Seca extrema na Somália provocou 43 mil mortes em 2022

Estudo da OMS e do Unicef aponta que metade das mortes no país africano foi de crianças atingidas por fome e desnutrição provocadas pela estiagem

Por Oscar Valporto | ODS 13ODS 2Sem categoria • Publicada em 21 de março de 2023 - 11:27 • Atualizada em 25 de novembro de 2023 - 14:02

Ao lado dos filhos, refugiada climática enche recipiente plástico em campo para retirantes da seca em Baidoa, na Somália: seca extrema provocou mais 43 mil mortes no país africano em 2022 (Foto: Guy Peterson / AFP – 11/09/2022)

Estudo encomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e pelo Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância aponta que mais 43 mil pessoas morreram em 2022 na Somália como resultado de uma seca cada vez mais profunda – em comparação com as crises de seca de 2017 e 2018. Metade dessas mortes pode ter ocorrido entre crianças com menos de 5 anos. “Esses resultados apresentam um quadro sombrio da devastação causada pela seca às crianças e suas famílias”, disse a representante do Unicef na Somália, Wafaa Saeed.

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De acordo com as duas agências da ONU, pela primeira vez, um modelo de previsão baseado em cenários também foi desenvolvido a partir do mesmo estudo para permitir ações antecipadas e evitar mortes relacionadas à seca. A previsão de janeiro a junho de 2023 estima que 135 pessoas também podem morrer todos os dias devido à crise, com o total de mortes projetadas para ficar entre 18.100 e 34.200 durante esse período. Essas estimativas sugerem que, embora medidas venham sendo tomadas para enfrentar a insegurança alimentar e a fome tenha sido evitada por enquanto, a crise está longe de terminar e já é mais grave do que a crise da seca de 2017-2018.

As mortes e as doenças prosperam quando a fome e as crises alimentares se prolongam. Veremos mais pessoas morrendo de doenças do que de fome e desnutrição combinadas se não agirmos agora. O custo de nossa inação significará que crianças, mulheres e outras pessoas vulneráveis pagarão com suas vidas enquanto testemunhamos desesperados e impotentes a tragédia se desenrolar

Mamunur Rahman Malik
Médico e chefe da missão da OMS na Somália

Encomendado pelo Escritório Regional do Unicef e pelo escritório da OMS na Somália e realizado pela Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres e pelo Imperial College de Londres, o estudo apresenta estimativas retrospectivas de mortalidade na Somália de janeiro a dezembro de 2022. As taxas de mortalidade mais altas foram estimadas em ocorreram no centro-sul da Somália, especialmente nas áreas ao redor das regiões de Bay, Bakool e Banadir, o atual epicentro da seca. “Estamos correndo contra o tempo para prevenir mortes que podem ser evitadas e salvar vidas”, disse o Mamunur Rahman Malik, chefe da missão da OMS na Somália, durante a apresentação do estudo nesta segunda-feira (20/03).

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Esses números são derivados de um modelo estatístico que estimou que a taxa bruta de mortalidade aumentou na Somália de 0,33 para 0,38 mortes por 10.000 pessoas-dia durante o período de janeiro a dezembro de 2022; a taxa em crianças menores de 5 anos foi quase o dobro desses níveis. Para 2023, a taxa bruta de mortalidade está prevista para atingir 0,42 mortes por 10.000 pessoas-dia até junho de 2023. “. Este estudo destaca a necessidade de um apoio humanitário multissetorial sustentável como resposta para reduzir as mortes evitáveis, particularmente entre os grupos mais vulneráveis”, afirma o estudo encomendado pela OMS e o Unicef e financiado pelo Ministério das Relações Exteriores do Reino Unido.

Crianças em campo de refugiados da seca Mogadishu, Somália: mais de três milhões de pessoas deixaram suas casas por conta da estiagem extrema (Foto: Hodan Mohamed Abdullahi / Anadolu Agency / AFP - 17/03/2023)
Crianças em campo de refugiados da seca Mogadishu, Somália: mais de três milhões de pessoas deixaram suas casas por conta da estiagem extrema (Foto: Hodan Mohamed Abdullahi / Anadolu Agency / AFP – 17/03/2023)

A Somália – país no chamado Chifre da África, no nordeste do continente, com 17 milhões de habitantes – está enfrentando cinco temporadas consecutivas de falta de chuva, a mais longa estiagem de sua história recente. De acordo com as agências da ONU, a seca leva cinco milhões de pessoas a uma situação de insegurança alimentar aguda e deixa quase dois milhões de crianças em risco de desnutrição. “Continuamos terrivelmente preocupados com o nível e a escala do impacto na saúde pública desta crise alimentar cada vez mais profunda e prolongada na Somália. Ao mesmo tempo, estamos otimistas de que, se pudermos sustentar nossas ações contínuas e ampliadas de saúde e nutrição e resposta humanitária para salvar vidas e proteger a saúde de nossos vulneráveis, podemos afastar o risco de fome para sempre”, afirmou o ministro da Saúde da Somália, Ali Hadji Adam Abubakar.

