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Quatro coisas que o palco do TEDx me ensinou

Epifanias e lições sobre narrativas, talento e técnica, preparação e improvisos, e o poder das emoções

ODS 10ODS 13ODS 5 • Publicada em 31 de janeiro de 2024 - 09:31 • Atualizada em 31 de janeiro de 2024 - 18:00

Quando fui convidada para palestrar no palco do TEDx*, eu demorei a elaborar que era, de fato, um convite pessoal e intransferível. Primeiro porque, no ano anterior, eu havia declinado em uma oportunidade semelhante. O motivo? A data era concomitante a uma viagem de trabalho para o Egito e desisti de tentar ser onipresente. Depois, porque o TEDx Talk era um sonho silencioso e antigo, uma daquelas metas que a gente tem medo de falar em voz alta. 

O convite veio em março de 2023, Uma vez aceito, contei para pouquíssimas pessoas. Na época, me explicaram que seria uma edição “countdown”, voltada para assuntos de sustentabilidade e crise climática ao redor do mundo. Além disso, seria na Escola Superior do Ministério Público (ESMPU), em Brasília, no Distrito Federal. Vale dizer que, na ocasião, eu morava no Rio de Janeiro e não tinha a menor ideia de que me mudaria para a capital federal no mesmo ano. 

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No fundo, a vida é assim: a gente não sabe nada sobre nada. Caminhos, oportunidades, raízes. São tantas variantes que atravessam quem nós somos que seria até um pouco irresponsável fazer análises sobre o passado-presente. Quem dirá o futuro?

Andréia Coutinho Louback no palco do TEDx: Epifanias e lições sobre narrativas, talento e técnica, preparação e improvisos, e o poder das emoções (Foto: Divulgação)
Andréia Coutinho Louback no palco do TEDx: Epifanias e lições sobre narrativas, talento e técnica, preparação e improvisos, e o poder das emoções (Foto: Divulgação)

Contudo, acredito muito em sincronicidades. O ato ou efeito de dois ou mais acontecimentos realizados de forma simultânea, sem que haja uma relação lógica de tempo ou espaço. Sem causalidades ou acasos, mas que absolutamente transformam nossa vivência. Digo isso, pois, embora tenha sido uma missão profissional, ser palestrante do TEDx envolveu uma série de epifanias. 

Para mim, não há romantismo algum em realizar um grande sonho. A voz da culpa, do perfeccionismo e a corrida contra a produtividade capitalista gritam em múltiplas frequências. Um sonho, seja individual ou coletivo, requer que estejamos minimamente preparados para ele. No meu caso, sentia uma ambiguidade. A sensação de que me faltava tempo hábil para a dedicação às etapas processuais + a maratona do roteiro que todo palestrante do TEDx precisa enfrentar. 

Meu tema não seria nenhuma surpresa para ninguém: justiça climática no Brasil. Porém, o caminho a ser traçado para desenvolver narrativa didática, envolvente e prática foi a etapa mais agônica. Felizmente, Caetano Tona, um dos principais mentores do TEDx no Brasil, me deu a mão para encontrar as peças perdidas em meu quebra-cabeça — que conectavam os pontos da jornada a qual eu estava prestes a comunicar.

Pensando nas epifanias e todos os ensinamentos que aquela experiência recente me trouxe, decidi registrar e compartilhar quatro coisas que o palco do TEDxESMPU, em Brasília, me ensinou. 

1- TODA NARRATIVA É ÚNICA

Por mais que nossas infâncias tenham histórias em comum, é muito libertador entender quais foram nossos pontos de virada ao longo da jornada. Quase sempre existe uma ruptura — positiva ou negativa — que nos leva para algum lugar improvável, seja para o bem ou para o mal. Revisitar meu passado sempre foi desafiador, pois eu precisava entrar em contato com traumas e feridas que ainda não superei. Contudo, eu escolhi uma memória que conectava o lugar onde cresci e me desenvolvi e como São Gonçalo, minha cidade na região metropolitana do Rio de Janeiro, foi responsável por todo o meu histórico de ativismo na luta por justiça social. Para tanto, o que eu fiz logo no início: resgatei o significado do meu nome, os primeiros aprendizados com meus pais e tudo o que percorreu a vida de uma menina negra, classe média baixa e periférica. 

2- TALENTO NÃO É TÉCNICA, NÃO INSISTAM

Eu cresci na igreja. O que significa que, antes de acessar qualquer fala política — ou antes mesmo de ter contato com minhas primeiras professoras —, eu já testemunhava os mais variados discursos de pastores. Olhando para trás com uma lente crítica, muitos sermões eram totalmente improvisados a fim de manipular a fé das pessoas. A linha básica de começo, meio e fim nem sempre era uma realidade. Logo, falar bem em público ajuda, mas não é tudo. Se você é prolixo, atrapalha. Se você é de poucas palavras, também. Há um princípio por trás do palco de uma das maiores plataformas de entretenimento e storytelling do mundo. Aprendi a conectar blocos narrativos de episódios, cenários e pontos-chave da justiça climática no Brasil — e no mundo — para que, independentemente de quem assistir,  consiga se conectar à temática e todas as problemáticas de desigualdades e violações de direitos nas entrelinhas. Pouco importava se eu tinha talento ou não. O que estava em jogo era a minha capacidade de transformar a tecnicidade em histórias. 

3- PREPARAÇÃO NÃO NOS LIVRA DE IMPROVISOS

Talvez pareça contraditório, mas muitos espectadores imaginam que seja proibido improvisar no palco de um TEDx. Em alguns países, o TEDx é feito com leitura de teleprompter para respeitar o tempo e evitar o improviso ou um possível esquecimento, que é bastante comum. Na época que realizei a minha palestra, algumas pessoas tinham a curiosidade em saber se foi preciso decorar o texto ou se havia algum espaço para espontaneidade. Aprendi, de forma muito eloquente, que o palco não nos livra de improvisos. Eu, por exemplo, citei a autora bell books intuitivamente, mas não estava previsto no meu roteiro ensaiado tantas vezes. Há uma energia invisível no palco que nos permite flutuar entre a base do nosso texto e as nuances do que a narrativa nos evoca.

4- NUNCA SUBESTIMAR O PODER DAS NOSSAS EMOÇÕES

Eu chorei. Muito perto de encerrar a missão, eu chorei. Não, não estava planejado, tampouco foi teatral. Não estava nas minhas previsibilidades, afinal, raramente me permito ceder às emoções em ambientes técnicos. Aconteceu. Aconteceu porque lutar contra a crise climática em um país como o Brasil tem um alto custo emocional e de vida. O Brasil lidera o ranking de mortes de ambientalistas na última década. As perspectivas são tenebrosas, nosso país segue reproduzindo o racismo e não temos políticas públicas de adaptação suficientes para 203 milhões de pessoas. O choro não veio de um lugar meramente emocional. Foram lágrimas políticas de quem ainda preserva a esperança de que, quando tudo me faltar, que não me falte a coragem para comunicar a justiça climática. 

Convido a você a aprender e também se emocionar com esse dia catártico e significativo. 

*TEDx Brasil é uma versão independente de uma das conferências mais importantes e inovadoras do mundo, a TED (tecnologia, entretenimento e design). Essa é uma ONG criada nos EUA, em 1984, e ela tem o intuito de propagar “ideias que merecem ser compartilhadas” (Fonte: TEDx São Paulo)

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