Agricultor peruano processa gigante de energia por mudanças climáticas

Saul Luciano em frente ao lado e ao pico ameaçados pelas mudanças climáticas

Em ação na Justiça alemã, morador da região de Huaraz tenta responsabilizar empresa pelo derretimento de geleiras

Por France Presse | ODS 13 • Publicada em 8 de dezembro de 2015 - 19:04 • Atualizada em 8 de dezembro de 2015 - 20:02

Saul Luciano em frente ao lado e ao pico ameaçados pelas mudanças climáticas
Saul Luciano em frente ao lado e ao pico ameaçados pelas mudanças climáticas
Saul Luciano em frente ao lago e ao pico ameaçados pelas mudanças climáticas

O suave murmúrio da água descendo da geleira nos Andes Peruanos em meio a um pálido lago é quebrado pelo estrondo de um pedaço de gelo se partindo. Saul Luciano Lliuya, que cresceu nessas montanhas, passou a maior parte de sua vida assistindo às mudanças climáticas destruindo os glaciares. Agora o agricultor peruano de 34 anos, também guia turístico, está processando uma das maiores empresas de energia europeias, a alemã RWE, pela suposta responsabilidade dela no aquecimento global – e por colocar sua cidade natal, na região de Huaraz, e sua fazenda em risco.
Luciano olha pela janela, que tem vista para o Churup, um pico de 5,4 mil metros de altura. Ele ainda se lembra quando o lugar ficava coberto de neve. Hoje o seu topo parece a cabeça de um homem careca, parcialmente coberto por tufos de cabelo branco.
“É uma vergonha que os glaciares não sejam mais os mesmos. Nós os estamos perdendo para o aquecimento global”, diz Luciano. “Alguém causou isso, e essas pessoas precisam assumir as responsabilidades. Não é certo ficar em silêncio. O mundo pertence a todos nós, não só aos poluidores”.
Luciano vive, junto com a mulher e dois filhos, de cultivar batatas, milho, quinoa e aveia ao norte de Ancash. Sua família tem feito o mesmo por gerações.
A montanha que está no horizonte é parte do Parque Nacinal Huascaran, patrimônio mundial da Unesco que perdeu 30% da sua cobertura de neve nas últimas quatro décadas, segundo o governo peruano. Luciano culpa as indústrias que emitem carbono por isso.
Há um ano, numa conferência das Nações Unidas no Peru, precursora da COP21 que está sendo realizada em Paris, ele conheceu um grupo de ativistas do grupo alemão Germanwatch, que o ajudou a pensar numa nova resposta para seu problema, o que resultou na ação de Luciano contra a RWE, segunda produtora de energia da Alemanha e o que a organização de ambientalistas chama de “a maior emissora de CO2 da Europa”.
Na ação, anunciada no mês passado pela Germanwatch, Luciano pede 20 mil euros na Justiça alemã – é o que ele calcula que custará proteger sua comunidade de inundações causadas pelo derretimento da neve e dos glaciares. A RWE disse que só tomou conhecimento do assunto pela imprensa.
É uma abordagem criativa para lidar com as chamadas externalidades, consequências sociais, ambientais ou econômicas indiretas provocadas pela venda de um produto ou serviço. A Germanwatch diz que esta é a primeira vez que um indíviduo afetado por mudanças climáticas move uma ação por danos contra uma grande companhia.
A ação de Luciano também reforça uma questão complicada das negociações da conferência de Paris: o abismo entre os países desenvolvidos que, por mais de um século, cresceram sem se preocupar com a poluição, e os países pobres que pedem ajuda financeira para seguir se desenvolvendo de forma sustentável.
Ainda não se sabe como a corte vai julgar a ação de Luciano. O que é claro é que o derretimento das geleiras está criando novos lagos e aumentando o nível de água nos que já existiam, colocando comunidades como a do agricultor em risco. O volume de água no lago Palcacocha é 34 vezes maior do que em 1970. A Agência Americana Internacional para o Desenvolvimento (Usaid) disse, no ano passado, que o lago se tornou uma ameaça permanente. A maior enchente do lago foi em 1941, quando 5 mil pessoas morreram na capital da região, Huaraz – hoje uma cidade com 100 mil pessoas.

Por Moises Avila

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