Brasil perderá bilhões ao desprezar o turista LGBTI+

Ipanema, no Rio de Janeiro, cidade conhecida como destino LGBTI+ friendly (Aziz Ary Neto/AFP)

Declarações LGBTfóbicas do presidente da Embratur confirmam que governo não pretende incentivar segmento importante para a retomada das viagens pós-pandemia

Por Otavio Furtado | ODS 12 • Publicada em 29 de junho de 2020 - 08:44 • Atualizada em 21 de junho de 2021 - 13:48

Ipanema, no Rio de Janeiro, cidade conhecida como destino LGBTI+ friendly (Aziz Ary Neto/AFP)

Um dos setores mais afetados pela pandemia do covid-19, o turismo brasileiro poderá ter mais dificuldades em se recuperar da crise pela falta de investimento no segmento LGBTI+. Recentes declarações homotransfóbicas do presidente da Embratur, Gilson Machado, confirmam que dificilmente o turismo LGBTI+ terá qualquer ação de incentivo por parte dos órgãos governamentais.

Com essa postura, o Brasil perde uma grande oportunidade. Os viajantes LGBTI+ movimentaram U$ 218,7 bilhões em 2018 no mundo e U$ 26,8 bilhões no Brasil, segundo dados da pesquisa LGBT Travel Market, promovida anualmente pela Consultoria Out Now/WTM. Uma pesquisa divulgada durante o Fórum de Turismo LGBT, em 2016, traçou o perfil desse turista: realizam, em média, quatro viagens por ano; 45% viajam ao exterior todos os anos (a média nacional é de 9%), e seus gastos são 30% maiores em relação a outros viajantes. Só a Parada do Orgulho LGBTI+ atrai 3 milhões de visitantes para São Paulo, movimentando R$ 190 milhões.

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Pesquisa do Harris Poll revela que 64% dos LGBTs pretendem viajar tão logo os protocolos de segurança sejam estabelecidos, contra 58% dos outros turistas.

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Apesar dos números, para o governo brasileiro, esse turista não é bem-vindo. Em abril de 2019 o presidente Jair Bolsonaro afirmou que “quem quiser vir aqui fazer sexo com uma mulher, fique à vontade. Agora, não pode ficar conhecido como paraíso do mundo gay aqui dentro”. Além de estimular o turismo sexual, a fala do presidente demonstra que o atual governo não terá interesse em divulgar o país como um destino LGBT friendly.

Vista aérea da Parada LGBTI+ em São Paulo: evento atrai milhões de turista e movimenta quase R$ 200 milhões (Foto: Miguel Schincariol / AFP)

A escolha do atual presidente da Embratur, órgão responsável pela promoção do turismo brasileiro, confirma essa linha de pensamento. Em recente live ao lado da ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, Gilson Machado revelou todo seu preconceito e desconhecimento do tema. Em uma parte chocante de sua fala, chegou a dizer que não tem nada contra “quem usa seu orifício rugoso infra lombar para fazer sexo”, mas que acha “abominável” a “tentativa de impor a sua sexualidade perante a maioria de cristãos brasileiros”.

Depois da pandemia, 64% dos LGBTI+ querem viajar

Apesar de não citar o turismo em sua declaração, fica claro que, em sua gestão, não deverá haver qualquer incentivo para esse segmento. Isso se comprova pelo fato de o ministério e a Embratur terem abandonado o turismo LGBTI+, retirando-o do plano nacional do setor e não reeditando a cartilha “Dicas para atender bem o turista LGBT”. Além disso, não cumprem o acordo de cooperação assinado entre a Câmara de Comércio e Turismo LGBT do Brasil, Mtur e Embratur, com validade até junho de 2023, que visa à promoção do turismo LGBTI+ dentro e fora do país.

Esse posicionamento levará o Brasil a desprezar um público importante para a retomada do turismo no pós-pandemia. Pesquisa do Harris Poll revela que 64% dos LGBTs pretendem viajar tão logo os protocolos de segurança sejam estabelecidos, contra 58% dos outros turistas. Ao se posicionar de forma direta contra a comunidade LGBTI+, o presidente da Embratur faz grave ataque aos direitos universais, não colabora para a criação de empregos, em um período que o turismo pode contribuir para a saída da crise causada pela pandemia, e mina as relações internacionais brasileiras com países que valorizam a democracia e o fim do preconceito. 

Vale ressaltar que países como  Israel, Espanha, França, Estados Unidos, Canadá, Alemanha, Grã-Bretanha, Argentina e Uruguai, entre tantos outros, realizam investimentos constantes no Turismo LGBTI+ como forma de aquecimento dos negócios, bem como afirmação e respeito à cidadania. Ao se posicionar de forma contrária, o Brasil perderá mercado frente tantos destinos.

Otavio Furtado

Otavio Furtado é assessor de imprensa há oito anos. Há cinco anos criou o site Maior Viagem, de turismo e gastronomia. Também é editor do site Gay Travel and Fun e colunista de turismo LGBTI+ da Revista Qual Viagem. Assumiu recentemente o cargo de Diretor de Comunicação da Câmara de Comércio e Turismo LGBT do Brasil

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Um comentário em “Brasil perderá bilhões ao desprezar o turista LGBTI+

  1. Observador disse:

    E muitas vezes a gente acaba sendo mais generoso, na hora de utilizar os serviços, chamados de Equipamentos de Turismo! Numa ocasião, ida a Goiania, o motorista sugeriu me levar a Brasilia. Noutra vez, no Nordeste, foram os passeios comigo, que ajudou o taxista a comprar um celular melhor! E além disso de a gente acabar voltando, pela amizade, mais entrosamento (especialmente intimidades), indo além do cliente e prestador de serviço!

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