Paulo Vaz, Pedro HMC, Vyni e um apelo aos LGBT+: precisamos parar de nos odiar

Paulo Vaz, Vyni e Pedro HMC: acolhimento é urgente. (Arte: Dan Torres)

Em artigo, jornalista Yuri Fernandes reflete sobre onda de ódio e transfobia dentro da própria comunidade, gerada principalmente por homens cis gays, e como acolhimento é pauta urgente.

Por Yuri Alves Fernandes | ArtigoODS 16 • Publicada em 16 de março de 2022 - 01:17 • Atualizada em 1 de dezembro de 2023 - 18:10

Paulo Vaz, Vyni e Pedro HMC: acolhimento é urgente. (Arte: Dan Torres)

A segunda-feira, 14, demorou a terminar para a população LGBT+. A perda precoce do ativista trans Paulo Vaz, de 36 anos, deixou angustiantes nós em nossos corações e também questionamentos sobre qual comunidade estamos construindo. A causa da morte não foi divulgada. Mas é de conhecimento a onda de transfobia da qual ele foi vítima no dia anterior pelas redes sociais. E aqui não cabe a mim explicar a origem ou replicar tais comentários. Mas, sim, enfatizar que eles vieram na grande parte de homens cis gays. Infelizmente. 

Enquanto utilizamos a bandeira para nos proteger do mundo opressor, embaixo do tecido travamos outras batalhas, uns contra os outros. Durante esses cinco anos cobrindo pautas de diversidade, evitei dar destaque para esse preconceito. 

Mas diante dos últimos fatos, é urgente falar sobre. Não adianta cobrar e esperar mudança da sociedade se na nossa própria casa não existe respeito, acolhimento e empatia. Qual exemplo queremos ser ou dar quando usamos piadas para ofender um homem trans? E brincadeiras para desmoralizar mulheres trans e travestis? 

Não é por sermos LGBT+ que temos passe livre para a transfobia. 

Quando nós, homens cis gays, vamos reconhecer nossos privilégios dentro da sigla e usá-los a favor dos nossos que estão gritando socorro? Literalmente. 

Estima-se que 42% da população trans já tentou suicídio contra 4,6% da população em geral. E 85,7% dos homens trans já pensaram ou tentaram cometer o ato.

Enquanto muitos gays lutam pelo direito de amar, pessoas trans lutam para sobreviver. O amor, muitas vezes, nem está em pauta. É preciso descer do salto e olhar para a base da nossa pirâmide social: para os mais velhos que chamamos de mariconas; para os mais pobres; para as pessoas pretas; para as mulheres lésbicas; para as travestis e trans – estando elas nas ruas se prostituindo para comer ou nas faculdades à espera de um diploma que não será suficiente para amenizar o preconceito.

Gays sofrem. Todos os dias. A homofobia mata. A transfobia também mata. E humilha mesmo após a morte, com requintes de crueldade. Em lugares públicos, de dia ou à noite.  E não se trata aqui de comparar os dois crimes e, sim, de olhar para as estatísticas, para os noticiários. E para as vidas que se foram ou que deixamos ir. 

Vidas como a de Paulo, que mesmo com uma grande rede de apoio, se tornou difícil de suportar. A maioria das pessoas trans nem suporte tem. São expulsas de casa, da escola, do mercado de trabalho e até do seu – do seu mesmo – ciclo de amigos. E só falo com essa certeza porque já entrevistei muitas. De jovens a idosas: a história se repete. 

Que tal ouvi-las também?   

Alina Durso pediu: Por favor, acolham as travestis e pessoas trans do seu ciclo, podem ter certeza que elas precisam de você.
John Mesquita suplicou: precisamos construir um mundo onde pessoas trans queiram viver.
Caê Vasconcelos desabafou: a transfobia nos mata, nos executa, nos adoece, nos suicida.
Giovanna Heliodoro alertou: a internet nunca foi um ambiente seguro para pessoas trans. Nossa saúde mental sempre foi alvo do ódio, da dor e da transfobia de vocês pessoas cis.
Luca Scarpelli acordou exausto: remar contra a maré cansa, dói e tem se mostrado um trabalho sem fim e ineficaz.

Tantas outras pessoas trans choraram e lamentaram não só ontem. O que a gente está esperando?