Estamos tristes com essas mortes mas sabemos que poderia ter havido muito mais mortes se a assistência humanitária não tivesse sido ampliada para alcançar as comunidades afetadas. Devemos continuar salvando vidas prevenindo e tratando a desnutrição, fornecendo água limpa e segura, melhorando o acesso a serviços de saúde que salvam vidas, imunizando crianças contra doenças mortais como o sarampo e fornecendo serviços de proteção essenciais

Wafaa
Saeed

Os representantes da ONU destacam que a seca extrema na Somália está se desenrolando em um cenário já sombrio. Com quase metade da população (7,9 milhões) necessitando de assistência humanitária, a crise é agravada pelo clima extremo induzido pelas mudanças climáticas, instabilidade política, tensões étnicas e insegurança, que continuam a piorar as preocupações de saúde pública e nutrição. “As mortes e as doenças prosperam quando a fome e as crises alimentares se prolongam. Veremos mais pessoas morrendo de doenças do que de fome e desnutrição combinadas se não agirmos agora. O custo de nossa inação significará que crianças, mulheres e outras pessoas vulneráveis pagarão com suas vidas enquanto testemunhamos desesperados e impotentes a tragédia se desenrolar”, afirmou o chefe da missão da OMS. ““Desde o início desta seca, a Organização Mundial da Saúde afirmou claramente que a seca é uma crise de saúde tanto quanto é uma crise alimentar e climática”, frisou Mamunur Rahman Malik.

Crianças e mães no Hospital Banadir, rm Mogadíscio, na Somália: fome e desnutrição fazem de crianças até cinco anos maioria entre as mortes no país provocadas pela seca extrema (Foto: Guy Peterson / AFP – 10/11/2022)

Seis estações chuvosas fracassadas consecutivas causaram a seca extrema na Somália, que coincide com o rápido aumento global dos preços dos alimentos, a intensificação da insegurança em algumas regiões e as consequências socioeconômicas da pandemia de covid-19. “Estamos tristes com essas mortes mas sabemos que poderia ter havido muito mais mortes se a assistência humanitária não tivesse sido ampliada para alcançar as comunidades afetadas. Devemos continuar salvando vidas prevenindo e tratando a desnutrição, fornecendo água limpa e segura, melhorando o acesso a serviços de saúde que salvam vidas, imunizando crianças contra doenças mortais como o sarampo e fornecendo serviços de proteção essenciais”, disse Wafaa Saeed, do Unicef.

De acordo com seus representantes, as Nações Unidas precisam de mais de US$ 2,6 bilhões para atender às necessidades prioritárias de 7,6 milhões de pessoas afetadas pela seca extrema na Somália em 2023 – inclusive três milhões que deixaram suas casas devido à seca extrema e prolongada. “A principal preocupação da OMS tem sido evitar o excesso de mortes direta ou indiretamente atribuídas à seca, com foco especial em mulheres e crianças menores de cinco anos”, afirmou o médio Malik. “Exortamos todos os nossos parceiros e doadores a continuar a apoiar o setor da saúde na construção de um sistema de saúde resiliente que funcione para todos e não para poucos”, disse o ministro Abubakar. “Caso contrário, os vulneráveis e marginalizados continuarão a pagar o preço desta crise com suas vidas”, advertiu.

Oscar Valporto

Oscar Valporto é carioca e jornalista – carioca de mar e bar, de samba e futebol; jornalista, desde 1981, no Jornal do Brasil, O Globo, O Dia, no Governo do Rio, no Viva Rio, no Comitê Olímpico Brasileiro. Voltou ao Rio, em 2016, após oito anos no Correio* (Salvador, Bahia), onde foi editor executivo e editor-chefe. Contribui com o #Colabora desde sua fundação e, desde 2019, é um dos editores do site onde também pública as crônicas #RioéRua, sobre suas andanças pela cidade

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