Na tarde ensolarada do inverno europeu, a famosa luz de Lisboa – celebrada em poemas, fotografias, canções e pinturas – clareia as águas do Rio Tejo e atravessa os cabos de aço que sustentam a movimentada Ponte 25 de abril, que liga a capital portuguesa à cidade de Almada. Na Avenida Brasília, nas proximidades de Belém, ela envolve uma espetacular construção que entrou recentemente na paisagem e já está fazendo sombra às melhores atrações locais. Projeto assinado pela britânica Amanda Lave, ao custo de 20 milhões de euros, o sinuoso prédio do Museu de Arte, Arquitetura e Tecnologia (MAAT) – erguido há pouco mais de um ano, em uma área de sete mil metros quadrados à beira do Tejo – já ganhou diversos prêmios, entre eles o The LCD Award de 2017, considerado o “Oscar dos museus”, como “Best museum architecture of the year”.
[g1_quote author_name=”Inês Grosso” author_description=”Curadora do Maat” author_description_format=”%link%” align=”left” size=”s” style=”simple” template=”01″]Acreditamos ser importante abrir essas fronteiras, englobando performances musicais, festas, conferências, além, claro, de exposições e mostras. Não queremos ficar fechados em um contexto só.
[/g1_quote]Mas o MAAT não é só fachada. Em seu primeiro ano de funcionamento, o museu – classificado como “a melhor novidade de 2017” pela revista “Time Out Lisboa” – recebeu mais de meio milhão de visitantes e abrigou 23 exposições de 432 artistas (dos quais 137 foram portugueses). Para comparação, o Museu dos Coches, de Lisboa, um dos mais visitados do país, recebeu 383 mil pessoas em 2016.
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Veja o que já enviamos– Somos bebês se formos comparados com os outros museus da cidade e do país – afirma Inês Grosso, uma das curadoras do MAAT, sentada à minha frente numa das salas do prédio. – Mesmo assim, acredito que já conseguimos nos destacar, de forma positiva, no panorama nacional, com uma programação particular e ambiciosa. E ainda temos muito o que crescer.
De fato, o olhar comum parece não se encaixar na programação do museu, que é dirigido pelo arquiteto Pedro Gadanho e faz parte da Fundação EDP (Energias de Portugal), uma empresa privada. Entre outubro de 2017 e fevereiro deste ano, seu principal espaço, a Galeria Oval, esteve ocupado por “Shadow sounding”, uma portentosa instalação audiovisual criada pelo artista norte-americano Bill Fontana a partir de sons e imagens da Ponte 25 de abril. Conferida por mais de 70 mil pessoas, a obra foi substituída, no final de março, por outro projeto em larga escala, de inspiração ecológica: “Um imaginário termodinâmico”, com estruturas flutuantes feitas pelo argentino Tomás Saraceno, projetando o aeroceno, um período no qual o ser humano ocuparia os ares com a ajuda de fontes de energia renováveis.
– Temos essa capacidade de receber projetos em larga escala, “site specific” – pontua Inês, que desenvolveu know how nessa área nos quatro anos em que trabalhou em Inhotim, em Minas Gerais, antes de retornar a Lisboa, onde nasceu. – São trabalhos que precisam de um longo tempo de preparação e planejamento. “Shadow sounding”, por exemplo, foi concebida antes mesmo de o museu abrir oficialmente.
Chamado de “um museu da Lisboa 2.0” pelo jornal “Sapo”, o MAAT – que conta com um orçamento anual de dois milhões de euros – impõe-se justamente no momento em que a cidade vive um boom turístico, batendo sucessivos recordes de visitantes estrangeiros, e o país consegue sair de uma longa recessão, com sua economia crescendo acima da média da União Europeia. Surfando essa onda de otimismo, o MAAT festeja – seu aniversário teve o show da banda local Moulinex, lançando o álbum “Hypersex – e busca atualizar as definições de um museu no final dos anos 2010, em plena era digital. Recentemente, por exemplo, abriu suas portas para uma conferência sobre arquitetura e som, intitulada “Resonate – Thinking sound and space”, com a presença de músicos, engenheiros de som, designers, jornalistas e, claro, arquitetos de diversos países.
– Acreditamos ser importante abrir essas fronteiras, englobando performances musicais, festas, conferências, além, claro, de exposições e mostras. Não queremos ficar fechados em um contexto só – explica a curadora. – Com isso, temos atraído um público variado ao museu, com muitos turistas e uma grande parcela de jovens.
Assim como o Museu de Arte (MAR) e o Museu do Amanhã do Rio, que fazem parte de um projeto de revitalização de uma região de pouca visibilidade da cidade, o controvertido Porto Maravilha, o MAAT tem injetado oxigênio novo nos seus arredores, “religando” – nas palavras de Amanda Lave, em entrevista ao mesmo “Sapo” – uma área anteriormente vazia do Tejo à Lisboa.
– Apesar de estar bem próximo a Belém e a uma zona de monumentos históricos, esse pedaço da cidade era muito negligenciado. Agora vemos muitas pessoas circulando por aqui, atraídas pelo museu ou simplesmente correndo e andando de bicicleta ao redor dele – conta Inês, que é fã de Adriana Varejão e de um produto natural do Brasil. – Morro de saudades de tomar água de coco.