Em Dourados, docentes da Faculdade Intercultural Indígena (FAIND) da UFGD, cientes do cenário vulnerável em que se encontra a grande população indígena do Cone Sul de Mato Grosso do Sul, se uniram a professores da educação básica nas aldeias e desenvolveram um material escrito em guarani e kaiowá, contendo todas as informações necessárias sobre a epidemia – desde a contextualização sobre o vírus até a prevenção e o atendimento na rede pública de saúde.
Um dos responsáveis pela publicação, o professor Neimar Machado de Souza, da FAIND, conta que houve solicitação por parte dos educadores indígenas das escolas de Dourados pela parceria: o resultado foi a elaboração de uma cartilha de 20 páginas, colorida e ilustrada, intitulada “Koronavíru”. O docente, doutor em Educação, explica que, primeiramente, foi realizada uma conversa entre os professores indígenas e os integrantes mais velhos da comunidade, para que fossem explicados o que é a covid-19 e quais os cuidados vêm sendo recomendados pelas autoridades de saúde. Em seguida, os mais idosos contribuíram retratando as orientações na língua guarani, de acordo com o vocabulário e as expressões coloquiais.
Gostando do conteúdo? Nossas notícias também podem chegar no seu e-mail.
Veja o que já enviamosAlém das orientações sanitárias indicadas pelas autoridades mundiais de saúde, como distanciamento social, assepsia das mãos, etiqueta respiratória, cuidados com a higiene, entre outras possíveis de serem seguidas nas aldeias – já que parte dessa população não dispõe sequer de acesso à água – os pesquisadores abordaram na cartilha os aspectos ritualísticos tradicionais, muito presentes na rotina dos povos indígenas e essenciais para a garantia da preservação de suas etnias. “Após essa primeira fase, os professores indígenas passaram a dialogar com os mais velhos também sobre os cuidados tradicionais de saúde aplicados na aldeia em casos de quadros gripais e insuficiência respiratória, características da covid-19, além de registrar suas concepções sobre o adoecimento”, relata o professor Neimar.
Ele enfatiza que as comunidades indígenas tradicionalmente fazem o uso regular de plantas medicinais na prevenção ao adoecimento e também vêm empregando algumas delas durante a pandemia. “É importante reforçar que as plantas são utilizadas em rituais, seguindo um modo de preparo adequado, sob orientação de anciãos e especialistas indígenas”, afirma.
Por enquanto, a cartilha vem sendo distribuída virtualmente, por meio de redes sociais e aplicativos de mensagens, difundida pelos professores das escolas indígenas a seus alunos, familiares e amigos, uma verdadeira rede de comunicação: hoje, a educação indígena no município conta com sete escolas municipais que atendem aproximadamente 3,6 mil alunos, e uma escola estadual com mais de 400 estudantes indígenas, num total de 260 professores e 300 funcionários administrativos.
Leia todas as reportagens da série #100diasdebalbúrdiafederal
“A divulgação impressa é mais onerosa. Solicitamos orçamento e aguardamos a resposta de apoiadores. Também pretendemos difundir as informações via rádios comunitárias e carros de som dentro das aldeias, pois alguns moradores não são alfabetizados. Já temos o levantamento destes custos e quem desejar apoiar as atividades como voluntário será muito bem-vindo”, afirma o professor da UFGD, que recentemente teve o projeto selecionado em edital do Comitê Operativo de Emergência (COE) da Universidade, iniciativa que prevê auxílio financeiro para as ações de enfrentamento à covid-19.
Parceria antiga entre academia e indígenas
Coordenadora do Setor de Educação Escolar Indígena da Secretaria Municipal de Educação (Semed) de Dourados, a professora Teodora de Souza participou da elaboração do material e garante que a cartilha será muito útil para todas as idades e contextos, por ser de fácil leitura e compreensão das imagens. Atualmente, a população indígena na cidade é de cerca de 16 mil pessoas, grande parte vivendo nas aldeias Jaguapiru e Bororó. Metade dessa comunidade é formada por adultos e idosos, estes últimos, integrantes do grupo de risco mais impactado pela covid-19.
A professora Teodora explica que a UFGD vem trabalhando com as comunidades indígenas quase desde sua criação, em 2005. “A Universidade já é parceira da educação escolar indígena no que tange às formações continuadas para professores, desde 2013, por meio da FAIND. Recentemente, também forneceu máscaras, luvas e 100 litros de álcool para a Sesai em Dourados, para ajudar os postos de saúde das aldeias. Essa parceria é muito importante, pois os profissionais da UFGD envolvidos no processo de prevenção e solidariedade, além de contribuírem com a população indígena, que é mais vulnerável, protegem também a sociedade não-índia”, diz a coordenadora da Semed, que é da etnia Guarani, moradora na aldeia Jaguapiru e falante da língua nativa.
Além de profissionais da UFGD, participaram da elaboração da cartilha professores indígenas e não-indígenas da Semed e do Setor de Educação Escolar Indígena de Dourados. O material está disponível para quem quiser veicular online e também imprimir e divulgar por conta própria (o arquivo está ao fim da matéria).
De acordo com o professor Neimar, alguns órgãos externos ao município já demonstraram interesse em expandir a distribuição da cartilha para outras aldeias do Cone Sul, como a Prefeitura de Ponta Porã e a Agência de Desenvolvimento Agrário e Extensão Rural (Agraer), que farão a divulgação nas comunidades Lima Campo e Kokue’i. Também a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) – Polo Dourados e a Fundação Nacional do Índio (Funai) já dispõem de arquivo do material.
Em curto prazo, o docente diz que a ideia é realizar a cartilha também na língua terena, para a qual está em busca de tradutores, já que a macrorregião da Grande Dourados conta com expressiva população dessa etnia. Ainda, há o planejamento para a elaboração de um folder com o resumo das orientações de combate à pandemia, um gibi voltado ao público infantil e um vídeo informativo.
[g1_quote author_description_format=”%link%” align=”none” size=”s” style=”solid” template=”01″]A série #100diasdebalbúrdiafederal terminou, mas o #Colabora vai continuar publicando reportagens para deixar sempre bem claro que pesquisa não é balbúrdia.
[/g1_quote]
Boa tarde! Realizo um trabalho com os Guarani Nhandewa no interior de SP, e gostaria muito de ter acesso à Cartilha aqui comentada, porém, o link de acesso está dando erro! Como posso prosseguir? Ha’evete!
Bom dia,sou pedagoga na áldeía tekohà Y”Hovy,em Guaíra Paraná. gostaria de orientação para trabalhar um projeto com meus alunos índígenas,maíoria adolescentes