Só 5% dos países entregam novas metas climáticas à ONU no prazo

Apenas 10 das 197 nações signatárias do Acordo de Paris apresentaram o compromisso para reduzir suas emissões de gases de efeito estufa

Por Liana Melo | ODS 13 • Publicada em 11 de fevereiro de 2025 - 09:59 • Atualizada em 11 de fevereiro de 2025 - 10:04

Emissão de gases no complexo industrial da Thyssen, em Duisburg, Alemanha: só 10 de 197 países apresentaram novas climáticas no prazo estabelecido pela ONU (Foto: Ina FASSBENDER / AFP – 04/02/2021)

O Brasil foi um dos poucos países que entregou no prazo sua nova meta climática. Apenas dez das 197 nações signatárias do Acordo de Paris cumpriram a data estipulada no tratado e renovaram, na última segunda (10/02), seus planos nacionais de redução de gases de efeito estufa, entregando suas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs, na sigla em inglês) às Nações Unidas. O país dividiu a atenção com os Emirados Árabes, Uruguai, Suíça, Reino Unido, Nova Zelândia, Andorra, Equador, Santa Lúcia e os Estados Unidos, que apresentaram sua meta climática em 2024, antes, portanto, de o país anunciar a intenção de sair do Acordo de Paris — confirmando ou não essa decisão, é um consenso de que o governo Trump não cumprirá a meta de descarbonizar a economia americana, como se comprometeu seu antecessor, Joe Biden.

As metas apresentadas até agora são, em seu conjunto, tímidas e estão longe de serem compatíveis com a estabilização do aquecimento global em 1,5ºC

Claudio Angelo
coordenador de política internacional do Observatório do Clima

A baixa adesão dos países é um sinal claro de que “os ventos geopolíticos” não estão a favor, como resumiu Simon Stiell, a mais alta autoridade da ONU nas negociações climáticas, em visita ao Brasil na primeira semana de fevereiro. Pelo estabelecido, os países deviam entregar as novas metas climáticas nove meses antes da COP30, que marcará os 10 anos do Acordo de Paris, e começará em 10 de novembro em Belém. Em breve, a ONU deverá anunciar um novo prazo limite para a submissão das metas climáticas dos países; a expectativa é que venha a ser em setembro. Por outro lado, é uma demonstração de que os países não conseguiram superar as próprias dificuldades de ambição, como foi o caso, por exemplo, da União Europeia, que é um grande emissor e deveria ter sua NDC pronta e submetida no prazo, o que não ocorreu.

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Juntas, as NDCs deveriam reduzir em 57% as emissões de gases poluentes na atmosfera até 2035 e zerar as emissões líquidas até 2050 – um esforço para limitar o aquecimento global em 1,5ºC em relação aos níveis pré-industriais, o que ajudaria a reduzir a ocorrência de eventos extremos. “Só o estabelecimento de grandes metas de redução das emissões pode impedir o avanço da temperatura global”, analisou André Guimarães, diretor executivo do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), comentando que os principais emissores, como é o caso do Brasil, China, Rússia, Índia e a União Europeia, têm a obrigação de “aumentar a sua ambição”.

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Historicamente, o engajamento internacional não tem sido suficiente para garantir o equilíbrio climático. Se esse cenário não mudar, enfrentaremos graves consequências nos aspectos social, ambiental e econômico. Ambição é a palavra-chave para as NDCs que estão sendo discutidas neste ciclo

Paulo Moutinho
Doutor em Ecologia e pesquisador do Ipam

O Brasil foi um dos primeiros países, no rol dos 10 maiores emissores, a apresentar sua NDC no prazo. O país estabeleceu a meta de reduzir as emissões líquidas de gases de efeito estufa entre 59% e 67% até 2035, em comparação aos níveis de 2005, o que equivale a alcançar entre 850 milhões e 1,05 bilhão de toneladas de CO₂ equivalente em termos absolutos.