Falta de espontaneidade

E por que o Vyni, do BBB22, no título do artigo? Vou responder usando um post do Pedro HMC, marido de Paulo Vaz que deveria ser abraçado de todas as formas possíveis. Mas também enfrenta o ódio gratuito nas redes sociais. Ele traduziu um tuíte do ativista Alexander Leon que viralizou. 

Alexander Leon
Reprodução: Põe na Roda

“Pessoas LGBT+ não crescem sendo elas mesmas. Crescem sacrificando e limitando suas espontaneidades para minimizar humilhações e preconceitos. Nosso maior desafio da vida adulta é escolher quais partes de nós são o que somos de verdade e quais criamos para nos proteger do mundo.” 

Difícil achar algum LGBT+ que não se identificasse. Mas quando temos um exemplo ao vivo 24 horas por dia dessa limitação da espontaneidade que nos é imposta, não só nos afastamos, como detestamos. Falta de espontaneidade essa que esteve no discurso de Tadeu Schmidt na eliminação de Vyni nesta terça-feira, 15.

Nessa mesma pirâmide que já citei, Vyni também está na parte debaixo: é pobre, negro, afeminado e está longe do padrões de beleza impostos pela nossa própria comunidade – e acreditem: é ainda mais cruel do que a da sociedade como um todo. 

Então o que resta para Vyni? O humor! Seja bom ou ruim, mas é onde ele encontra refúgio. “Mas não é natural!”. Mas é a arma que ele tem para não abaixar a cabeça, para superar os traumas e para ser aceito. Assim como você também criou ou deixou de lado algo. 

Afinal, somos essas pessoas animadas mesmo o tempo todo ou nos fazemos assim para sermos benquistos pelos olhares heteronormativos? 

Soa ‘engraçado’ quando ele diz que está solteiro há 23 anos por opção dos outros. Condenam, ridicularizam e riem da relação do Vyni com Eliezer. Com essa mesma força, vocês se questionam que talvez o Vyni nunca tenha sido amado de fato por um homem?

Também não somos carentes? Também não buscamos o amor das pessoas? E por que é tão difícil dar o nosso? 

Vyni vai precisar de apoio aqui fora. Os administradores já haviam alertado para a quantidade expressiva de ataques homofóbicos que ele vinha sofrendo nas redes. Comentários chegaram a ser bloqueados. Será que é só mesmo pelo jogo? Como foi dito em um pronunciamento da equipe, “todos têm direito de gostar ou não dele, mas homofobia é crime”. E pode punir inclusive nós, gays.  

Que o Brasil o receba de braços abertos.
Que Paulo descanse depois de 36 anos de batalhas diárias.
Que a comunidade LGBT+ não deixe as suas questões de autoestima e de rejeição afetarem os dupla ou triplamente vulneráveis.
Que a saúde mental não seja só um conteúdo de post compartilhado no Instagram.
Cuide muito bem da sua e, se não puder ajudar, não prejudique a do outro. 

*Chegou até aqui e está precisando de ajuda? O Acolhe LGBT+ é uma plataforma que conecta pessoas LGBT+ que precisam de acolhimento psicológico com profissionais que topem ajudá-las de forma voluntária. Clique para acessar.  
Yuri Alves Fernandes

Jornalista e roteirista do #Colabora especializado em pautas sobre Diversidade. Autor da série “LGBT+60: Corpos que Resistem”, vencedora do Prêmio Longevidade Bradesco e do Prêmio Cidadania em Respeito à Diversidade LGBT+. Fez parte da equipe ganhadora do Prêmio Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos, com a série “Sem direitos: o rosto da exclusão social no Brasil”. É coordenador de jornalismo do Canal Reload e diretor do podcast "DáUmReload", da Amazon Music. Já passou pelas redações do EGO, Bom Dia Brasil e do Fantástico. Por meio da comunicação humanizada, busca ecoar vozes de minorias sociais, sobretudo, da comunidade LGBT+.

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17 comentários “Paulo Vaz, Pedro HMC, Vyni e um apelo aos LGBT+: precisamos parar de nos odiar

  1. Éricles Souza disse:

    “Quando nós, homens cis gays, vamos reconhecer nossos privilégios dentro da sigla e usá-los a favor dos nossos que estão gritando socorro?”

