Domingo passado foi dia dos pais e me vi em silêncio. No último ano, o Brasil registrou mais de 172 mil crianças sem o nome do pai na certidão de nascimento. Foi o maior número desde 2016, que nos mostrou um aumento de 24,5% de ausência paterna nos últimos sete anos. Os dados são do Portal da Transparência do Registro Civil. Ou seja, a reflexão sobre paternidade biológica e afetiva merece silêncio e lamentação.
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Passadas as emoções das celebrações comerciais do dia dos pais e, de certa forma, genuínas, quero hoje escrever para quem, assim como o TEDx da Stephanie Ribeiro publicado em 2017, esperou muito por um reencontro, por um arrependimento — ou quem desistiu de esperar. Tem também quem até tinha o nome do pai na certidão, mas nunca teve afeto, abraço demorado e presença de verdade. Aqueles e aquelas que nunca conseguiram se conectar profundamente com essa figura paternal, e buscaram preencher essa lacuna de outras formas…
Quero escrever para as mães que precisaram lutar e se humilhar muito na justiça pelo direito de pensão alimentícia, e não desistiram. Para as filhas e filhos que, ao invés de amor, receberam violência e desprezo. Para quem nunca entendeu o significado real da paternidade, nem biológica, tampouco afetiva.
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Veja o que já enviamosQuero escrever para quem, de forma trágica — ou precoce —, se viu na obrigação de se despedir do seu pai. Meses, anos, décadas passaram e filhos e filhas ainda vivem o luto das memórias interrompidas pela morte. Qual dor seria pior: memórias interrompidas ou memórias nunca construídas?
Enquanto a data sensível traz muitos gatilhos de abandono e de incompletude para alguns, não posso deixar de reconhecer celebrações para famílias e outros vínculos que, de alguma maneira, vingaram e persistiram no amor, na verdade, no olho no olho. O que são as relações entre pais e filhos, senão uma série de tentativas?
Entre chegadas, partidas, lutos e despedidas, tem sempre algo que permanece em cada um de nós. Ninguém sai ileso. Lamento, mas também celebro todas as configurações familiares que, de alguma forma, resistiram e permaneceram. Contudo, sigo em silêncio quando o assunto é responsabilidade e paternidade. Estamos perdidos em uma sociedade do abandono.