Ações judiciais colocam em xeque política ambiental do governo

Transporte ilegal de madeira na BR 393, no Amazonas, em 2019: ação pede anulação de despacho do presidente do Ibama, Eduardo Bim, que liberou a exportação de madeira nativa sem fiscalização (Foto: Michael Dantas/WWF)

No Dia Mundial do Meio Ambiente, iniciativas no STF e na Justiça Federal do Amazonas questionam atitudes e omissões do ministério

Por Observatório do Clima | ODS 13ODS 15 • Publicada em 5 de junho de 2020 - 22:02 • Atualizada em 17 de junho de 2020 - 12:02

Transporte ilegal de madeira na BR 393, no Amazonas, em 2019: ação pede anulação de despacho do presidente do Ibama, Eduardo Bim, que liberou a exportação de madeira nativa sem fiscalização (Foto: Michael Dantas/WWF)

A Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente (Abrampa), quatro partidos políticos — PSB, PSOL, PT e Rede Sustentabilidade — Greenpeace e Instituto Socioambiental (ISA) entraram hoje, 5 de junho, com ações na Justiça contra o governo Jair Bolsonaro. Elas correm em diferentes frentes: exportação de madeira sem fiscalização e congelamento dos fundos Amazônia e Clima.

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Este é um governo que abriu mão do seu papel de proteger a floresta para incentivar o desmatamento. Como resultado, a destruição, o crime e a violência explodiram na Amazônia. Cabe agora à sociedade cuidar do maior patrimônio ambiental dos brasileiros. É o que estamos fazendo hoje

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As peças jurídicas se basearam em documentos técnicos compilados pelo Observatório do Clima, rede composta por 50 organizações da sociedade civil. As análises concluíram que o governo federal atendeu a madeireiros e deixou de aplicar a lei na exportação de madeira contra a orientação de especialistas do Ibama, além de colocar a floresta amazônica e o clima global em risco ao congelar o Fundo Amazônia e o Fundo Nacional sobre Mudanças Climáticas (Fundo Clima).

A primeira é uma ação civil pública (ACP) contra União e Ibama, tem como autores a Abrampa, o Greenpeace e o ISA. Foi impetrada na Justiça Federal do Estado do Amazonas e exige a anulação de despacho emitido pelo presidente do Ibama, Eduardo Bim, que liberou a exportação de madeira nativa sem fiscalização, a pedido expresso de madeireiras. O despacho se aplica a todo o país, mas afeta especialmente a Amazônia. “A Abrampa pleiteia no Judiciário anular mais um dos atos lesivos contra as florestas no Brasil. Nossa associação não poderia se furtar a garantir a proteção da Floresta Amazônica contra um ato que possibilita a exportação de madeira extraída ilegalmente em seu território, destruindo esse rico patrimônio nacional que pertence ao povo brasileiro e estimulando ainda mais a prática de crime ambiental”, afirma Cristina Seixas, presidente da Abrampa.

Bim assinou o documento em fevereiro, vinte dias após a Associação de Exportadores de Madeira do estado do Pará (Aimex) solicitar o fim das inspeções, que alegavam ser “complicadas” e “obsoletas”. A área técnica do Ibama deu parecer contrário à liberação. Bim não apenas o ignorou, como também exonerou o principal autor do documento. “Este é um governo que abriu mão do seu papel de proteger a floresta para incentivar o desmatamento. Como resultado, a destruição, o crime e a violência explodiram na Amazônia. Cabe agora à sociedade cuidar do maior patrimônio ambiental dos brasileiros. É o que estamos fazendo hoje”, destaca Tica Minami, diretora de Programas do Greenpeace Brasil.

A segunda e a terceira peças são ações diretas de inconstitucionalidade (Adin), por omissão da União, movidas pelos partidos PSOL, PSB, PT e Rede, no Supremo Tribunal Federal. Elas exigem a retomada imediata dos fundos Amazônia e Clima, principais mecanismos financeiros da política climática brasileira, que permitiriam ao país cumprir a Lei nº 12.187, da Política Nacional sobre Mudança do Clima, bem como o compromisso brasileiro no Acordo de Paris. Ambos os fundos estão congelados por um ano e meio, desde que o governo Bolsonaro assumiu.

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A governança climática no Brasil ficou paralisada no momento crítico em que o país precisava começar a implementar seus compromissos assumidos no Acordo do Clima de Paris. Isso ocorreu por ato deliberado do governo. Na reunião de 22 de abril, o ministro Salles disse temer que as ações do governo fossem objeto de ‘pau no Judiciário’. É exatamente isso que estamos ajudando a fazer, em comemoração ao Dia Mundial do Meio Ambiente

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Ricardo Salles, ministro do Meio Ambiente, dissolveu os dois comitês do Fundo Amazônia em 2019, sob alegações jamais comprovadas de que os contratos das ONGs tinham “indicativos de irregularidades” e que a queda do desmatamento — objetivo geral do Fundo — era um resultado “interpretativo” nas análises apresentadas em relatórios. Suas tentativas de recriar os comitês controlando sua composição foram rejeitadas pela Noruega e pela Alemanha, principais doadores. Independentemente de novos aportes e dos projetos em andamento contratados até 2018, há cerca de R$ 1,5 bilhão parados na conta do Fundo. Com isso, o governo federal, que sempre usa a falta de recursos para justificar a inação na política ambiental e nas ações voltadas à questão climática, deixa de usar os recursos.

O objeto da terceira ação é o Fundo Clima, estabelecido em 2009 para financiar ações de mitigação e adaptação com royalties de petróleo e empréstimos com juros especiais, por meio do BNDES. No início do mandato, o ministro Salles dissolveu a Secretaria de Mudanças Climáticas, o órgão governamental responsável pelo Fundo Clima. E, em abril do ano passado, um decreto do presidente Bolsonaro extinguiu seu comitê gestor. Assim, ele permaneceu inativo durante todo o ano.

Em 2019, havia autorização orçamentária para aplicação de R$ 8,050 milhões não reembolsáveis no fomento a estudos, projetos e empreendimentos. No fechamento do ano, foram empenhados pouco mais de R$ 718 mil, mas sem registro ainda de liquidação. Quanto aos recursos reembolsáveis, geridos pelo BNDES, estavam disponíveis mais de R$ 500 milhões, mas só cerca R$ 348 mil foram empenhados. No entanto, o direcionamento desses recursos ao BNDES também não se concretizou. A ação exige que o fundo seja imediatamente descongelado e que se desenvolva um plano para usar os recursos não apenas em 2020, mas também para os próximos dois anos.

O secretário-executivo do Observatório do Clima, Márcio Astrini, explica que ações eram uma forma de celebrar o Dia Mundial do Meio Ambiente. “A governança climática no Brasil ficou paralisada no momento crítico em que o país precisava começar a implementar seus compromissos assumidos no Acordo do Clima de Paris. Isso ocorreu por ato deliberado do governo. Na reunião de 22 de abril, o ministro Salles disse temer que as ações do governo fossem objeto de ‘pau no Judiciário’. É exatamente isso que estamos ajudando a fazer, em comemoração ao Dia Mundial do Meio Ambiente”, afirma Astrini.

Observatório do Clima

O Observatório do Clima é uma rede que reúne entidades da sociedade civil para discutir a questão das mudanças climáticas no contexto brasileiro.

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