    Até chegar o dia que vocês perceberem que nós gays não somos a Cruz Vermelha, que nós não somos obrigados a socorrer quem faz piada com a gente, quem diz que nos odiar é inevitável e faz piadas com lâmpada. Porque é justamente o seguimento ao qual você tanto defende que faz memes homofóbicos
    Você também falou que gays tem privilégios dentro da sigla. Ora, quais privilégios seriam esses? Ser mais reconhecido e mais divulgados? Isso pra mim são frutos da nossa própria luta, nós gays corremos atrás do que a gente queria. Não ficamos sentados esperando alguma coisa cair do céu, até porque o que cai do céu é chuva
    E também, se nós somos privilegiados porque pessoas trans dizem que lutaram pra nos dar direitos? Então, se formos seguir essa “lógica” nós só somos privilegiados é por causa deles, e eles não podem reclamar.

    Nós gays não somos responsáveis pelo suicídio do Paulo Vaz. O único responsável é quem deveria zelar pelo relacionamento que é o senhor Pedro HMC, que vazou o vídeo na internet

    • F. Araújo disse:

      Quanta falta de humanidade! Realmente vc não entende nada sobre o movimento LGBTQIAP+ e, não, não vou perder meu tempo explicando pra vc o que vc, viado, já deveria saber. É como diz uma frase que vi no Instagram mais cedo pela manhã: quem tem apenas aspirações individuais jamais entenderá uma luta coletiva.

  2. Lauro disse:

    O cara expõe o marido policial civil para toda a internet e colegas de trabalho enquanto chupa uma rola e ainda temos que ir com essa de que foi transfobia dos gays? Não importa que o relacionamento é aberto, uma coisa é tu fazer no teu ambiente intimo e outra é expor para o Brasil todo ver. Isso sem contar o alto indice de suicídio entre policiais, provavelmente o maior que tem. Tudo para tirar a culpa de cima dos proprios ombros, sendo ele provavelmente responsável por boa parte disso. Ou foi super coincidência o video do boquete e no outro dia o suicidio?

    • Alex disse:

      Concordo. Acho até um desrespeito com o Popo, um cara super bem resolvido com seu corpo e sua sexualidade, dizer que os haters tiveram tamanho poder sobre ele. Ele lidava com isso há anos e ajudava outras pessoas a lidar com isso. Triste tudo que está acontecendo

    • BBBManiaca disse:

      Uma coisa é.. quando isso aconteceu.. pessoas falarem PRO CARA que foi exposto que ele não é homem suficiente.. que nunca será… Sempre tem a galera que critica a vítima.. a pessoa exposta, a pessoa violentada.. esse é o problema.
      Pode ter certeza que o cara deve estar sentindo culpa suficiente.. mas fato que a internet é cruel e existem pessoas que se aproveitam do fato de serem anonimos para destilar

  3. JUNNO disse:

    `Pedro HMC, marido de Paulo Vaz, deveria ser abraçado de todas as formas possíveis` é piada né? Não dá mais pra justificar todo tipo de ato em cima da pauta gay! Tá faltando é caráter e responsabilidade afetiva! Lamentável essa situação

  4. Danilo Brito de Miranda disse:

    “Enquanto homem gays lutam pelo direito de amar, pessoas trans lutam pelo direito de viver”
    O que vc tem na cabeça? A homôfobia acabou e eu não sabia? Vc fala como se nós não fôssemos alvos de ataques todos os dias. Vc esqueceu em que país vivemos?

  5. Carlos Eduardo disse:

    Como assim ser abraçado de todas as formas? haha só pode estar de brincadeira, né?!

    O cara humilhou o marido em rede nacional fazendo sexo no instagram, imoral e promiscuo! Ele que foi responsável pela morte do marido, irresponsável, um muleque! Aliás, toda essa turminha do Poe da Roda não valem nada, um bando de gays nojentos e insuportáveis que deixaram a noite de São Paulo um lixo.

    Esse Pedro vai levar pelo resto da vida dele a culpa e o peso de ter contribuído pela morte do marido.
    Outra coisa, que texto horrível!

  6. Jim disse:

    Gostei do texto, principalmente a parte do Vinny!
    No entanto não acho Pedro HMC uma vítima… para mim ficou claro que o grande causador da humilhação em rede nacional do Paulo foi o tal vídeo. Que tenha sido divulgado por erro, que tenha sido um hacker, não importa… Ele vai ter que carregar isto consigo para sempre…

  7. Sofia disse:

    Eu sou mulher trans e não posso frequentar uma festa LGBT, é o ambiente em que sofro mais transfobia de todos os que já frequentei. Eu frequento uma festa hétero, sou muito bem-trada, faço novos amigos e amigas. Gays são as pessoas mais transfóbicas!

