O aumento gradual da temperatura média da Terra está deixando os termômetros cada vez mais imprevisíveis no mundo todo – e essas variações diárias no tempo atrapalham o crescimento da economia. A conclusão é de um estudo publicado nesta semana na revista Nature Climate Change, que relacionou as mudanças diárias de temperaturas ao longo dos últimos 40 anos com dados econômicos de mais de 1.500 regiões em todo o mundo.
Dados analisados por especialistas do Instituto Potsdam para Pesquisa de Impacto Climático (PIK), na Alemanha, da Universidade de Columbia e do Instituto de Pesquisa Mercator de Bens Comuns Globais e Mudanças Climáticas (MCC) apontam que, se a temperatura varia muito de um dia para outro, a economia cresce menos. Por meio dessas variações aparentemente pequenas, as mudanças climáticas podem ter fortes efeitos sobre o crescimento econômico. “Já sabemos há algum tempo que as mudanças na temperatura média anual afetam o crescimento macroeconômico”, explica Maximilian Kotz pesquisador da PIK. “Mas agora, pela primeira vez, também podemos mostrar que as variações diárias de temperatura, ou seja, a variabilidade de curto prazo, tem um impacto substancial. Se essa variabilidade aumentar em um grau Celsius, o crescimento econômico é reduzido em média, 5 pontos percentuais”, acrescenta.
O estudo olha um aspecto do custo da mudança do clima que não costuma integrar as análises econômicas tradicionais. Estas são focadas nas mudanças de longo prazo e de grandes eventos extremos, como furacões e secas. O que o grupo do PIK mostrou foi que as chateações meteorológicas cotidianas num mundo mais quente também pesam no bolso.
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Veja o que já enviamosAs nações com menor renda per capita são também mais fortemente afetadas pelas variações de temperatura porque não possuem estrutura para mitigar os impactos climáticos. Notamos que países da América Latina, incluindo o Brasil, são alguns dos que mais sofrem com essas flutuações nos termômetros
[/g1_quote]De acordo com a matemática Leonie Wenz, subchefe do Departamento de Pesquisas do PIK, as economias em regiões de baixa renda do Sul global são particularmente afetadas pelas variações do tempo: “Achamos que a familiaridade com as variações de temperatura é importante: economias no Canadá ou na Rússia, onde a temperatura média mensal varia em mais de 40°C dentro de um ano, parecem melhor preparadas para lidar com as flutuações diárias de temperatura do que regiões de baixa latitude, como partes da América Latina ou do sudeste da Ásia, onde as diferenças sazonais de temperatura podem ser tão pequenas quanto 3°C”, explica Wenz, coautora do artigo publicado na Nature Climate Change. “Isso ocorre provavelmente porque, nos lugares onde as variações são mais comuns, agricultores e pequenos empresários cultivaram resiliência contra a variabilidade da temperatura ao longo do tempo”, adiciona.
Mas esta experiência acumulada não é a única razão. “Mesmo em latitudes semelhantes, as economias das regiões pobres são mais fortemente afetadas quando a temperatura diária flutua do que as economias das regiões ricas”. afirma a subchefe do departamento de pesquisas do PIK. De acordo com a pesquisa, se a temperatura diária se desvia das expectativas sazonais, elementos fundamentais da economia são afetados negativamente – incluindo a produtividade das safras, saúde humana, vendas e custos operacionais.
Maximilian Kotz aponta as dificuldades dos países mais pobres. “As nações com menor renda per capita são também mais fortemente afetadas pelas variações de temperatura porque não possuem estrutura para mitigar os impactos climáticos. Notamos que países da América Latina, incluindo o Brasil, são alguns dos que mais sofrem com essas flutuações nos termômetros”, destaca o pesquisador.
Para chegar a esses resultados, os pesquisadores analisaram a variabilidade diária da temperatura entre 1979 e 2018 em centenas de regiões e compararam com dados econômicos regionais correspondentes, somando um total de 29 mil registros. “A variabilidade rápida da temperatura é algo completamente diferente das mudanças de longo prazo”, explica Anders Levermann, chefe do Departamento de Pesquisas do PIK, professor da Universidade de Columbia, de Nova York, e coautor do artigo.
De acordo com os pesquisadores, as variações médias de temperatura do dia-a-dia mudaram em aproximadamente 0,2ºC de um ano para o outro ao longo das últimas quatro décadas, o que representa um impacto médio anual de 1% na economia mundial. “O verdadeiro problema causado pela mudança errática do clima são os impactos inesperados, porque é mais difícil de se adaptar a eles. Agricultores e grandes empresas estão se tornando resilientes ao aumento gradual das temperaturas, mas e se o tempo simplesmente se torna mais irregular e imprevisível? Os formuladores de políticas púbicas e a indústria precisam levar isso em consideração ao discutir o custo real das mudanças climáticas” frisa Levermann.
Kotz também acredita que as descobertas da equipe sobre a área pouco estudada das oscilações diárias de temperatura dão às autoridades mais o que pensar quando consideram como as mudanças climáticas podem afetar as economias. “Com as mudanças climáticas, uma das coisas que precisamos entender é quanto custará se não fizermos nada a respeito”, afirma. O custo extra da inação nas oscilações diárias de temperatura pode encorajar os governos a agir sobre as emissões, tornando o suporte para tecnologias como carros elétricos, bombas de calor e hidrogênio mais economicamente atraente. “Isso pode afetar a forma como os combustíveis fósseis serão tributados no futuro”, aponta Kotz.