Quem mandou matar Marielle? – um dia de cobrança pela resposta

A cantora Luedji Luna no palco do Festival Justiça para Marielle e Ânderson: artistas também cobraram respostas para a pergunta ‘Quem mandou matar Marielle?’ (Foto: Divulgação / Instituto Marielle Franco)

Atos no Rio de Janeiro e em todo o Brasil lembram cinco anos do assassinato de vereadora e motorista e exigem justiça

Por Oscar Valporto | ODS 16 • Publicada em 14 de março de 2023 - 16:41 • Atualizada em 25 de novembro de 2023 - 14:06

A cantora Luedji Luna no palco do Festival Justiça para Marielle e Ânderson: artistas também cobraram respostas para a pergunta ‘Quem mandou matar Marielle?’ (Foto: Divulgação / Instituto Marielle Franco)

O assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes completou cinco anos nesta terça-feira (14) ainda sem respostas sobre os mandantes do crime. Estão presos o policial militar reformado Ronnie Lessa, acusado de ter feito os disparos que mataram a vereadora e o motorista, e o ex-policial militar Elcio de Queiroz, acusado de dirigir o carro usado na execução. Os acusados do crime nunca revelaram quem foram os mandantes do atentado contra Marielle Franco. A resposta a esta pergunta – Quem mandou matar Marielle? – foi a principal cobrança dos atos que lembraram os cinco anos do crime no Rio de Janeiro e em outras capitais.

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A família de Marielle participou dos atos para exigir Justiça e cobrar respostas. “As autoridades têm a obrigação de solucionar esse crime. Minha mãe deve ser lembrada pela sua mobilização da dignidade e contra as injustiças, não por um crime sem respostas”, afirma Luyara Santos, filha de Marielle Franco, hoje com 24 anos. “Hoje é o dia de reforçar nosso compromisso de estado por memória, justiça, verdade e reparação. Sigo lutando por você, Mari, e por todo corpo negro que já tombou. Saber quem mandou matar Marielle é um dever da democracia”, escreveu Anielle Franco, irmã de Marielle e hoje ministra da Igualdade Racial.

No Rio de Janeiro, o dia de homenagens começou com ato em frente à Câmara Municipal, reunindo parlamentares do Psol: uma faixa com a pergunta “Quem mandou matar Marielle?” foi estendida na fachada do Palácio Pedro Ernesto. “Um tempo desse, de 5 anos, para um assassinato como esse, é mais do que muito tempo. É um tempo que viola os direitos humanos, que viola não só a memória da Marielle, mas também tudo o que ela representa. A nossa luta é por justiça para que isso nunca mais aconteça”, disse Mônica Benício, viúva de Marielle, hoje vereadora pelo Psol, durante o ato. “Espero que, daqui a um ano, a pergunta não seja mais “quem mandou matar Marielle” e a gente possa apenas honrar e celebrar sua memória”, acrescentou.

A filha de Marielle, Luyara, os pais, Antonio e Marinete, e Monica Benício na missa pelos cincos anos da morte: esperança de solução para o crime (Foto: Tânia Rego / Agência Brasil)
A filha de Marielle, Luyara, os pais, Antonio e Marinete, e Monica Benício na missa pelos cincos anos da morte: esperança de solução para o crime (Foto: Tânia Rego / Agência Brasil)

Os militantes seguiram para a missa celebrada em memória dos cinco anos do assassinato de Marielle e Ânderson no Centro do Rio com a presença de parentes e amigos. “Temos que manter esperança sempre. Estamos há meia década pedindo justiça e não vamos desanimar agora”, disse Marinete da Silva, mãe de Marielle, após a missa que acompanhou ao lado do marido, Antônio, da neta Luyara e de Mônica Benício.

No MAR (Museu de Arte do Rio de Janeiro) foi inaugurada uma estátua da vereadora Marielle Franco, doação do artista Paulo Nazareth para o Instituto Marielle Franco. A instalação tem 11 metros de altura e ficará exposta até o fim do mês. “É o tamanho que a Marielle se tornou, uma gigante. É fundamental que não só seja gigante para a gente, mas gigante na memória, no legado”, disse Marinete da Silva, mãe da vereadora.

No vizinho Museu do Amanhã, na Praça Mauá, foi feita uma ativação, em parceria com o Instituto Marielle Franco, com o objetivo de divulgar o projeto A Voz de Marielle, em que são usadas ferramentas de reconhecimento facial para conectar imagens de Marielle – físicas ou digitais, ilustrações, grafites ou fotografias – a trechos de seus discursos. Até 30 de abril, o Museu do Amanhã terá um totem interativo para oferecer aos visitantes a possibilidade de acessar a plataforma em seus próprios celulares.

Escultura gigante de Marielle Franco no Museu de Arte do Rio: dia de cobrança por respostas sobre quem mandou matar a vereadora (Foto: Oscar Valporto)

Na mesma praça, foi realizado, à noite, o Festival Justiça para Marielle e Anderson, com a participação de Marcelo D2, Criolo, Marina Íris, Luedji Luna, Criolo, bateria da Mangueira, Orquestra Maré do Amanhã e outros artistas. Os parentes de Marielle e Ânderson também estiveram presentes – inclusive Anielle, que veio da capital.

