O poder das abelhas

Polinizacao com abelha. Foto de Mirian Fichtner

Só no Brasil, a riqueza gerada pelos polinizadores chega a US$ 12 bilhões e é grande a variedade de culturas beneficiadas

Por Liana Melo | Conteúdo de marca • Publicada em 7 de fevereiro de 2018 - 08:29 • Atualizada em 18 de março de 2020 - 17:28

Polinizacao com abelha. Foto de Mirian Fichtner

Está virando moda alugar colmeias. É que as abelhas são consideradas trabalhadoras incansáveis. Todos os dias do ano, sem direito a folga ou qualquer tipo de benefício, lá estão elas, polinizando mais de três quartos das espécies de culturas alimentares no mundo. Só no Brasil, calcula-se que a riqueza gerada com a ajuda dos polinizadores é de US$ 12 bilhões. No mundo, esse valor pode chegar a US$ 577 bilhões, segundo estudos da Plataforma Intergovernamental de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (IPBES, na sigla em inglês), uma iniciativa internacional da qual o Brasil é um dos 124 países signatários.

Por aqui, a prática vem sendo adotada há alguns anos, especialmente na cultura da maçã, e vem, aos poucos, sendo ampliada. Produtores de pera, pêssego, do Sul do país, e de melão, do Rio Grande de Norte, aderiram à polinização. Professora sênior do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (IB-USP) e co-autora do documento produzido pela IPBES, Vera Lúcia Fonseca está convencida de que a agricultura e natureza são aliadas na produção com sustentabilidade. “A agricultura pode se beneficiar com o aumento e a diversidade de polinizadores, que, por sua vez, melhoram o rendimento de diversas culturas, de frutas a grãos passando pelas verduras”. Além de açaí, maracujá, maçã, manga, abacate, acerola, tomate e muitas outras frutas, castanha-do-pará, cacau, café, soja e canola também se beneficiam com a presença de polinizadores.

Polinização delivery

Detalhe de colmeia da Embrapa Soja. Foto de Mirian Fichtner
As abelhas têm um enorme sentido de orientação. Elas voam até três quilômetros e voltam para sua colmeia (Foto de Mirian Fichtner)

Com um enorme senso de orientação, as abelhas são transportadas em caixas e, ao chegarem à plantação, são liberadas. Elas voam até três quilômetros e voltam para sua colmeia – é residual o percentual de abelhas que não voltam. Terminada a floração, os apicultores fecham a caixa com as abelhas, colocam-nas no caminhão e voltam para a casa. É uma parceria ganha-ganha: bom para o dono da lavoura e também para o dono da colmeia, que, além de aumentar sua produção de mel, tem uma renda extra com o aluguel das abelhas.

A abelha busca nas flores o néctar, que será transformado em mel. Enquanto extrai o néctar de uma flor, o pólen gruda nas suas patas e no seu corpo. Quando a abelha vai para outras flores, novamente para extrair néctar, é que ocorre a polinização – essa transferência pode ser feita por outros tipos de polinizadores, como vespas, moscas, borboletas, mariposas, morcegos e até outros mamíferos e aves.

À frente da Rede Brasileira de Interações Planta-Polinizadores (REBIPP), Kayna Agostini, professora da Universidade Federal de São Carlos, conta que, no Sul de Minas Gerais, um produtor de maracujá resolveu fazer uma obra definitiva na fazenda. Ele trocou toda a cerca da propriedade, substituindo os troncos de madeira por mourões de cimento. Poucos meses depois da modernização, o maracujazeiro começou a perder produtividade e os frutos, o viço. O agricultor não entendia o que estava acontecendo, até que foi surpreendido pela informação: eram nos troncos velhos dos mourões de madeira que a mamangava, uma abelha nativa, fazia seu ninho – a espécie é considerada uma das principais aliadas da plantação de maracujá.

Oportunidade para grandes culturas

Eber Luiz Pereira, aluno de doutorado da Embrapa Soja, borrifa fumaça dentro das estufas, antes de entrar, para não ser atacado pelas abelhas (Foto de Mirian Fichtner)

Até há bem pouco tempo, o mundo científico duvidava sobre a contribuição dos polinizadores para aumentar a qualidade e o rendimento da soja. Devido à proximidade das estruturas feminina e masculina na flor, a polinização não depende de outros agentes para o transporte do pólen. É que, por ser uma planta hermafrodita, a flor da soja se autofecunda. A surpresa veio com a evolução das pesquisas quando se concluiu que, na presença de abelhas, a produtividade da soja aumenta. Isso significa que, mesmo em culturas onde não são essenciais, as abelhas podem contribuir para maior produtividade com um custo muito baixo.

Pesquisadora da Embrapa Soja, em Londrina extrai o néctar da flor de soja (Foto de Mirian Fichtner) 

“Em determinadas condições, o aumento de produtividade pode variar entre 10% e 20%”, diagnostica Décio Gazzoni, da Embrapa Soja. Ele calcula que o produtor rural pode ganhar entre cinco e seis sacos por hectare. À medida que a pesquisa comandada pelo pesquisador avança, os resultados são comprovados no campo: “Se tivermos aumento de produtividade pela presença de abelhas, estaremos deixando de desmatar áreas para aumentar a produção de soja”.

Açaí bem polinizado (à esquerda) e mal polinizado (Foto de Cristiano Menezes)

O pesquisador da Embrapa Amazônia Cristiano Menezes está à frente de um projeto com abelhas sem ferrão para polinização de diversas culturas, entre elas o morango. O mesmo experimento está sendo feito na cultura de açaí. O projeto começou em 2013. “Estamos testando o método de multiplicação de colônias para testar no sistema industrial de produção”, comenta ele, explicando que o estudo está sendo feito em parceria com a Promip, empresa paulista de biotecnologia e manejo integrado de pragas. Os estudos vêm indicando um aumento de produtividade entre 20% e 40%, além de uma diminuição em até 80% na má formação de frutos.

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Liana Melo

Formada em Jornalismo pela Escola de Comunicação da UFRJ. Especializada em Economia e Meio Ambiente, trabalhou nos jornais “Folha de S.Paulo”, “O Globo”, “Jornal do Brasil”, “O Dia” e na revista “IstoÉ”. Ganhou o 5º Prêmio Imprensa Embratel com a série de reportagens “Máfia dos fiscais”, publicada pela “IstoÉ”. Tem MBA em Responsabilidade Social e Terceiro Setor pela Faculdade de Economia da UFRJ. Foi editora do “Blog Verde”, sobre notícias ambientais no jornal “O Globo”, e da revista “Amanhã”, no mesmo jornal – uma publicação semanal sobre sustentabilidade. Atualmente é repórter e editora do Projeto #Colabora.

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