Empresas sustentáveis divergem de Trump

A Toyota planeja não apenas reduzir, mas eliminar, até 2050, as emissões de CO2. Fot de Toru Yamanaka

Companhias ignoram movimentos do governo e avançam para economia de baixo carbono

Por The Conversation | Economia VerdeODS 14 • Publicada em 3 de janeiro de 2017 - 08:00 • Atualizada em 2 de setembro de 2017 - 15:41

A Toyota planeja não apenas reduzir, mas eliminar, até 2050, as emissões de CO2. Fot de Toru Yamanaka
A Toyota planeja não apenas reduzir, mas eliminar, até 2050, as emissões de CO2. Fot de Toru Yamanaka
A Toyota planeja não apenas reduzir, mas eliminar, até 2050, as emissões de CO2. Fot de Toru Yamanaka

(Andrew J. Hoffman)* – O futuro governo  Trump se move na direção errada ao indicar o cético Scott Pruitt  para chefiar a Agência de Proteção Ambiental (EPA, na sigla em inglês) e uma equipe de transição identificada com os defensores dos combustíveis fósseis.

Para se ter uma ideia da transformação da paisagem econômica, os empregos no setor da energia limpa superaram os da área de exploração de petróleo pela primeira vez em 2016, e continuam a crescer.

[g1_quote author_name=”Paul Polman” author_description=”CEO da Unilever” author_description_format=”%link%” align=”left” size=”s” style=”simple” template=”01″]

Vivemos um período muito interessante da história, no qual o mundo empresarial responsável está correndo à frente dos políticos e adotando um papel mais amplo em benefício da sociedade.

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É bom notar também que muitos no mundo corporativo americano vão na direção contrária à de Trump. Kevin Butt, diretor de sustentabilidade ambiental da Toyota Motor North América, tem como objetivo levar a companhia “além do impacto ambiental zero” ao reduzir, e eventualmente eliminar, as emissões de CO2 associadas à operação dos veículos, sua própria produção e dos materiais envolvidos e fontes energéticas, por volta de 2050.

Este esforço não é maluco como pode parecer. Soluções para a mudança climática requerem um novo tipo de pensamento, agressivo. Tratados globais são importantes, mas não suficientes. A sociedade precisa se tornar neutra e, depois, negativa em carbono.

A responsabilidade última por realizar essa mudança está recaindo, em primeiro lugar, sobre o mundo corporativo. Empresas estão criando os próximos prédios em que moraremos e trabalharemos, as roupas que usaremos, os alimentos que comeremos, as formas de mobilidade que usaremos e os sistemas energéticos que nos moverão. Com sua força de criatividade, produção e distribuição, as companhias são as únicas entidades que podem produzir a mudança de que precisamos. Se não houver soluções vindas do mundo empresarial, não haverá soluções na escala necessária.

A Unilever está entre as empresas de escala mundial que assumiram compromissos de reduzir os seus impactos. Foto WENG LEI / IMAGINECHINA

As companhias estão às voltas com os desafios da sustentabilidade desde os 1990s, e com a mudança climática desde os 2000s, mas o foco de seu esforço está agora num ponto de inflexão, conforme demonstra o “impacto além de zero” da Toyota. Em vez de esperar soluções do governo, muitas estão assumindo a responsabilidade de reagir à mudança climática com seriedade.

Nos últimos 25 anos, as companhias consideraram a sustentabilidade ambiental um novo fator mercadológico que se encaixa na forma de gerenciar um negócio. A Whirpool, por exemplo, inova em eficiência energética dos eletrodomésticos que fabrica, não devido à responsabilidade social, mas porque assistiu à eficiência energética saltar de 12º entre as prioridades dos consumidores, nos anos 1980s, para 3º, atrás apenas de custo e desempenho. Essas preocupações vão continuar crescendo. De modo similar, a maioria dos fabricantes automobilísticos se movem em direção à propulsão híbrida ou elétrica porque as veem como o futuro do setor.

Pesquisas recentes mostram que 85% dos executivos acreditam que a mudança climática é real (bem acima da média nacional de 64%) e mais de 90% dos CEOs, que a sustentabilidade é importante para os lucros da empresa. Assim, mais companhias estão criando novas estratégias e cargos como Executivo-Chefe de Sustentabilidade.