Para Claudio Angelo, coordenador de política internacional do Observatório do Clima, o que vai determinar se a meta brasileira é boa ou ruim será o Plano Clima, que nada mais é do que as diretrizes de implementação das NDCs internamente e como os setores econômicos vão atingir a meta estipulada pelo governo. “As metas apresentadas até agora são, em seu conjunto, tímidas e estão longe de serem compatíveis com a estabilização do aquecimento global em 1,5ºC”, analisa.

Seu colega Paulo Moutinho, pesquisador sênior do Ipam, complementou: “Historicamente, o engajamento internacional não tem sido suficiente para garantir o equilíbrio climático. Se esse cenário não mudar, enfrentaremos graves consequências nos aspectos social, ambiental e econômico. Ambição é a palavra-chave para as NDCs que estão sendo discutidas neste ciclo”.

A COP30 precisa ser um marco na redução de emissões. Já ultrapassamos o limite de 1,5ºC de temperatura média global, e esse número não é arbitrário: é um limite entre a sobrevivência de espécies e populações humanas. A falta de ambição nas metas tem intensificado eventos climáticos extremos, especialmente no Sul Global, afetando diretamente regiões como a Amazônia e suas populações tradicionais e indígenas

Patrícia Pinho
Bióloga e diretora-adjunta de Pesquisa do Ipam

Apesar de 95% dos países terem perdido o prazo, pelas regras da ONU, não haverá punição. A baixa adesão, no entanto, dá a medida dos obstáculos que deverão ser superados na Conferência do Clima, a COP30, em Belém (PA), em novembro próximo. Não bastasse o ano de 2024 ter sido o mais quente já registrado na série histórica, a saída dos Estados Unidos, responsável por 25% das emissões globais, do Acordo de Paris é mais um ingrediente para dificultar as negociações na COP30.

O anúncio da saída dos Estados Unidos, responsável por 25% das emissões mundiais, do Acordo de Paris impõe um novo cenário para o debate sobre o clima. “Grandes emissores, especialmente Brasil, China, Rússia, Índia e a União Europeia, eu diria que, obrigatoriamente, têm que aumentar a sua ambição”, frisou Guimarães.

No ano passado, durante a COP29, no Azerbaijão, o Brasil apresentou sua nova NDC, estabelecendo a meta de reduzir entre 59% e 67% das emissões líquidas de gases de efeito estufa até 2035, em relação aos níveis de 2005. Ainda que admita que a nova NDC brasileira é mais ambiciosa, não é suficiente. Como anfitrião da COP30 e líder global em questões climáticas, o Brasil deveria, defende, ir além. “Há espaço para metas ainda mais ousadas, especialmente com a redução do desmatamento, que é responsável por cerca de 50% das emissões brasileiras”.

“A COP30 precisa ser um marco na redução de emissões. Já ultrapassamos o limite de 1,5ºC de temperatura média global, e esse número não é arbitrário: é um limite entre a sobrevivência de espécies e populações humanas. A falta de ambição nas metas tem intensificado eventos climáticos extremos, especialmente no Sul Global, afetando diretamente regiões como a Amazônia e suas populações tradicionais e indígenas”, concluiu a bióloga Patrícia Pinho, diretora adjunta de pesquisa do Ipam.

 

Liana Melo

Formada em Jornalismo pela Escola de Comunicação da UFRJ. Especializada em Economia e Meio Ambiente, trabalhou nos jornais “Folha de S.Paulo”, “O Globo”, “Jornal do Brasil”, “O Dia” e na revista “IstoÉ”. Ganhou o 5º Prêmio Imprensa Embratel com a série de reportagens “Máfia dos fiscais”, publicada pela “IstoÉ”. Tem MBA em Responsabilidade Social e Terceiro Setor pela Faculdade de Economia da UFRJ. Foi editora do “Blog Verde”, sobre notícias ambientais no jornal “O Globo”, e da revista “Amanhã”, no mesmo jornal – uma publicação semanal sobre sustentabilidade. Atualmente é repórter e editora do Projeto #Colabora.

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