O ano de 2021 registrou um aumento de 75% das emissões de gases de efeito estufa (GEE) em relação ao total emitido pelo parque termelétrico fóssil do Sistema Interligado Nacional em 2020, de acordo com dados do “2º Inventário de emissões atmosféricas em usinas termelétricas”, estudo publicado nesta quinta-feira (15/12) pelo Instituto de Energia e Meio Ambiente (Iema). Com esse crescimento, a participação de fontes fósseis para geração de eletricidade no Brasil passou de 15%, em 2020, para 20%, em 2021.
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As 82 usinas movidas a combustíveis fósseis listadas no estudo do Iema emitiram 55,6 milhões de toneladas de dióxido de carbono equivalente (CO2e). “O crescimento foi alto devido à crise hídrica de 2021, que prejudicou a geração hidrelétrica e fez o setor elétrico brasileiro acionar ainda mais as termelétricas emissoras”, lembrou a pesquisadora Raissa Gomes, uma das autoras do inventário. “Independentemente de crises hídricas, o aumento de emissões é uma tendência que deve continuar, pois cada vez mais termelétricas entram na matriz elétrica brasileira”, destacou o engenheiro Felipe Barcellos e Silva, analista do Iema e coautor do trabalho.
O estudo inventaria termelétricas de serviço público e autoprodutoras – acopladas a indústrias para suprirem essencialmente suas próprias demandas por eletricidade – que disponibilizaram energia ao Sistema Interligado Nacional (SIN) nos anos de 2020 e 2021, excluindo as plantas movidas a combustíveis renováveis e as unidades para as quais não foi possível identificar os combustíveis empregados.
As emissões de gases de efeito estufa são o fator principal para o aquecimento global e a crise climática. “Além das emissões de gases de efeito estufa, a geração termelétrica fóssil resulta em uma série de outros problemas ambientais, como estresse hídrico por conta da utilização de água para resfriamento de sistemas, poluição atmosférica local ou competição no despacho de energia com fontes renováveis. Ademais, essa categoria de geração contribui significativamente para o encarecimento das contas de eletricidade”, destaca o estudo do Iema.
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Veja o que já enviamosNo inventário, os pesquisadores lembram que, desde o início dos anos 2000, a matriz elétrica brasileira passa por uma transição em que a expansão da capacidade instalada e da geração hidrelétricas dá lugar a uma crescente diversificação das fontes de geração. “Se, por um lado, observa-se uma ampliação marcante das fontes biomassa, eólica e solar, verifica-se, por outro, a expansão do uso de combustíveis fósseis para geração de eletricidade. Essa geração aumentou de 30,6 TWh em 2000 para 133,8 TWh em 2021, mais que o quádruplo”, aponta o documento.
Ao todo, foram gerados 95,8 TWh de eletricidade por estas usinas em 2021, dos quais 68,9 TWh foram produzidos a partir do gás natural (44 plantas), o que corresponde a 72% do total. O carvão mineral (oito plantas), segunda fonte com maior participação, foi responsável pela geração de 16,5 TWh, o que representa 17% da produção de eletricidade fóssil; o óleo combustível (18 plantas) e o óleo diesel (11 plantas), derivados de petróleo, tiveram participação de 9% e 2%, respectivamente. “O fator de capacidade, ou seja, o quanto uma usina permanece operando no ano, era de aproximadamente 31% em 2020 e, agora, a média foi para cerca de 50%”, explicou a pesquisadora Helen Sousa, que também participou do estudo, destacando que isso significa que que, em geral, as usinas passaram a ser ligadas por mais tempo.
O inventário indica que apenas 13 usinas emitiram praticamente metade (51%) dos gases de efeito estufa (GEE), oito movidas a carvão mineral como combustível principal e outras cinco a gás natural. Quase a totalidade do CO2e (90%) foi proveniente de 41 plantas, o que representa metade das usinas fósseis do SIN. A usina Porto do Pecém I (CE) aparece no ranking como a que mais emitiu no país em 2021. Movida a carvão mineral, combustível altamente emissor de GEE, ela dobrou sua geração em relação a 2020.
De acordo com o levantamento, as oito usinas termelétricas brasileiras com as maiores taxas de emissão de GEE por cada GWh produzido são Candiota III (RS), Pampa Sul (RS), Jorge Lacerda I e II (SC), Jorge Lacerda III (SC), Porto do Pecém I (CE), Jorge Lacerda IV (SC), Porto do Itaqui (MA) e Porto do Pecém II (CE) – todas elas movidas a carvão, a fonte mais poluidora.
O inventário aponta ainda que, sobre os estados mais geradores, o Rio de Janeiro se destaca por ter produzido sozinho 28% de toda geração termelétrica fóssil ligada ao SIN, tendo gerado 27,0 TWh – o dobro do produzido por esse estado em 2020. Os cinco municípios com as maiores emissões – somando, juntos, 41% de toda geração – foram Macaé (RJ), Santo Antônio dos Lopes (MA), Manaus (AM), São Gonçalo do Amarante (CE) e Duque de Caxias (RJ). Ao todo, a geração termelétrica fóssil injetada no SIN foi produzida em 49 municípios.
Os pesquisadores do Iema alertam que, apesar de o cenário de crescimento refletir um momento teoricamente atípico na geração hidrelétrica, há um aumento consistente na utilização de termeletricidade fóssil a partir da década de 2010. Mas consideram que é possível expandir a geração de eletricidade no Brasil sem inaugurar novas termelétricas, com um gerenciamento adequado dos recursos naturais e das fontes renováveis disponíveis. “O contexto atual do setor elétrico apresenta elevados riscos para seus planos de descarbonização rumo a uma matriz 100% renovável, bem como para a melhoria da qualidade do ar no país”, aponta o estudo.
O professor André Luis Ferreira, diretor-presidente do Iema, lembrou ainda, no lançamento do “2º Inventário de emissões atmosféricas em usinas termelétricas” que a elaboração deste levantamento de emissões de fontes poluidoras no Brasil constitui ainda um enorme desafio. “O acesso público a informações ambientais confiáveis não é facilitado pela maior parte das empresas e, além disso, o poder público raramente tem as condições técnicas, instrumentais e políticas para fazê-lo”, afirmou. “No caso específico deste inventário de usinas termelétricas, o grande esforço de coleta de dados realizado pela equipe do IEMA para viabilizá-lo com a qualidade necessária mostra que ainda há um longo caminho a percorrer, tanto para uma efetiva gestão ambiental por parte do poder público quanto para a implementação de práticas transparentes e consistentes de Governança Ambiental, Social e Corporativa (ESG) por parte das empresas do setor elétrico”.