Imagine um país que seja capaz de queimar, todos os anos, uma área equivalente ao estado do Ceará? Ou um território superior ao da Inglaterra? É isso que o Brasil vem fazendo, sistematicamente, nos últimos 36 anos. O levantamento inédito, feito pelo Projeto MapBiomas, analisou imagens de satélite entre 1985 e 2020 e revelou que o país destrói, a cada ano, em média, 150.957 km² ou 1,8% do seu território. O acumulado do período chega a praticamente um quinto do território nacional: 1.672.142 km², ou 19,6% do Brasil, sendo que 65% do total da área queimada foi de vegetação nativa. O estado de Mato Grosso apresentou a maior incidência de fogo, seguido pelo Pará e por Tocantins. E advinha quem é o responsável? O homem, é claro, e a ideia mofada de que é preciso destruir para se desenvolver.
Leu essa? Seca recorde no Rio Paraguai dificulta combate a incêndios no Pantanal
Entre os cinco biomas do Brasil, nenhum foi tão atingido como o Pantanal: 57% de seu território foi queimado pelo menos uma vez entre 1985 e 2020. A vegetação campestre é a mais afetada no bioma. Durante os períodos úmidos as plantas acumulam biomassa e no período seco, a vegetação seca vira combustível para o fogo. “Essas características do bioma, associadas a eventos climáticos de seca e fortes ventos, torna o fogo um problema a ser controlado. Questões relativas ao uso do fogo como forma de manejo, em condições inadequadas, podem levar a ocorrência de incêndios descontrolados por extensas áreas”, alerta o coordenador do MapBiomas Pantanal, Eduardo Reis Rosa.
Gostando do conteúdo? Nossas notícias também podem chegar no seu e-mail.
Veja o que já enviamosO pesquisador explica que o Pantanal tem uma vegetação adaptada ao fogo. No entanto, a alta frequência pode torná-lo prejudicial à biodiversidade de fauna e flora: “Questões relativas ao uso do fogo devem ser integradas às condições de uso das pastagens, de forma preventiva, controlada e seguindo os ciclos do Pantanal e condições meteorológicas adequadas, com o objetivo de proteger o bioma”.
O mapeamento revela cada pedaço de território do Brasil atingido pelo fogo nos últimos 36 anos. Para Ane Alencar, coordenadora do MapBiomas Fogo, “sabendo onde foi queimado é possível entender a dinâmica do fogo e quais as áreas que estão mais vulneráveis no futuro. Assim, o mapeamento é fundamental para entender a frequência e a intensidade do fogo, para o planejamento do combate e apontar áreas de maior risco”. Cerrado e Amazônia representam 85% da área queimada nesses últimos 36 anos. “A Amazônia não é um bioma do qual o fogo faz parte da dinâmica natural do ecossistema, diferente do Cerrado onde o fogo natural faz parte de sua dinâmica evolutiva”, destaca a pesquisadora.
Para chegar a esses números, a equipe do MapBiomas processou mais de 150 mil imagens geradas pelos satélites Landsat 5, 7 e 8 de 1985 a 2020. Com a ajuda de inteligência artificial, foi analisada a área queimada em cada pixel de 30m x 30m dos mais de 8,5 milhões de quilômetros quadrados do território nacional, independente do uso e cobertura do solo. Ao todo, foram 108 terabytes de imagens processadas para mostrar áreas, anos e meses de maior e menor incidência do fogo.
Os dados de queimadas e incêndios florestais estão disponibilizados em mapas e estatísticas anual, mensal e acumulada para qualquer período entre 1985 e 2020 na plataforma MapBiomas, aberta a todos. Ela também inclui dados de frequência de fogo, indicando as áreas mais afetadas nos últimos 36 anos. A resolução é de 30m, com indicação do tipo de cobertura e uso do solo que queimou, permitindo recortes territoriais e fundiários por bioma, estado, município, bacia hidrográfica, unidade de conservação, terra indígena, assentamentos e áreas com Cadastro Ambiental Rural (CAR).