Doenças à espreita em Brumadinho

Busca de corpos em meio à lama despejada pelo rompimento da barragem da Vale: ainda há desaparecidos (Foto Mauro Pimentel/AFP)

Rompimento da barragem da mina do Córrego do Feijão pode ter como consequência surtos de dengue e febre amarela, além de outros problemas de saúde

Por Viviane Nogueira | ODS 3 • Publicada em 5 de fevereiro de 2019 - 08:30 • Atualizada em 11 de fevereiro de 2019 - 14:43

Busca de corpos em meio à lama despejada pelo rompimento da barragem da Vale: ainda há desaparecidos (Foto Mauro Pimentel/AFP)
Bombeiro no Córrego do Feijao: desequilibrio ambiental pode causar doenças (Photo by Mauro Pimentel / AFP)

Surtos de dengue e febre amarela podem ocorrer na esteira da tragédia de Brumadinho. Com o rompimento da barragem na mina Córrego do Feijão, o desequilíbrio ambiental característico da atividade de mineração se amplia, e expande a área de possível contaminação por doenças transmitidas pelo mosquito Aedes aegypti. “Isso acontece pela migração de animais infectados, que ficam expostos ao Aedes aegypti, que pode então se contaminar e transmitir a humanos o vírus causador das doenças”, explica o professor da Universidade Federal Fluminense (UFF) Túlio Batista Franco, especialista em saúde pública e dengue.

O fenômeno pode ser verificado a curto, médio e longo prazo, vai depender sempre da extensão e agudeza do desequilíbrio causado pela atividade de mineração e o desastre de rompimento da barragem

Na febre amarela silvestre, a transmissão da doença ocorre a partir do momento em que um mosquito Aedes aegypti pica um macaco infectado e, depois, um macaco sadio. Na doença urbana, o mosquito repete o ciclo, dessa vez com o homem no lugar do macaco. O desmatamento e a proximidade de residências em áreas de mata que acontecem num ambiente de mineração expõem os moradores da região a estas doenças. E mais ainda no cenário atual da tragédia. “O fenômeno pode ser verificado a curto, médio e longo prazo, vai depender sempre da extensão e agudeza do desequilíbrio causado pela atividade de mineração e o desastre de rompimento da barragem”, diz o professor.

Já o professor e pesquisador da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Álvaro Eiras, diz que a quantidade de mata devastada em Brumadinho é pequena para ocasionar a migração de animais e que, na lama contaminada o mosquito Aedes aegypti também não se desenvolve. O que pode ocasionar estas doenças é mais o comportamento humano. “Com a água contaminada e seu fornecimento substituído por caminhão pipa nas vilas próximas a Brumadinho, as pessoas podem acumular água para cozinhar, por exemplo. E isso sim pode criar um ambiente favorável para o Aedes se desenvolver e transmitir as doenças”, explica. “Outra possibilidade seria os recipientes e entulhos que foram transportados e produzidos durante o desastre de Brumadinho e que acumulam água. Neste caso, aumentaria o número de criadouro para o mosquitos procriarem e provavelmente aumentaria a proliferação do Aedes”, afirma o pesquisador.

Alerta para outros problemas de saúde

Os riscos são confirmados por um estudo da Fiocruz divulgado nesta terça-feira (5/02), que  alerta para a possibilidade de surtos de doenças infecciosas como dengue, febre amarela e esquistossomose, além do agravamento de problemas crônicos de saúde, como hipertensão, diabetes e doenças mentais pela perda de condições de acesso a serviços de saúde. A estimativa do estudo é que três mil pessoas estejam isoladas.

Um aumento de casos de acidentes vascular-cerebrais foi observado após as enchentes de Santa Catarina em 2008 e do acidente de Fukujima, Japão, mesmo depois de meses dos eventos disparadores

A análise foi realizada pelo Observatório Nacional de Clima e Saúde do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict/Fiocruz) e pelo Centro de Estudos e Pesquisas em Emergência de Desastres em Saúde da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca (Cepes/Ensp/Fiocruz), com base nos dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), da Agência Nacional das Águas (ANA) e do Datasus.

“Um aumento de casos de acidentes vascular-cerebrais foi observado após as enchentes de Santa Catarina em 2008 e do acidente de Fukujima, Japão, mesmo depois de meses dos eventos disparadores”, informa Christovam Barcellos, pesquisador titular do Laboratório de Informação em Saúde do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Lis/Icict) da Fiocruz.

Além disso, alterações ecológicas podem promover a transmissão de esquistossomose e diarreias, segundo o pesquisador, por causa da baixa qualidade da água, já que municípios ao longo do rio Paraopeba não são cobertos por sistemas de coleta e tratamento de esgotos. E a degradação do leito do rio Paraopeba e de seu entorno pode alterar fauna, flora e acarretar perda de biodiversidade, mortandade de peixes e répteis, precipitando surtos de doenças transmitidas pelo mosquito Aedes aegypti. “A bacia do rio Paraopeba é uma área de transmissão de febre amarela e um novo surto da doença não pode ser descartado”, ressalta Barcellos.

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