O dilema brasileiro em Paris

Proposta climática do Brasil é ousada, mas peca pela falta de credibilidade

Por Agostinho Vieira | ArtigoEconomia VerdeODS 13ODS 14ODS 7 • Publicada em 30 de novembro de 2015 - 08:00 • Atualizada em 2 de setembro de 2017 - 15:47

O programa brasileiro de incentivo à energia eólica está entre os 17 bons exemplos mundiais que instituições de pesquisa estão levando para a COP21
O programa brasileiro de incentivo à energia eólica está entre os 17 bons exemplos mundiais que instituições de pesquisa estão levando para a COP21
O programa brasileiro de incentivo à energia eólica está entre os 17 bons exemplos mundiais que instituições de pesquisa estão levando para a COP21

Qualquer pessoa ou empresa que ganhe a vida vendendo alguma coisa sabe a importância de uma boa meta. É ela que te faz caminhar, seguir em frente e, às vezes, até levantar da cama cedo. Metas são fundamentais para quem busca uma remuneração melhor, uma educação mais elevada e até para os que sonham entrar naquela calça nova no próximo verão. Mas de nada adianta ter um objetivo na vida se ele é impossível de ser alcançado. Muita companhia considerada séria já quebrou a cara porque não entendeu que a melhor meta é aquela que consegue ser, ao mesmo tempo, desafiadora e alcançável.

A COP21, que começa hoje em Paris, também tem as suas. Na verdade, cada país teve que fazer um dever de casa, e levar as propostas na bagagem. Elas receberam o pomposo nome de Contribuições Nacionalmente Determinadas e Pretendidas (INDC, na sigla em inglês). Acho que parte do fracasso das COPs tem alguma relação com a dificuldade crônica em criar nomes simples. Com o Brasil não foi diferente. Demoramos um pouco para divulgar as nossas metas, mas elas saíram bonitas e ousadas, quase agressivas.

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Para completar, um dos maiores acidentes ambientais do país acontece sem que governos e empresas consigam dar respostas satisfatórias para uma enxurrada de dúvidas de todos os tipos e tamanhos

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O país está propondo reduzir as suas emissões de gases de efeito estufa em 37% até 2025 e em 43% até 2030. Considerando 2005 como ano-base de comparação. Utilizando um critério conhecido como GTP (Potencial de Temperatura Global), as metas brasileiras são ainda mais surpreendentes, com reduções de 43% até 2025 e 52% até 2030. Ou seja, em 25 anos (2005-2030), mais da metade das nossas emissões de carbono simplesmente desapareceriam.  Como? É aí que começa o problema.

Em artigo para o #Colabora, a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, disse que as propostas brasileiras se concentram em itens como o fim do desmatamento ilegal, o reflorestamento, a restauração de pastagens, a agricultura de baixo carbono e a ampliação das fontes renováveis na nossa matriz energética. É verdade que, entre 2004 e 2012, o desmatamento da Amazônia caiu cerca de 80% e as nossas emissões de CO2 ficaram 40% menores. Mas isso foi há três anos e, de lá para cá, a situação mudou bastante.

O desmatamento na Amazônia cresceu 16% entre 2014 e 2015

No último ano, o desmatamento subiu 16% em relação ao mesmo período do ano anterior. Vale registrar a coragem do governo de divulgar estes números dias antes da COP21. Mas é importante frisar também que esse aumento não estava previsto e que as causas não são muito claras. Ou seja, subimos quando devíamos ter caído e não sabemos bem por que isso aconteceu. Além disso, as emissões que vinham caindo estão estáveis. Entre 2013 e 2014, elas diminuíram 0,9%, e vêm se mantendo na casa de 1,5 bilhão de toneladas de CO² desde 2009.

E essa história toda se passa num cenário pouco animador. O governo recém-eleito enfrenta umas das piores crises políticas e econômicas da história. Como se isso não bastasse, acompanhamos em tempo real os capítulos de uma espécie de novela político-policial. Todos os dias algum personagem é preso ou enviado para o paredão. Para completar, um dos maiores acidentes ambientais do país acontece sem que governos e empresas consigam dar respostas satisfatórias para uma enxurrada de dúvidas de todos os tipos e tamanhos.

Esta semana, 12 instituições científicas internacionais, lideradas pela Agência Finlandesa de Inovação (Sitra), divulgaram uma lista de 17 projetos que já são adotados no mundo e que, se replicados em outros países, poderiam reduzir as emissões de gases de efeito estufa em até 25%. Esse percentual corresponde a todas as emissões combinadas dos Estados Unidos e da Europa. O que é que isso tem a ver com o Brasil e as suas metas? Tudo. Nada menos do que três das 17 iniciativas são brasileiras: a redução do desmatamento da Amazônia, o programa ABC (Agricultura de Baixo Carbono) e os incentivos à energia eólica.

Ou seja, a delegação brasileira chega à Paris tendo projetos para apresentar, algumas histórias boas para contar e metas ousadas para propor. Mas falta um detalhe fundamental: credibilidade. E esse é um item que demora anos para ser conquistado e apenas alguns breves momentos para ser destruído.

Agostinho Vieira

Formado em Jornalismo pela Escola de Comunicação da UFRJ. Foi repórter de Cidade e de Política, editor, editor-executivo e diretor executivo do jornal O Globo. Também foi diretor do Sistema Globo de Rádio e da Rádio CBN. Ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo, em 1994, e dois prêmios da Society of Newspaper Design, em 1998 e 1999. Tem pós-graduação em Gestão de Negócios pelo Insead (Instituto Europeu de Administração de Negócios) e em Gestão Ambiental pela Coppe/UFRJ. É um dos criadores do Projeto #Colabora.

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