Ainda é pouco

Apesar disso, nosso mundo continua a se tornar menos sustentável, não mais. Os problemas que enfrentamos hoje são muito diversos daqueles dos anos 1990s. Para marcar essa mudança, cientistas propuseram que deixamos o Holoceno e entramos no Antropoceno, uma nova era geológica que reconhece os humanos como uma força significativa agindo dentro dos ecossistemas terrestres .

O reconhecimento desse novo paradigma tem amplas implicações sobre os negócios e a sustentabilidade. Em vez de encaixar modelos sustentáveis nos modelos mercadológicos existentes, precisamos reconhecer que o mercado assume o controle dos sistemas naturais, com consequências potencialmente catastróficas. Mudança climática, esgotamento do ozônio, secas, incêndios incontroláveis, insegurança alimentar, escassez de água e a agitação social resultante, tudo aponta para o fracasso do sistema criado por nossas instituições políticas e de mercado.

O próximo modelo de sustentabilidade empresarial envolve corporações que realizam mudanças sistêmicas no ambiente de negócios. Ele considera a empresa como uma força positiva na sociedade, capaz de aperfeiçoar nosso legado de danos e mitigar os impactos de uma população global que deverá alcançar 9 bilhões de pessoas em 2050.

Já podemos vislumbrar alguns dos elementos desta mudança:

– Foco no sistema. A noção de uma companhia energética instalar um parque eólico e chamá-lo de sustentável não faz sentido. Um sistema energético mais sustentável incorpora toda a rede, abrangendo geração, transmissão, distribuição, uso e mobilidade. O Google, por exemplo, planeja impulsionar todos os seus data centers com energia renovável em 2017. Isto vai muito além de um tosco compromisso, criando uma proteção contra uma eventual volatilidade energética que o obrigue a mudar todo o sistema do qual a companhia depende.

– Envolver toda a cadeia de suprimentos. Enfoques sistêmicos para a sustentabilidade dos negócios requerem consideração mais ampla sobre operações e logística de cadeias de suprimentos. É necessário o uso de conceitos tipo análise de ciclo vital, ecologia industrial e economia circular, para reduzir o uso de material e energia.

– O governo como colaborador. Desde Adam Smith, o governo tem sido o árbitro do mercado, ajudando a estabelecer as regras a serviço dos humanos e as adaptando às mudanças necessárias. No futuro, o mercado restringirá (ou eliminará) a emissão de gases-estufa como forma de promover o crescimento econômico, não dificultá-lo.

– Questionar nossos modelos e métricas padrão. A transformação do mercado está levando a um reexame dos modelos hoje usados para compreender e explicar os próprios mercados, tais como a economia neoclássica e a teoria do agente principal. Ambas são simplificações do ser humano – alguém não confiável, movido a avareza, ganância e pensamento de curto prazo. Muitos no mundo empresarial dirão que suas motivações e estratégias são muito mais complexas. Por exemplo, alguns, como o ex-CEO da GE Jack Welsh, questionam a ideia de que o propósito das corporações seja apenas ganhar dinheiro para seus acionistas.

À medida que esses modelos são questionados, novos estão emergindo: do capitalismo regenerativo  ao consumo colaborativo , do abastecimento livre de conflitos  à economia compartilhada.

Enquanto o enfoque de Trump em relação à EPA guarda similaridades com a tentativa do presidente Reagan de desmantelar normas ambientais nos anos 1980, há também uma grande diferença: a reação contrária de empresas que estão à frente da redução da emissão de gases-estufa e da produção de energia renovável, e não lutando contra as políticas de proteção ambiental, como no passado.

Para possibilitar mudanças, não no sistema, mas de sistema, companhias estão também trabalhando com o governo para eliminar produtos químicos HFC, que capturam calor, estabelecer novas metas de eficiência para caminhões, criar regras de transparência para “conflict minerals” ou participar de negociações de acordos globais sobre mudanças climáticas.

Exemplos de empresas que estão fazendo isso por conta própria incluem as que alteram a cadeia de suprimentos da borracha ou reduzem (até eliminam) o uso de antibióticos em frangos.

Em cada um desses casos, as companhias estão entrando, nas palavras do CEO da Unilever, Paul Polman, “num período muito interessante da história, no qual o mundo empresarial responsável está correndo à frente dos políticos” e adotando um papel mais amplo “em benefício da sociedade”.

*Andrew J. Hoffman é professor da Ross School of Business e diretor de educação do Graham Sustainability Institute, da Universidade de Michigan

(Tradução: Trajano de Moraes)

The Conversation

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