Mulheres e flores do Quênia

Trabalhadoras da fazenda Maridaidi, em Naivasha, colhem rosas para serem exportadas para a Europa. Foto Saimon Maina/AFP

A luta das trabalhadoras por seus direitos no país que é um dos maiores produtores mundiais

Por The Conversation | ODS 5 • Publicada em 25 de fevereiro de 2018 - 09:42 • Atualizada em 25 de fevereiro de 2018 - 13:51

Trabalhadoras da fazenda Maridaidi, em Naivasha, colhem rosas para serem exportadas para a Europa. Foto Saimon Maina/AFP
Trabalhadoras da fazenda Maridaidi, em Naivasha, colhem rosas para serem exportadas para a Europa. Foto Saimon Maina/AFP
Trabalhadoras da fazenda Maridaidi, em Naivasha, colhem rosas para serem exportadas para a Europa. Foto Saimon Maina/AFP

(Laura Bianchi*) – Quando se pensa em flor, pelo menos quatro ideias podem vir à cabeça: mulheres, Holanda, Inglaterra e bossa nova. Tiremos esta, que nada tem a ver com o assunto aqui. Mulheres são grandes amigas das flores. A Holanda é grande exportadora e encanta com seus campos de tulipas. A Inglaterra é grande importadora e a jardinagem é um dos hobbies do país. Mas, por que ninguém disse Quênia?

ONGs de direitos humanos, organizações da sociedade civil e sindicatos no Quênia e na Europa fazem campanhas constantes pelas mulheres trabalhadoras quenianas, incluindo a luta contra violações de normas de saúde e segurança em estufas e o assédio sexual endêmico por parte dos supervisores

Pois este país do Leste da África, com litoral no Oceano Índico, é um dos maiores exportadores mundiais. Devido às artes da globalização, a própria Holanda importa de lá a maior parte das suas, num valor estimado em US$ 1 bilhão em 2016. E o Quênia é o segundo maior exportador de flores para o Reino Unido, com mais de 13 mil toneladas por ano. Só perde para a…Holanda. O volume e o valor das exportações florestais quenianas passaram de 3,6% do total mundial, em 2001, para 8,1%, em 2016. Mais de 132 mil toneladas são exportadas anualmente para todo o mundo, das quais cerca de 100 mil para a Holanda e o Reino Unido.

As quenianas são as grandes beneficiárias do crescimento dessa atividade econômica. Elas formam 75% da mão-de-obra e têm conseguido notáveis melhorias em seus direitos e condições de trabalho. No início dos anos 2000, ONGs de direitos humanos, organizações da sociedade civil e sindicatos no Quênia e na Europa iniciaram campanhas pelas mulheres trabalhadoras quenianas, incluindo contratos temporários constantemente renovados, violações de normas de saúde e segurança em estufas e assédio sexual endêmico por supervisores masculinos.

O Quênia é o segundo maior exportador de flores para o Reino Unido, com mais de 13 mil toneladas por ano. Foto Saimon Maina/AFP
O Quênia é o segundo maior exportador de flores para o Reino Unido, com mais de 13 mil toneladas por ano. Foto Saimon Maina/AFP

Uma queixa foi encaminhada à Ethical Trading Initiative, do Reino Unido, uma aliança de empresas, sindicatos e ONGs que promove o respeito aos direitos dos trabalhadores em todo o mundo. Isso levou a investigações e visitas ao Quênia. O resultado foi uma série de mudanças nas condições de trabalho das mulheres nas principais fazendas de flores.

Comitês de gênero foram estabelecidos, criando um canal a que as trabalhadoras podem recorrer em casos de abusos. Alguns supermercados ampliaram seus prazos para finalização de suas encomendas e passaram a auxiliar na assistência à infância, além de cuidarem para reduzir o risco de assédio sexual à noite. A partir de 2007, reformas nas leis trabalhistas do Quênia ajudaram a melhorar a situação profissional da mulher. Muitas se tornaram supervisoras e foram promovidas a cargos gerenciais.

Graças a políticas específicas de gênero para as trabalhadoras e aos novos canais de comunicação que se abriram para elas, houve uma expressiva mudança de contratos temporários para contratos permanentes, o que lhes deu a possibilidade de se tornar membros dos sindicatos, com voz mais ativa para exigir mudanças, inclusive nos produtos.

Os benefícios comerciais das mudanças também ficaram claros. Aumentar os direitos de uma força de trabalho em grande parte feminina levou a uma menor rotatividade da mão-de-obra, maior produtividade e qualidade.

Os abusos dos direitos humanos e o assédio sexual podem ser abordados nas cadeias de valor globais. Mas, para isso, grandes corporações devem assumir a responsabilidade. Além disso, uma ampla gama de atores deve estar envolvida na garantia de mudanças reais para as trabalhadoras. É a lição que o Quênia nos deixa.

* Laura Bianchi é pesquisadora associada em Negócios e Direitos Humanos da Universidade de Manchester, Reino Unido. Tradução: Trajano de Moraes

The Conversation

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