Políticos do Rio são presos pelo assassinato de Marielle Franco

Os irmãos Chiquinho (deputado federal e ex-vereador) e Domingos (conselheiro do Tribunal de Contas e ex-deputado estadual) Brazão são acusados de serem mandantes do crime

Por #Colabora | ODS 16 • Publicada em 24 de março de 2024 - 12:06 • Atualizada em 29 de março de 2024 - 13:41

Cobrança de justiça por Marielle Franco exibida em prédio do Rio: seis anos depois, polícia prende irmãos Domingos e Chiquinho Brazão, políticos do Rio, como mandantes do atentado que vitimou a parlamentar e o motorista Ânderson (Foto: Mauro Pimentel/AFP – 18/08/2020)

Os irmãos Domingos Brazão – conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio e ex-deputado estadual e Chiquinho Brazão (deputado federal e ex-vereador), além do delegado Rivaldo Barbosa, foram presos neste domingo (24/03) apontados como mandantes do atentado contra a vereadora Marielle Franco, que vitimou também o motorista Anderson Gomes. O crime ocorreu em março de 2018. Os três foram presos no Rio de Janeiro, de forma preventiva, na Operação Murder, Inc., deflagrada pela Procuradoria-Geral da República (PGR), Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) e Polícia Federal (PF).

A família Brazão é um projeto político no Rio de Janeiro. Tem vereador, deputado estadual, deputado federal, membro do Tribunal de Contas. E indica cargos nos governos. A operação da Polícia Federal hoje vai nos ajudar a entender a relação de crime e política desse projeto, é uma investigação fundamental para entendermos o tamanho do buraco que está o Rio

Marcelo Freixo
Ex-deputado e presidente da Embratur

Os nomes dos três presos na operação constam da delação de Ronnie Lessa, executor do crime em que Marielle Franco perdeu a vida. De acordo com Lessa, os três detidos teriam sido os mandantes do crime. A ação foi autorizada pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).

A família Brazão pertence a um importante grupo político do estado do Rio de Janeiro. Ex-deputado na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), Domingos é conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ), cargo do qual ficou afastado depois de ser preso, em 2017, na Operação Quinto do Ouro, acusado de receber propina de empresários. Essa prisão se deu no âmbito de desdobramento da Lava Jato no estado.

Domingos Brazão recebe cumprimentos na Assembleia Legislativa após ser eleito conselheiro do TCE: principal liderança política da família é acusado de ser o mandante do assassinato de Marielle Franco (Foto: Alerj - 28/04/2015)
Domingos Brazão recebe cumprimentos na Assembleia Legislativa após ser eleito conselheiro do TCE: principal liderança política da família é acusado de ser o mandante do assassinato de Marielle Franco (Foto: Alerj – 28/04/2015)

O irmão de Domingos, Chiquinho Brazão, é deputado federal pelo União Brasil, além de foi empresário e comerciante. Nas eleições de 2018, foi candidato a deputado federal pelo Avante e elegeu-se com 25.817 votos.

Hoje é um dia histórico para a democracia brasileira e um passo importante na busca por justiça no caso de Marielle e Anderson. São mais de 6 anos esperando respostas

Anielle Franco
Ministra da Igualdade Racial e irmã de Marielle

Já o delegado Rivaldo Barbosa era chefe da Polícia Civil à época do atentado contra Marielle Franco. Atualmente, desempenha a função de coordenador de Comunicações e Operações Policiais da instituição. Os três já foram levados para a Superintendência da Polícia Federal, no Rio de Janeiro. Também foram os alvos da operação deste domingo, o delegado Giniton Lages, titular da Delegacia de Homicídios à época do atentado e o primeiro a investigá-lo, o policial Marcos Antônio de Barros Pinto, um de seus principais subordinados, e Erika Almeida Araújo, mulher do delegado Rivaldo.

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A operação de hoje engloba ainda 12 mandados de busca e apreensão na sede da Polícia Civil do Rio e no Tribunal de Contas do Estado. Documentos, além de celulares e computadores dos presos, foram levados para a sede da PFRJ. As investigações apontam que a morte de Marielle está relacionada à expansão da milícia no Rio de Janeiro.

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Domingos Brazão disse, em entrevista ao UOL em janeiro deste ano, que não conhecia e não lembrava da vereadora Marielle Franco. Já Chiquinho Brazão havia divulgado nota no dia 20 de março, depois que a acusação de ser o mandante vazou na imprensa. A nota diz que ele estava “surpreendido pelas especulações” e afirmou que o convívio com Marielle sempre foi “amistoso e cordial”.

Chiquinho Brazão discursa na tribuna da Câmara: deputado federal foi vereador no Rio na mesma época de Marielle (Foto: Câmara dos Deputados)

Os irmãos Brazão e o delegado Rivaldo foram transferidos ainda no domingo para uma penitenciária em Brasília, de onde serão levados para outras cadeias onde aguardarão a decisão da Justiça. De acordo com a Polícia Federal, a principal motivação do assassinato da vereadora Marielle Franco envolve a disputa em torno da regularização de territórios no Rio de Janeiro. “A motivação tem que ser analisada no contexto. O que há são várias situações que envolvem a vereadora Marielle Franco, que levaram a esse grupo de oposição, que envolve também a questão ligada a milícias, disputa de territórios, regularização de empreendimentos. Há seis anos, havia um cenário e culminou nessa disputa”, disse o o diretor-geral da PF, Andrei Rodrigues.

