Olhar para um guarda-roupa abarrotado e achar, mesmo assim, que não tem o que vestir? Quem nunca? E, pior, continuar a comprar sem culpa… Mas, de um passado recente para cá, tem surgido um movimento crescente de pessoas dispostas a quebrar esse ciclo consumista para testar, na prática, a máxima do “menos é mais”. A proposta é desapegar do exagero e montar um armário enxuto, com peças na medida e na conta das necessidades do dono. Essa vibe anticonsumista ganhou mais força com as iniciativas de blogueiras influentes dos quatro cantos do planeta, que decidiram montar o que chamam de “cápsulas” experimentais. Essas formadoras de opinião escolhem um número restrito de peças e se propõem a passar uma temporada – que pode chegar até a um ano – usando unicamente essas roupas. E diariamente fazem relatos e postam, claro, o look do dia. As seguidoras se animam e replicam a experiência.
[g1_quote author_name=”Daniela Kopsch” author_description=”Blogueira catarinense” author_description_format=”%link%” align=”left” size=”s” style=”simple” template=”01″]
Essa experiência mudou minha vida. Ter consciência dos impactos que o consumismo causa na nossa vida e de muitas outras transformou a minha maneira de ver as coisas. Eu realmente não acho que vou voltar a olhar as roupas da mesma forma descartável como antes.
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Veja o que já enviamosRaquel Amaral, jornalista de formação, por exemplo, comprou a ideia e decidiu que, por um ano, seu guarda-roupa caberá numa mala de viagem (tamanho médio). O clique aconteceu recentemente junto com a decisão de voltar a morar na casa da mãe por uns tempos, após perder o emprego. Ela, que dividia apartamento com uma amiga, ficou assustada na hora de fazer a mudança: não havia se dado conta da quantidade de roupas que possuía – muitas ainda com a etiqueta. Eram tantas que Raquel nem se lembrava de parte delas.
– Eu era super consumista! Rata de liquidação. E era obesa. Então, sempre comprava roupa que não cabia porque estava barato, Achava que era só fazer um regime para caber. Mas esse momento nunca chegava. Quando percebi, estava com uma pilha de roupas no armário sem tirar a etiqueta há mais de dois anos. Aí, percebi que não precisava de todas aquelas coisas. Eu já nem dava falta de mais delas – confessa Raquel.
A moça, então, decidiu praticar o desapego ao diminuir drasticamente o guarda-roupa. Doou peças e trocou outras com amigas, já que, nesse meio tempo, também emagreceu. Acabou também arrumando um novo emprego, que a obriga agora a viajar constantemente pelo país. Foi a senha para botar em prática a experiência do consumo com responsabilidade. Comprou uma mala e, desde então, é onde guarda todas as roupas que tem.
– Agora, vivo em hotéis e não pretendo comprar uma segunda mala para levar mais coisas. E não são só as roupas que precisam ser limitadas não, é tudo. Trouxe apenas um livro na viagem, uma bota, uma sapatilha, um tênis, um chinelo e um sapato alto. Vou me virar com isso durante um ano – jura Raquel, animada.
[g1_quote author_name=”Caroline Rector ” author_description=”Blogueira americana” author_description_format=”%link%” align=”left” size=”s” style=”simple” template=”01″]Eu percebi que tinha o mau hábito de ir às compras quando eu queria me livrar do mau humor. Dia de trabalho árduo? Compras! Não estou me sentindo muito bem hoje? Compras! Frustrada com a minha família? Compras!
[/g1_quote]Ela conta que sua fonte de inspiração foi a blogueira catarinense Daniela Kopsch, que há um ano criou a experiência “Less is the new black”:
– O blog da Dani me ajudou de novo, com as dicas de arrumação de mala, com essa proposta de se ter consciência do que você possui. Os meus valores mudaram. Tanto que o slogan de um site de vendas me incomoda absurdamente: “Comprar é divertido”. Não, não é. Comprar precisa ser algo responsável.