    • Daniel Silva disse:

      Amiga, em que mundo vc vive???
      Vc em festa hétero é apenas um animal de circo e chaveirinho de hétero pagando de descontruído. Imagino até os comentários dos héteros sobre vc, falando que nem parece que é trans ou fazendo piadinhas com sua genitália. E dessas festas hétero que vc foi, quantos caras héteros te pegaram na frente dos amigos cis e falaram que vc tem um pênis e está tudo bem pegar mulher trans?
      Quantos homens héteros aceitam andar de mãos dadas na rua com vc e te assumem como mulher trans para todos?
      Me poupe.

    • Observador disse:

      Há muita segmentação na chamada adversidade, o que a gente tem que aprender é “se posicionar”! Na sexta, estava com taxista que é filho de taxista, também, com quem estou tendo um romance! Pai dele ligou para convidar ele para o almoço e ele comentou que estava comigo, falei com ele também! Depois o filho dele disse três homens, em familia e sorriu! Maroto eu disse a ele, que pai dele é um homem maravilhoso!

  8. Marcus disse:

    Que vergonhoso esse título e matéria. Nojento como esse jornalista mente. Deve ter comprado o diploma de jornalista; não é possível. Mas nem deve ser só falta de profissionalismo, inclui mal caratismo mesmo.

    A homofobia acabou no Brasil e no mundo, por acaso? NÃO. Gays foram a maioria (51%) dos LGBT mortos em 2021, por assassinato, vítimas de homofobia/gayfobia, segundo dados do Grupo Gay da Bahia. Em muitos países, no Oriente Médio e África, por exemplo, gays são espancados e mortos, inclusive pelo Estado desses países.

    Aqui no Brasil, um casal gay andar de mãos dadas, corre risco de vida, e não é só nos interiores ou periferia. Há poucos anos um gay foi assassinado a facadas na Paulista por estar com o namorado de mãos dadas. Gays são expulsos de casa, assassinados pelas mães e pais, têm dificuldade de arrumar emprego, sofrem todo tipo de coação e violência, em todo lugar.
    Aí vem um carinha irresponsável falar de privilégio gay?

    Não podemos tolerar homofobia, mais incentivo de posso contra gays, calados. Chega de gayfobia!

  9. Daniel Silva disse:

    Vemos nos últimos ano o começo de uma crise no Facebook e redes sociais, com as pessoas encerrando perfis e saindo da internet.
    Quando a exposição trás algo que faça mal para a pessoa, melhor ela sair da internet.
    O comportamento das pessoas na internet não vai mudar. Mas temos a opção de nos expor ou não.

    Pedro HMC transformou o relacionamento dele em um caça likes e views para o canal decadente dele. O Paulo era conhecido como um homem trans, mas nem famoso era. Tinha o Insta e Twitter dele e nunca produziu conteúdo na internet. Depois que o Paulo começou o relacionamento com o Pedro, a transfobia que ele sofria aumentou.

    Pedro sem um pingo de noção e não sabemos o motivo, até o momento não explicou sobre o vídeo que levou o Paulo a fazer o que fez.

    Pedro desrespeitou o marido a todo momento com a exposição, e a gota d’agua foi postar um vídeo fazendo sexo oral em um homem cis, para o mundo inteiro ver. Paulo sempre sofreu transfobia, mas um dia depois do vídeo, chegou a tragédia.

    Transfobia deve ser combatida todos os dias. É algo terrível e merece todo o tipo de ação para minimizar. Mas também é necessário um debate sobre responsabilidade afetiva e os males que a exposição na internet pode trazer.
    A tragédia com o Paulo poderia ter sido evitada com menos exposição e sem aquele vídeo desrespeitoso. É muito sem noção jogar a culpa na comunidade e na transfobia no caso do Paulo.

    Que o Pedro saiba lidar e conviver com o que ele causou.

  10. Observador disse:

    Não percebo que o cis gay “atrapalhe” a Diversidade, mas ele “ensina” dosar afeto e atração, no que é um grande desafio da Sexualidade: A atração entre irmãos ou primos! Tenho um irmão gay afeminado e percebeu a forma mais amistosa de conversar entre um irmão nosso: casado e pai, comigo e já buscou varias vezes fazer intriga, entre ele e eu! Ou seja, por mais gostoso que seja um familiar, que se desenvolva a afeição do que desejá-lo como homem. Já o gay sexualiza em todos os contextos de relacionamento!

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