Tragédia ambiental e processual

Acidente da Samarco. Foto de Andre Teixeira

Atingidos padecem, Rio Doce agoniza e Samarco posterga medidas para recuperar meio ambiente e indenizar vítimas

Por Liana Melo | Economia VerdeODS 14 • Publicada em 1 de novembro de 2016 - 08:07 • Atualizada em 26 de janeiro de 2019 - 12:05

Acidente da Samarco. Foto de Andre Teixeira
As marcas da destruição estão por todos os lados. Foto de Andre Teixeira
As marcas da destruição estão por todos os lados. Foto de Andre Teixeira

O maior desastre ambiental do país se transformou em uma tragédia processual. Às vésperas do primeiro ano do rompimento da barragem de Fundão, a Samarco vem se beneficiando do emaranhado burocrático e do jogo de empurra-empurra para saber de quem é a competência para julgar as ações envolvendo a empresa, já que o dano superou o limites de dois estados. E, assim, vem postergando a adoção de medidas necessárias e eficazes para o início da recuperação ambiental e a indenização dos atingidos. A empresa já acumula cinco multas e não pagou nenhuma delas. Recorreu de todas.

Promotor Carlos Pinto. Foto de Andre Teixeira
Promotor Carlos Pinto. Foto de André Teixeira

Esse é o balanço feito pelo promotor Carlos Eduardo Pinto, do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), que esteve ontem, em Mariana, participando do seminário “Rio de Gente – Os desafios para a recuperação do Rio Doce”, promovido pelo Greenpeace. Ele chefia a força-tarefa que investiga a tragédia de Mariana desde o primeiro momento. Já denunciou a negligência da empresa, ao declarar, após o início das investigações, que o ocorrido “não foi acidente, nem fatalidade”. Foi, segundo ele, erro na operação e negligência no monitoramento.

Um ano depois do ocorrido, as marcas da destruição continuam espalhadas pelos 680 quilômetros percorridos pela lama de rejeitos da Samarco. Os impactos socioambientais são inúmeros e proporcionalmente inversos ao número de pesquisas em andamento para avaliar a dimensão da tragédia – os poucos estudos acadêmicos em curso nas universidades estão sendo bancados pelos artistas que subiram ao palco do show beneficente #SouMinasGerais: Caetano Veloso, Crioulo e Jota Quest. Os R$ 450 mil arrecadados no espetáculo, organizado pelo Greenpeace, estão financiando pesquisas na área de saúde, de flora, de fauna.

Pilares da tragédia

O promotor está convencido que os pilares da tragédia passam por um licenciamento ambiental feito a toque de caixa, uma fiscalização precária – nem o Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) nem a Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam) ficam de olho na operação – e, por fim, a própria empresa, que fez uma obra de recuo em Fundão sem informar as autoridades competentes. Não bastasse isso, nas interceptações telefônicas a que o MPMG teve acesso detectou-se que a alegação de abalos sísmicos feitos pela própria empresa não eram procedentes. Os registros indicaram que os abalos detectados na região, entre 2,8 e 3,4 da escala Richter, são imperceptíveis para a sensação humana e, portanto, insuficientes para romper a barragem de Fundão.

Se a Samarco fez algo de bom neste último ano foi saber se defender processualmente, trabalhando ininterruptamente para adiar toda e qualquer medida compensatória

“Se a Samarco fez algo de bom neste último ano foi saber se defender processualmente, trabalhando ininterruptamente para adiar toda e qualquer medida compensatória”, avalia Carlos Pinto, um crítico feroz do acordo assinado entre os representantes dos poderes públicos federal, de Minas Gerais e do Espírito Santo com a Samarco e suas controladas, a brasileira Vale e a anglo-australiana BHP Billiton.

O valor definido como teto para as compensações socioambientais foi de R$ 3,6 bilhões. “É um valor que não equivale a um ano de investimentos da empresa”, comenta, lembrando que, em 2014, a empresa anunciou a intenção de investir R$ 5,4 bilhões para ampliar suas operações. À época, chegou a comentar sobre a construção de uma nova barragem, a de Mirandinha, pouco mais de um quilômetro distante de Bento Rodrigues, o epicentro da tragédia.

Convencido de que “os atingidos estão padecendo e o rio Doce agonizando”, o MPMG pediu a anulação do acordo, alegando que ele “viola os direitos da comunidades atingidas”. O Supremo Tribunal de Justiça (STF) aceitou o pedido e suspendeu, em julho último, o acordado. Desde então, nada aconteceu, porque nem o Ministério Público nem os atingidos foram chamados para uma nova negociação. Criou-se uma fundação, a Renova, que, magicamente, passou a ser responsável pelos projetos de mitigação. “Foi uma roupagem perfeita para eximir a responsabilidade da Samarco nesse desastre ambiental”, conclui Carlos Pinto.

Liana Melo

Formada em Jornalismo pela Escola de Comunicação da UFRJ. Especializada em Economia e Meio Ambiente, trabalhou nos jornais “Folha de S.Paulo”, “O Globo”, “Jornal do Brasil”, “O Dia” e na revista “IstoÉ”. Ganhou o 5º Prêmio Imprensa Embratel com a série de reportagens “Máfia dos fiscais”, publicada pela “IstoÉ”. Tem MBA em Responsabilidade Social e Terceiro Setor pela Faculdade de Economia da UFRJ. Foi editora do “Blog Verde”, sobre notícias ambientais no jornal “O Globo”, e da revista “Amanhã”, no mesmo jornal – uma publicação semanal sobre sustentabilidade. Atualmente é repórter e editora do Projeto #Colabora.

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2 comentários “Tragédia ambiental e processual

  1. SONIA CONSELHEIRO affonso disse:

    Se aconteceu em Mariana o responsável é a comarca de Mariana. Dificio entender.
    Outra coisa se ninguém fizeer nada O Temer não roubou o lugar pras boas tipo 12.000 num dia
    Toma conta do Brasil
    Brasil não é só Brasília vem ver de perto o estrago vem em Bento Rodrigues
    Espírito Santo esse jogo de empurra empurra é o SENHOR QUE TEM QUE RESOLVER
    SEU ET DO CARAMBA,
    SONIA CONSELHEIRO AFFONSO BRASILEIRA

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