Daniela Kopsch, a propósito, faz um sucesso danado entre das mais de mil seguidoras do blog “Less is the new black”, prestes a completar um ano de vida. É nesse espaço que a blogueira, desde junho do ano passado, conta detalhes sobre sua jornada de viver 12 meses com 50 peças de roupas – 25 blusas, 8 vestidos, 8 casacos, 4 calças, 3 shorts e 2 saias (acessórios e calçados ficaram fora da conta). Na verdade, garante ela, esse guarda-roupa foi reduzido para 49 peças, desde que uma delas estragou após ficar suja de tinta. A moça decidiu não acrescentar outra. Os looks do dia fazem parte dessa experiência.
A blogueira, de 27 anos, conta que o “Less is the new black” nasceu quando ela decidiu “dar uma freada” nas compras.
– Queria transformar minha relação com o consumo. No começo foi um pouco difícil. Por isso, criei o blog para me incentivar a continuar e também para ter o controle das amigas. O que aconteceu foi que elas se empolgaram com a ideia e o conceito se espalhou rápido. Acho que estamos numa época em que a necessidade de desapegar está latente em todo mundo. A gente sabe que tem alguma coisa errada no nosso estilo de vida, mas nem sempre entende bem do que se trata. Até perceber o consumismo como uma engrenagem que move muitas dessas coisas. Se você conseguir reduzir ou até parar isso, vê que consegue identificar e mudar muitos problemas como falta de dinheiro, tempo, energia, autoestima…
A moça traçou uma meta: todo o seu guarda-roupa passaria a caber numa mala de viagem.
– Eu andava insatisfeita com a quantidade de roupas no meu armário. Ele vivia entulhado de coisas e eu nunca tinha nada para usar. Comecei a desapegar de várias peças, mas o armário logo voltava a ficar cheio. Não por mágica, mas porque eu continuava comprando. Então, decidi ficar um ano sem comprar roupas e guardei apenas o que coube na minha mala: 50 peças. Pretendo continuar sem compras até completar esse prazo, em junho, e depois vou seguir com o projeto, provavelmente com outro formato – planeja ela.
As cerca de mil pessoas que acompanham de perto o blog também participam ativamente do grupo de discussão no Facebook. A proposta é postar os looks diariamente para mostrar que as roupas são versáteis e combinam entre si.
– Essa experiência mudou minha vida. Ter consciência dos impactos que o consumismo causa na nossa vida e de muitas outras transformou a minha maneira de ver as coisas. Eu realmente não acho que vou voltar a olhar as roupas da mesma forma descartável como antes – conclui Daniela, que, por conta da experiência, tem sido convidada para palestras e apresentações, nas quais divide a experiência com as plateias.
A blogueira americana Caroline Rector serviu de inspiração para essa mudança de comportamento de consumidoras e blogueiras brasileiras, ao lançar, em 2014, o fashion blog “Unfancy”. A moça, nascida no Texas, criou a proposta de usar durante três meses apenas 37 peças do seu guarda-roupa. Imediatamente, a experiência ganhou seguidores e o blog bombou nas redes sociais. Diariamente, ela fazia uma produção diferente e postava.
– Eu percebi que tinha o mau hábito de ir às compras quando eu queria me livrar do mau humor. Dia de trabalho árduo? Compras! Não estou me sentindo muito bem hoje? Compras! Frustrada com a minha família? Compras!
Não era de admirar que meu armário não fizesse qualquer sentido. Refletia o meu stress emocional, não o meu estilo. Eu queria parar de gastar dinheiro com compras emocionais e parar de encher meu armário com roupas baratas – explica Caroline, na introdução do blog.
Dona de um guarda-roupa ainda abarrotado, a universitária Aline Marques de Castro está a um passo de testar a máxima de “menos é mais”. Seguidora de blogs de gênero, ela afirma que começou a separar suas roupas favoritas. Em seguida, vai doar uma parte e promover um bazar para vender outras. A partir daí, vai, segundo ela, “se virar” com o que sobrou.
– Acho essa prática do desapego o máximo. Tenho tanta roupa que nem lembro de tudo. Tem vezes que me surpreendo até com algumas peças. Acho que está na hora de viver com menos. Isso é uma tendência mundial. Quero aprender a praticar um consumo mais responsável. Não digo que vai caber tudo dentro de uma mala, mas não pretendo ter mais de cem peças. O que entrar depois disso vai implicar na retirada de uma peça mais antiga. Se tudo der certo, vou começar a partir do segundo semestre. E quem sabe não crio um blog para contar minha experiência?