sensibilizados pelos problemas locais e querem ajudar.

O italiano Nino Masona. Foto de Marcelo Ahmed

O italiano Nino Mason, 28 anos, um dos quatro voluntários do exterior que trabalham na creche, conta que estava viajando pela América do Sul e queria ter uma experiência diferente. “Ao chegar no Rio de Janeiro, perguntei para amigos, pesquisei na internet, onde poderia trabalhar. E já estou aqui há oito meses”, conta Nino, sem saber até quando ficará.

A União de Mulheres Pró-Melhoramentos da Roupa Suja funciona das 8h às 16h30, atendendo cerca de 50 crianças entre 3 meses e 5 anos e 11 meses de idade, a maioria em período integral, quando fazem refeições desde o café da manhã até o jantar. Também são oferecidas aulas de reforço escolar e de inglês, para quem tem entre 7 e 15 anos. Os responsáveis recebem orientação de assistentes sociais, seguindo a Lei de Diretrizes e Bases e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). E ainda há parcerias que permitem consultas com pediatras e psicólogos.

Márcia diz que é uma grande luta levantar fundos para manter tudo de pé e pagar os funcionários. Além dos patrocínios, sonha em firmar uma parceria com a prefeitura. Dividindo o tempo entre a ONG e a faculdade de pedagogia, que cursa de manhã, diz que se sente recompensada por todo o esforço: “Tem gente que tenta ser professor, mas não consegue. Estou nisso há 38 anos. É minha vocação”.

Marcelo Ahmed

Marcelo Ahmed é um jornalista carioca que começou a carreira em jornais impressos, passando por 'Ultima Hora', 'Tribuna da Imprensa', 'Jornal do Brasil' e 'O Dia'. Foi para a 'TV Globo' para trabalhar no Linha Direta, rodando pelo jornalismo diário, Fantástico e G1. Seu último emprego foi como assessor-chefe da ASCOM do Ministério Público do Rio. Tem dois prêmios Tim Lopes de Jornalismo Investigativo e uma Comenda da Paz por trabalhos em Direitos Humanos. E já é vovô de Théo.

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