O protetor do samba no pé

A história do Seu Pedro, o sapateiro preferido dos passistas do Carnaval do Rio

Por Bárbara Pereira | ODS 9 • Publicada em 12 de fevereiro de 2018 - 10:13 • Atualizada em 2 de março de 2021 - 11:04

O sapateiro Pedro Augusto da Silva com um exemplar da sandália grega, com até oito fivelas, a preferida das musas do Carnaval. Foto Bárbara Pereira

Quem nasceu para fazer salto alto não se contenta com Scarpin. Tudo bem que foi produzindo sapatilhas que Seu Pedro começou no ofício que hoje dá a ele o reconhecimento de fazer o melhor calçado para quem tem samba no pé. O artesão é um dos principais produtores de sandálias e sapatos de passistas da cidade do Rio de Janeiro. O selo de qualidade é confirmado pelos próprios dançarinos do samba.

A história de Pedro Augusto da Silva é semelhante à de vários trabalhadores com ofícios engolidos pela industrialização de tudo. Ao levar almoço numa pequena fábrica de sapatos em Juiz de Fora, com apenas nove anos, se encantou com a arte de proteger os pés alheios. Ali, aprendeu primeiro a fazer sapatilhas e – sempre bom observador – alçou outros voos quando chegou ao Rio de Janeiro, com apenas 15 anos de idade: “sempre fui muito curioso, pegava um pouquinho dali, um pouquinho daqui. Aprendi sozinho”. Depois de passar por poucas fábricas, montou o seu próprio negócio. Aos 30 anos, conheceu o compositor do Império Serrano Beto Sem Braço e nunca mais saiu do mundo do samba.

O tradicional sapato de duas cores dos passistas. Foto Bárbara Pereira
O tradicional sapato de duas cores dos passistas. Foto Bárbara Pereira

A maior produção do pequeno galpão montado em Tomás Coelho, Zona Norte da cidade, é para o carnaval do Rio de Janeiro. Só este ano passistas da Portela, de Vila Isabel e da Viradouro vão levar sua marca para a Avenida, além de diversos casais de mestre-sala e porta-bandeira e também das musas, que preferem as sandálias com várias tiras ao longo de toda a canela: “elas gostam da sandália grega, com até oito fivelas”, revela o segredo. Já as passistas femininas usam modelos com saltos não menos do que 13 centímetros e com peso máximo de 250 gramas.

Mas não são só as escolas de samba que preferem o selo Seu Pedro de qualidade. As quadrilhas de festa junina já rendem bons pedidos para a fábrica, onde apenas seis pessoas fazem quase que manualmente o admirável mundo colorido que brilha nos pés de homens e mulheres. A fama desse artesão meio tímido já atravessou continentes. Hoje, ele também produz para o carnaval do Japão e da França. Seu Pedro admite que o boca a boca foi o sucesso do negócio: “As passistas são pessoas bacanas. Elas é que levam o meu nome por aí.”

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O salto alto das passistas femininas, com mais de 13 centímetros e no máximo 250 gramas. Foto Bárbara Pereira

A paixão pelos sapatos é tanta que ele não esconde a tristeza pelo desinteresse dos mais novos em aprender o ofício. A transmissão de tudo o que aprendeu é um sonho à espera de interessados em promover esse encontro de gerações, já que nenhum dos quatro filhos seguiu seus passos. Mesmo trabalhando de sete da manhã até onze da noite nos meses que antecedem o carnaval, ele garante que a vida financeira foi sempre favorável, mas não esconde que é preciso gostar muito: “A profissão é enjoada porque tem muito detalhe. Tem que ter cabeça”, explica. O orgulho é tanto que fez questão de mostrar os vários modelos criados para o carnaval deste ano. E admite ficar feliz quando vê alguma passista com suas sandálias nos desfiles que acompanha pela televisão. Seu Pedro só não revela de jeito nenhum para qual escola torce: “Vão me chamar de traidor. E passista não é mole não”, conta o mago das sandálias, cheio de jogo de cintura assim como o bailado dos seus clientes.

Bárbara Pereira

Bárbara Pereira é jornalista há 20 anos. Já trabalhou no Sistema Globo de Rádio, na Ediouro, na TVE do Rio de Janeiro e, atualmente, está na TV Escola, como editora e apresentadora. É autora do livro Estrela Que Me Faz Sonhar - Histórias da Mocidade (Verso Brasil Editora) e da crônica Aquele Abraço, que faz parte do livro O meu lugar (Editora Mórula). Faz doutorado em Memória Social na UNIRIO.

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