Em um futuro cada vez menos distante, será possível pegar um ônibus elétrico, silencioso e gratuito, para ir até o aeroporto mais próximo da sua casa. No entanto, chegando lá, prepare-se, não haverá nenhum voo disponível para cidades que fiquem a menos de duas horas de distância. Este cenário está muito mais próximo do que você imagina e as razões de ser são as mesmas: garantir o direito universal à mobilidade urbana, reduzir as emissões de gases de efeito estufa, diminuir os acidentes e aquecer a economia.
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No Brasil, mais de 20 municípios já adotaram a proposta da tarifa zero para os ônibus urbanos. Maricá, no Rio de Janeiro; Vargem Grande Paulista, em São Paulo e Caucaia, no Ceará, estão entre elas. A iniciativa beneficia mais de 1 milhão de passageiros. Alguns que nem passageiros eram antes, simplesmente porque não tinham dinheiro para pagar a passagem. Caucaia, cidade com quase 400 mil habitantes, é um bom exemplo disso. Antes da adoção da tarifa zero, em julho de 2021, cerca de 500 mil moradores pagavam R$ 3,80 pela passagem. Hoje, com o ônibus gratuito, o número de usuários passou para 2 milhões de pessoas. Com isso, o custo por passageiro para a prefeitura caiu para R$ 1,35. Caucaia investe 25 milhões por ano para manter o sistema, que já reduziu o número de carros particulares nas ruas, diminuiu os acidentes, a poluição e aqueceu a economia local.
A discussão sobre tarifa zero para os ônibus urbanos agora chegou a São Paulo, a maior cidade do país. E vem ganhando corpo na equipe de transição do governo Lula, que pretende incentivar a prática. Em São Paulo, há algum tempo, a prefeitura já subsidia o preço das passagens. Do custo anual da operação, que é de R$ 7,7 bilhões, cerca de R$ 3,3 bilhões vêm do preço das passagens, o resto é custeado pelo poder público. A ideia agora é zerar esse valor, com os mesmos objetivos de Caucaia: reduzir o número de carros nas ruas, diminuir os acidentes, a poluição local, as emissões de gases de efeito estufa e aquecer a economia. Parece óbvio, mas ainda há muita resistência.
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Veja o que já enviamosA discussão esbarra sempre no regime de financiamento. Ou, em linguagem mais simples: quem vai pagar a conta? Não existe um modelo único, mas são muitas as possibilidades. Caucaia, por exemplo, renegociou os contratos com as empresas de transporte e banca o sistema com recursos próprios. Maricá, onde o modelo funciona desde 2013, é o dinheiro dos royalties do petróleo que financia a operação. Em Vargem Grande Paulista, a prefeitura combinou com as empresas da região que os recursos do vale-transporte seriam repassados para a prefeitura para subsidiar os ônibus gratuitos para todos. Essa é uma das ideias que está sendo analisada pela equipe de transição do governo Lula, mudar a lei do vale-transporte. Outra é criar uma espécie de SUS da Mobilidade Urbana, o SUMU (Sistema Único de Mobilidade Urbana), com recursos públicos.
“Quando a Prefeitura vem pegar o lixo na sua porta, você não questiona por que uma tarifa não foi paga. O mesmo deveria acontecer com o transporte coletivo”, explica o engenheiro Lúcio Gregori, que foi secretário de transportes do governo Luiz Erundina, em São Paulo, e há mais de 30 anos defende a adoção da tarifa zero.
Mas num país que sonha em ser um dos mais sustentáveis do planeta, não basta garantir transporte público gratuito e de qualidade. Por que não aproveitar a onda e investir em ônibus elétricos? Para o professor Roberto Schaeffer, da Coppe/UFRJ, não há mais nenhuma razão para que os ônibus urbanos e a frota de caminhões do Brasil não sejam totalmente eletrificados. Essa seria outra opção de investimento do governo federal. Eletrificar essas frotas via financiamento do BNDES, com clausulas que incluíssem a garantia de tarifa zero.
Neste nosso futuro nem tão hipotético assim, já temos a tarifa zero e os ônibus elétricos. E a ponte aérea? Bem, na semana passada a Comissão Europeia aprovou uma medida que proíbe voos de curta distância na França. A decisão faz parte da Lei do Clima e Resiliência, adotada em 2021 no país. O objetivo, mais uma vez, é reduzir as emissões de gases de efeito estufa. O conceito é relativamente simples. Se uma viagem pode ser feita de trem ou de ônibus em até 2 horas ou 2 horas e meia, o avião deve ser proibido. No caso da ponte aérea Rio-São Paulo, isso ainda deve demorar um pouco. Não temos trem ligando as duas maiores cidades do país e o ônibus leva cerca de seis horas. Mas essa também pode ser só uma questão de tempo.