Em Brasília, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e ministros reunidos no Palácio do Planalto para balanço dos 100 dias de governo, fizeram um minuto de silêncio em homenagem a Marielle Franco. “Hoje, ao lado da companheira Anielle Franco, reforcei o compromisso já firmado pelo ministro Flávio Dino de somarmos todos os esforços para descobrirmos quem mandou matar Marielle Franco. #JustiçaPorMarielleEAnderson”, escreveu Lula no Twitter em que também divulgou o vídeo da homenagem.

Em, pelo menos, 19 capitais houve manifestações pedindo o esclarecimento definitivo do assassinato de Marielle e Ânderson. Em São Paulo, o ato foi em frente à sede da Polícia Federal onde mulheres levaram placas com o nome da vereadora. “Justiça para Marielle e Ânderson”, “Cinco anos é tempo demais” e Marielle vive” eram os dizeres de faixas estendidas em viadutos de Belo Horizonte, Salvador, Recife, Natal e Brasília.

Ato em frente à Câmara Municipal do Rio lembra os cinco anos do assassinato da vereadora e do motorista: “Quem mandou matar Marielle” (Foto: Psol)

Crime e prisões: faltam os mandantes

No dia 14 de março de 2018, Marielle Franco, vereadora pelo Psol no Rio de Janeiro e ativista dos Direitos Humanos, estava num carro, conduzido por Anderson, que foi alvejado por 13 tiros no Estácio, área central do Rio. Marielle, a quinta vereadora mais votada nas eleições municipais de 2016, tinha acabado de sair de uma roda de conversa com mulheres pretas e seguia para sua casa na Tijuca: ela levou quatro tiros na cabeça. O motorista Anderson Pedro Mathias Gomes levou ao menos três tiros nas costas.

Nas redes sociais, Marielle se definia como “mulher negra, cria da Maré e defensora dos Direitos Humanos”. A militância começou na juventude de maneira traumática: estava cursando o pré-vestibular comunitário do Complexo de Favelas Maré, na Zona Norte do Rio quando uma amiga, que acabara de ser aprovada na universidade foi morta por uma bala perdida, durante tiroteio entre policiais e traficantes na comunidade. De alguma maneira, sua irmã, a jornalista Anielle Franco, repetiu o caminho. Foi a assassinato de Marielle que a levou a militância pelos direitos humanos e, particularmente, das mulheres negras: fundadora do Instituto Marielle Franco, Anielle é hoje ministra da Igualdade Racial no Governo Lula.

Marielle Franco cursou Ciências Sociais na PUC-Rio, com bolsa integral, começou a atuar na ONG Redes da Maré, com foco nas áreas de segurança pública e direitos humanos, até ser chamada para trabalhar com o então deputado estadual Marcelo Freixo, na Comissão de Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj). Freixo ganhou notoriedade no combate às milícias. Marielle atuava como ligação entre grupos de mulheres e

Com ajuda de câmeras de segurança, a Polícia Civil conseguiu rastrear o carro usado no crime: em 12 de março de 2019, os policiais prenderam o ex-PM Ronnie Lessa, acusado de ser o autor dos disparos, e o PM reformado Élcio, apontado como motorista do automóvel usado no crime. Os dois vão a júri popular em data ainda não marcada pelo Tribunal de Justiça do Rio.

Para organizar as demandas jurídicas e políticas do processo de elucidação do atentado, foi criado, em 14 de julho de 2021, o Comitê Justiça por Marielle e Anderson, formado por familiares das duas vítimas, Anistia Internacional Brasil, Justiça Global, Coalizão Negra por Direitos e Terra de Direitos. Uma semana atrás, Antônio e Marinete da Silva, pais de Marielle; Luyara Franco, filha da vereadora; e Ágatha Reis, viúva de Anderson, estiveram na reunião com os promotores responsáveis pelo caso no Ministério Público, incluindo o procurador Luciano Lessa Gonçalves dos Santos, chefe Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) e coordenador da força-tarefa montada no MP/RJ. “É meia década de espera, de dores, de incertezas, de perguntas. A gente precisa de uma resposta mais concreta depois de tanto tempo esperando”, disse Marinete após a reunião.

Há duas semanas, o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) determinou abertura de inquérito da Polícia Federal (PF) também para investigar o assassinato. o ministro Flávio Dino afirmou que há um esforço máximo para ajudar nos esclarecimentos. “A fim de ampliar a colaboração federal com as investigações sobre a organização criminosa que perpetrou os homicídios de Marielle e Anderson, determinei a instauração de Inquérito na Polícia Federal. Estamos fazendo o máximo para ajudar a esclarecer tais crimes”, escreveu o ministro em sua conta no Twitter.

Oscar Valporto

Oscar Valporto é carioca e jornalista – carioca de mar e bar, de samba e futebol; jornalista, desde 1981, no Jornal do Brasil, O Globo, O Dia, no Governo do Rio, no Viva Rio, no Comitê Olímpico Brasileiro. Voltou ao Rio, em 2016, após oito anos no Correio* (Salvador, Bahia), onde foi editor executivo e editor-chefe. Contribui com o #Colabora desde sua fundação e, desde 2019, é um dos editores do site onde também pública as crônicas #RioéRua, sobre suas andanças pela cidade

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