Relação entre crime e política

O ex-deputado Marcelo Freixo, com quem Marielle trabalhou na Assembleia Legislativa quando ele conduzia a CPI das Milícias, lembrou a trajetória de Domingos e Chiquinho Brazão. “A família Brazão é um projeto político no Rio de Janeiro. Tem vereador, deputado estadual, deputado federal, membro do Tribunal de Contas. E indica cargos nos governos. A operação da Polícia Federal hoje vai nos ajudar a entender a relação de crime e política desse projeto, é uma investigação fundamental para entendermos o tamanho do buraco que está o Rio”, afirmou o ex-deputado federal e estadual, agora presidente da Embratur.

Nas redes sociais, Freixo destacou como “escandaloso” a participação do Rivaldo Barbosa, então chefe da Polícia Civil, que teria garantido aos irmãos Brazão, na véspera do crime, que as investigações não iam andar. “O relatório da CPI das Milícias tem 16 anos, mas ainda é muito importante porque indica caminhos. Não adianta só prender, precisa ir na estrutura do poder. Se a economia do crime for viável, e eles mantiverem o controle econômico e eleitoral sobre territórios, você prende hoje e amanhã tem um novo líder. Para vencer esse sistema precisamos ter Governo Federal e Estado do Rio juntos atuando para desmontar essa estrutura criminosa. Não dá mais para ter um governo que seja representante das milícias”, escreveu Freixo no twitter, lembrando que Rivaldo Barbosa era o chefe da Polícia Civil, indicado pelo general Braga Netto, na época interventor na segurança do Rio.

Marielle Franco no carnaval de 2018 em campanha contra assédio às mulheres: defensora dos direitos humanos e da população mais vulnerável (Foto: Carla Lencastre 14/02/2018)

A ministra Anielle Franco, irmã de Marielle, também foi às redes sociais. “Neste Domingo de Ramos (24), dia de celebrar nossa fé, a luta por justiça, e na liturgia o domingo que antecede a Páscoa sobre recomeços e ressurreição, acordamos com a notícia da operação conjunta da Procuradoria Geral da República, Ministério Público do Rio de Janeiro e da Polícia Federal. Hoje é um dia histórico para a democracia brasileira e um passo importante na busca por justiça no caso de Marielle e Anderson. São mais de 6 anos esperando respostas sobre quem mandou matar Marielle e o por quê?”, escreveu a ministra da Igualdade Racial do Governo Lula.

Saber que o homem que nos abraçou, prestou solidariedade e sorriu tem envolvimento nesse mando é para nós entender que a Polícia Civil não foi só negligente. Não foi só por uma falha que chegamos a seis anos de dor, mas também pela polícia ter sido conivente. A Polícia Civil não apenas errou; foi cúmplice

Mônica Benício
Vereadora e viúva de Marielle

Anielle lembrou que a irmã era uma vereadora eleita com mais de 46 mil votos no Rio de Janeiro e tinha uma atuação voltada à garantia de direitos para a população fluminense e melhoria das condições de vida de toda a cidade. “A resolução do caso é central para nós, da família de Marielle Franco, mas não apenas. Hoje, falamos da importância desta resposta para todo o Brasil, os eleitores de Marielle, para defensoras e defensores de direitos humanos e para a população mais vulnerabilizada desse país”, disse.

A ministra da Igualdade Racial lembrou que até o momento ninguém foi julgado pelo crime, entre os apontados como executores e mandantes. “Todas as prisões são preventivas e ainda há muita coisa a ser investigada e elucidada, principalmente sobre o esclarecimento das motivações de um crime tão cruel como esse. Mas, os esforços coordenados das autoridades são uma centelha de esperança para nós familiares”, afirmou Anielle. “Agora aguardamos o resultado da condução da investigação e a eventual denúncia dos mandantes e de todos os responsáveis pelas obstruções da justiça”, acrescentou.

Viúva Marielle Franco, Monica Benicio – hoje ela mesma vereadora no Rio pelo Psol – disse que não esperava pelo nome do delegado Rivaldo Barbosa, ex-chefe da Polícia do Rio, entre os acusados do assassinato. “Saber que o homem que nos abraçou, prestou solidariedade e sorriu tem envolvimento nesse mando é para nós entender que a Polícia Civil não foi só negligente. Não foi só por uma falha que chegamos a seis anos de dor, mas também pela polícia ter sido conivente. A Polícia Civil não apenas errou; foi cúmplice”, afirmou em entrevista coletiva.

Ágatha Amaus, viúva de Anderson Gomes, motorista de Marielle Franco executado junto com a vereadora, disse considerar um “tapa na cara” a prisão de Rivaldo Barbosa. ““Ainda tem uma dor. A dor não vai passar nunca. É desesperador ainda, mesmo com algumas respostas ainda falta tanta coisa. É até difícil colocar em palavras. É dor, é luta”, disse Ágatha, que esteve na sede da Polícia Federal no Rio ao saber das prisões.

Parlamentares comemoraram a prisão dos mandantes. “Foi preciso a PF entrar para a investigação avançar, e se chegar a possíveis mandantes. Esse mar poluído de cumplicidades políticas precisa acabar”, disse o deputado Chico Alencar (Psol/RJ). “Após 6 anos de espera, frustração e dor, a polícia finalmente prendeu os suspeitos de mandar matar Marielle Franco e Anderson Gomes. Que a justiça seja feita! A revelação acontece neste dia 24 de março: Dia Internacional do Direito à verdade. #mariellepresente”, escreveu Luiza Erundina.

Com informações da Agência Brasil

Reportagem atualizada em 25/03/2024 com mais informações sobre a prisão e suas repercussões

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