Geleira mais alta do Everest derrete em ritmo acelerado

Cientistas descobrem que, com crise climática, geleira no topo do mundo perdeu 54 metros de espessura em 25 anos e preveem impacto em 1 bilhão de pessoas

Por Oscar Valporto | ODS 13 • Publicada em 9 de fevereiro de 2022 - 09:12 • Atualizada em 1 de dezembro de 2023 - 18:33

Cientistas no alto de geleira do Monte Everest, no Nepal: pesquisa descobre derretimento acelerado no topo do mundo com a crise climática (Foto: Mariusz Potocki / University of Maine – Maio/2019)

A crise climática está levando a geleira mais alta do Monte Everest, a montanha mais alta do planeta, a derreter em ritmo acelerado, de acordo com estudo de uma equipe internacional de pesquisadores, publicado em revista do grupo Nature. A pesquisa revela que a geleira South Col perdeu mais de 180 pés (54 metros) de espessura nos últimos 25 anos.

De acordo com os pesquisadores, a geleira, localizada quase 8 mil metros (7.906m) acima do nível do mar, está afinando 80 vezes mais rápido do que o gelo que se formou na superfície. “Esta pesquisa mais recente confirma as alturas que as mudanças climáticas de origem humana atingem e serve como um indicador para outros sistemas de geleiras de montanhas altas e os impactos potenciais à medida que a massa dessas geleiras diminui”, afirmou o glaciologista Paul Mayewski, diretor da Instituto de Mudanças Climáticas da Universidade de Maine (EUA), em comunicado divulgado pela instituição.

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Liderados pelos pesquisadores da UMaine, uma equipe de 10 cientistas visitou a geleira em 2019, onde instalaram as duas estações de monitoramento meteorológico mais altas do mundo e extraíram amostras de um núcleo de gelo de 10 metros de comprimento. No estudo publicado na revista NJC Climate and Atmosferic Science do grupo Nature, os autores destacam que o recuo mundial das geleiras nas montanhas e seus impactos estão bem documentados. “No entanto, os trechos superiores (acima de 5 mil metros de altitude ) das paisagens montanhosas receberam relativamente pouca atenção científica, deixando lacunas no conhecimento sobre os principais fatores que influenciam a circulação atmosférica, mudanças na extensão da neve e do gelo ao longo do tempo”, frisam os pesquisadores.

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Foi para preencher esta lacuna, que os cientistas protagonizaram a expedição Perpetual Planet Everest Expedition, apoiada pela National Geographic Society e pela Rolex, para instalar as estações de monitoramento no lado nepalês do Everest, na mais abrangente investigação científica nesta região da Cordilheira do Himalaia, incluindo estudos em biologia, geologia, glaciologia, meteorologia e mapeamento climático. “O resultado da pesquisa responde a uma das grandes questões colocadas pela nossa expedição ao Monte Everest – se as geleiras mais altas do planeta são impactadas pelas mudanças climáticas de origem humana. A resposta é um retumbante sim; e isso vem acontecendo de forma muito significativa desde o final da década de 1990”, acrescentou Mayewski, no comunicado da universidade.

As previsões climáticas para o Himalaia sugerem aquecimento contínuo e perda contínua de massa de geleiras, e até o topo do Everest é impactado pelo aquecimento de fontes antropogênicas

Mariusz Potocki
Glacioquímico e doutorando do Instituto de Mudanças Climáticas da Universidade de Maine (EUA)

De acordo com os pesquisadores, a extrema sensibilidade das massas de gelo do Himalaia – em alta altitude e em rápido recuo – alerta para impactos “que podem variar desde o aumento da incidência de avalanches e a diminuição da capacidade da água armazenada na geleira, da qual mais de 1 bilhão de pessoas dependem para fornecer degelo para água potável e irrigação”.

A expedição ao Monte Everest estabeleceu três recordes registrados no Guiness Book: o núcleo de gelo extraído da maior altitude – 8.020 metros (26.312 pés) – no alto da geleira South Cole, em uma operação complexa desenvolvida por mais de 30 cientistas e guias; o microplástico encontrado na maior altitude em terra, com fibras de polímero – provavelmente de roupas ou tendas – achadas a 8.440 metros (27.690 pés); e a estação meteorológica instalada na maior altitude, no alto da cordilheira, situada a 8.430 metros (27.657 pés) acima do nível do mar.

Expedição com 30 pesquisadores a caminho do topo do Everest: derretimento de geleira pode afetar 1 bilhão de pessoas e tornar escaladas mais perigosas (Foto: Mariusz Potocki / University of Maine - Maio/2019)
Expedição com 30 pesquisadores a caminho do topo do Everest: derretimento de geleira pode afetar 1 bilhão de pessoas e tornar escaladas mais perigosas (Foto: Mariusz Potocki / University of Maine – Maio/2019)

No estudo publicado, os cientistas relatam ter descoberto, através das simulações realizadas, que a perda de massa de superfície por derretimento ou vaporização pode ser acelerada por mais de 20 vezes caso a cobertura de neve der lugar ao gelo. E, apesar de o aquecimento das temperaturas do ar, ter provocado a maior parte do derretimento no alto do Everest, a diminuição da umidade relativa e os ventos mais fortes também foram fatores de impacto. “As previsões climáticas para o Himalaia sugerem aquecimento contínuo e perda contínua de massa de geleiras, e até o topo do Everest é impactado pelo aquecimento de fontes antropogênicas”, afirmou, no comunicado da Universidade de Maine, o glacioquímico Mariusz Potocki, doutorando no Instituto de Mudanças Climáticas, responsável por coletar o núcleo de gelo mais alto do planeta e um dos líderes da expedição que envolveu ainda cientistas do Reino Unido, da Índia, da China, da Alemanha, da Suíça e do Nepal.

O derretimento acelerado do ponto mais alto da Terra pode tornar também muito mais difícil a escalada do Monte Everest, alertam os cientistas no estudo. Cerca de mil pessoas escalam o Everest todos os anos – esportistas, pesquisadores, guias – e nem todos com objetivo de chegar ao topo. Além de mais avalanches, os pesquisadores indicam que futuras expedições ao Monte Everest também se tornariam mais difíceis, porque as rochas ficariam mais expostas devido às mudanças climáticas.

Oscar Valporto

Oscar Valporto é carioca e jornalista – carioca de mar e bar, de samba e futebol; jornalista, desde 1981, no Jornal do Brasil, O Globo, O Dia, no Governo do Rio, no Viva Rio, no Comitê Olímpico Brasileiro. Voltou ao Rio, em 2016, após oito anos no Correio* (Salvador, Bahia), onde foi editor executivo e editor-chefe. Contribui com o #Colabora desde sua fundação e, desde 2019, é um dos editores do site onde também pública as crônicas #RioéRua, sobre suas andanças pela cidade

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